FILHA DAS SOMBRAS

Capitulo I

Synon

Lá fora a neve se acumula, dando os primeiros indícios da chegada do inverno ao cobrir tudo de branco. É lindo, mas mesmo olhando da janela já estremeço só de pensar no frio.

Olho-me no espelho uma última vez, retirando o excesso de batom vermelho que borrara no canto de minha boca e ajeitando os pesados cachos negros uma última vez. Já ia saindo quando meus olhos encontram a marca na forma de um V invertido localizada nas minhas costas, onde estão as minhas asas. Frequentemente esquecia que estava lá. Ela era facilmente visível pelo corpete vermelho sangue que usava, por isso ao invés do coque elaborado que usava, solto os pesados cachos e deixo que desçam em cascata por minhas costas para encobrir o pior.

Balançando rapidamente a cabeça para afugentar qualquer lembrança, pego minha espada em um canto e a coloco na bainha presa ao cós da calça enquanto desço as escadas até o hall da fortaleza escarlate. Ou Nêmesis, como frequentemente a chamamos.

Vários assassinos atravessam os andares da fortaleza num ritmo cada vez mais intenso. Dentro da Strix, existem três classificações para os assassinos: a ordem dos curandeiros e alquimistas, o núcleo de estrategistas e o campo, onde a maioria de nós fica. Nem o inverno é capaz de parar-nos, pois todas as nossas tarefas precisam ser cumpridas para o bom funcionamento da Strix.

No meio das pilastras do hall, minha boa e velha amiga de muito tempo, que é parte da ordem dos curandeiros, espera sorridente. Mad tem pequenas sardas por todo o corpo, é ruiva e seus cabelos são ondulados. Ela usa uma parte do cabelo solta até os ombros e o restante preso em duas tranças que vão até o chão. Além de estar sempre de verde, o que realça seus belos olhos esmeralda, possui um par de asas de borboleta e as orelhas pontudas.

- Oi, bela adormecida. – Ela dirige-me um sorriso zombeteiro. – Vamos logo, antes que Raziel nos mate de vez.

- Isso não seria uma novidade. – Dou de ombros, mas mesmo assim vou atrás dela até o Laboratório de Alquimia, onde Raziel já estava dando rápidas instruções a uma garota de cabelos totalmente brancos e bem curtos de pele morena e com as típicas orelhas negras de lobo, vestida inteiramente de bege e carregando um machado imponente no ombro. Heidy.

- Bom dia, Heidy. – Dirijo-me propositalmente a ela para irritar o tritão. – Qual é a da vez?

- Syn... – Minha amiga censura-me, mas por dentro eu sabia que ela ria do tom azul escuro que tomou conta das bochechas dele quando bufou.

- Vocês por acaso pensam que isso aqui é o que? Uma taberna para sentarem e baterem papo? Acham que podem chegar a qualquer hora? Apesar da inutilidade de vocês, devo lembrá-las que ainda pertencem a minha ordem. – Ele dirigiu a nós um olhar cheio de ódio e cruzou os braços na frente do corpo. – Faça logo o que lhe pedi, Heidy, qualquer coisa peça ajuda a Tygrel.

Assentindo, a loba desparece porta afora e deixa nós três a sós. Raziel só gostava de ser um pé no saco de todo mundo, já que ele bem sabia que muitos como eu passavam por todas as divisões atualmente devido à falta de assassinos, mas escolhi não o corrigir pelo bem da nossa relação nada amigável.

- Pois bem, hoje vocês têm a missão de... – Uma batida soa na porta e o interrompe, levando-o a uma onda de lindos xingamentos - ENTRE!

Venie, depois de algum tempo espiando pela porta, entra literalmente flutuando com seus longos cabelos castanhos de mechas alaranjadas nas pontas, tal como o céu no fim do dia. Como ela era uma aurai, caía-lhe bem.

- Ahn... Oi. Interrompi alguma coisa? – Ela dirige um sorriso málicioso a nós três.

- Claro, porque tudo o que eu mais queria era ficar a sós com elas! - Raziel revira os olhos.