TRÊS

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"É normal sentir-se triste depois de ficar noiva?"

Google. Pesquisar. 

A doutora estava imóvel há cinco minutos apenas procurando respostas para a angústia que crescia em seu peito. A situação, na noite anterior, envolvendo o seu melhor amigo, a deixou bastante confusa.

Antônio não era de beber até encher a cara e esquecer das coisas, por isso, toda a situação colocou uma pulga atrás da orelha dela. 

Algo de errado não estava certo. 

E o modo como os olhos fixaram nela de forma tão intensa ainda causava mini arrepios por seu corpo, o que ela estava tentando bloquear com pensamentos dos momentos do noivado. 

Ela estava feliz, não estava? Genuinamente feliz? Ou era apenas um sentimento de satisfação, de ter conseguido aquilo que desejara por muito tempo e a felicidade não era real? 

Quando Heitor colocou o anel em seu dedo, foi um momento único e inexplicável, quase podia ouvir os anjos cantando e os pés flutuando, mas de alguma forma ela podia sentir, ao olhar para aqueles que mais ama, que o grau de felicidade deles não era o maior de todos. E talvez, ela achasse que o mesmo sentimento estava refletido em sua alma, escondido embaixo de falsas camadas de alegria extrema.

Mas ainda assim, tratou de aproveitar a noite da melhor forma possível. Afinal, supostamente, só se fica noiva uma vez na vida. Dançou, amou e planejou o resto da noite em sua cabeça. Sonhando com o momento em que ela e o seu noivo poderiam celebrar, ainda mais, aquele passo importante que estavam escolhendo dar juntos.

Entretanto, todo o desejo desceu como água pelo ralo. A presença de Antônio, na porta do seu apartamento, tinha sido um lançamento de uma bomba tóxica dentro do lar, o que deixou Heitor em um modo intragável. Como se a culpa do melhor amigo dela estar ali fosse toda e exclusivamente dela. 

O fato do noivo não gostar do melhor amigo dela era compreensível até certo ponto, pois sempre foi Amanda e Antônio. Juntos, contra o mundo.

A única distância que tinham era a física, pois as suas missões de vida eram diferentes, mas o laço de amizade continuava intacto mesmo com oceanos no meio do caminho. 

Antônio Carlos sempre seria o seu melhor amigo, isso não mudaria nunca.

Era mais fácil ela desfazer o noivado do que aceitar o seu melhor amigo fora da sua vida. 

O som alto da campainha ecoou por todo o apartamento e a tirou do transe de pensamentos. Passar o olho pelo celular, abrindo links aleatórios, não tinha ajudado a encontrar respostas de verdade para o que estava sentindo. 

O lado esquerdo da cama denunciava a noite fria. Após eternos minutos reclamando sobre toda a confusão causada por Antônio, Heitor informou que ficaria na sala para digerir um pouco o acontecido e o sono acabou por vencê-la. Somente nesse momento, ela reparou que ele não dormiu ao lado dela. 

Era assim que uma noiva deveria ser tratada? Era assim que seria o casamento deles?

Rolou os olhos, exausta desses pensamentos, e levantou da cama. Diferente de todos os outros dias que ela sabia que eles se veriam pela manhã, dessa vez, não estava a fim de se arrumar para ele, estava cansada e decepcionada.

— Bom dia. Quem é? — coçou os olhos levemente, acostumando-se com a luminosidade da sala, e direcionando o olhar para Heitor, que carregava um buquê de lírios, as suas flores preferidas. 

Uma pequena chama de esperança começou a flamular dentro do peito, um ponto de esperança em meio ao caos de sentimentos, mas assim como ela se acendeu, um vento forte veio, deixando só a fumaça. Ela não podia acreditar no que estava vendo.

All This Time 🪢 docshoeOnde histórias criam vida. Descubra agora