Capítulo 22

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Blanca= Essa é a culpa que carregarei para sempre. – assumiu. – Que eu tenha separado os dois de você. Sabia que você já tinha problemas suficientes, mas eu pensei em mim. Pensei no quanto eu queria me livrar, e no quanto eu não queria que os dois tivessem que lidar com qualquer dificuldade sua. Eu fiz mal, eu tomei a decisão errada, eu os separei de você... – voltara a chorar em silêncio. – E Dulce passou a me odiar ainda mais.

Fernando ficou em silêncio por alguns segundos, parecia absorver as duras palavras que agora a ex-esposa lhe confidenciava. A conversa evitada por anos, agora cobrava verdades difíceis de se digerir.

O garçom aproximou-se em seguida, serviu os pratos, e ambos apenas agradeceram em voz baixa e com um leve aceno.

Blanca encarou o prato de comida, esperando até que ouvisse a voz rouca e perdida do homem outra vez.

Fernando= Dulce nunca teve resistência com você. – ela o olhou. – Você teve resistência com ela.

A mulher levantou o rosto, olhou-o com alguma surpresa, como se reservasse aqueles segundos para compreender o impacto de tal frase. E não conseguiu vencê-lo.

Fernando= No fundo, vocês duas se estranham porque são iguais demais, e o que mais implicam uma na outra, é justamente os defeitos que possuem iguais. – deu um leve sorriso e a mulher meneou a cabeça. – Porque quando você coloca uma coisa na cabeça, não há quem possa tirá-la. E Dulce é exatamente igual.

Blanca= Sim, eu concordo. – assentiu. – Não poderia negar o óbvio, mas eu...

Fernando= Cismou, desde o primeiro momento, que não saberia ser uma boa mãe para ela, que criar uma menina seria muito diferente de criar um menino, e que Christian era uma criança excepcional por não nos dar trabalho. – lembrou-se e viu a ex-mulher arfar. – Você decidiu, enquanto Dulce ainda estava na barriga, que você não seria uma boa mãe para ela ou que simplesmente não seria o suficiente. Portanto, ela já nasceu sem possibilidade alguma de te fazer sentir o mesmo que você sentia pelo Christian, porque você travou esse sentimento muitos meses antes.

Blanca= Você não está errado. – ela corou ao falar. – Ainda que eu não tenha feito nada disso de forma consciente e nem tenha...

Fernando= Eu sei. – interrompeu-a com gentileza. – Eu vi, eu acompanhei todo o seu esforço por ela. E nunca duvidei, nem por um único segundo, do tamanho do seu amor pela nossa menina.

Blanca= Exatamente. – disse emocionada.

Fernando= Como também me lembro de ver a frustração nos seus olhos cada vez que não conseguia se conectar com ela. – lhe estendeu uma das mãos e a mulher o olhou, sem reação. – Reconheço que eu não soube te apoiar, naquele momento. Não prestei o apoio e o suporte que você precisava e merecia. – manteve a mão na direção dela e contraiu os lábios. – Te peço perdão. Amei imensamente você, tenho orgulho da relação que tivemos e da família que formamos porque foi graças a você que ganhei o melhor e maior presente de toda a vida. Se hoje podem me chamar de avô, e se eu tive a oportunidade de ser pai, foi simplesmente porque você enxergou essa possibilidade e lutou por ela. Lutou muito por ela. – a mulher cedeu e lhe deu a mão. – Te agradeço pela vida que tivemos, pela história que construímos e sei que ela durou o tempo suficiente para transformar positivamente as nossas vidas. Sei também que não fui perfeito durante este tempo, e de novo, eu te peço perdão. Te peço perdão e quero que saiba que fiz tudo o que eu podia, dei tudo de mim, em cada ano presente. Sou hoje uma pessoa melhor, graças ao tempo e as lições que aprendi com você.

Blanca apertou a mão dele, fechando os olhos por alguns segundos e deixando as lágrimas caírem silenciosas por todo seu rosto.

Ela havia esperado anos por aquelas palavras, o pedido de desculpas que jamais escutara e que ficara entalado desde os últimos anos de casamento. Talvez apenas agora ela conseguisse compreender a importância de um perdão.

A Sósia - Volume IIIOnde histórias criam vida. Descubra agora