UM

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Dizem por aí que para tudo se tem uma resposta, e a maior parte do mundo sabe essas tais respostas. A Julia, da minha classe, sabia as respostas de todas as matérias desde a quinta série. No Ensino Médio chegou o namorado dela, André, e eram o casal perfeito - o que ela parecia esquecer, ele lembrava.

Meus pais sempre souberam o que era o certo a se fazer nas melhores horas. Como quando me viram solitária nas arquibancadas da escola, comendo meu lanche aparentemente em paz, todavia por dentro eu me questionava porque eu era como era. Daí eles me colocaram num curso de inglês para ocupar meu tempo e minha cabeça. Agora tenho meu certificado de bilíngue. Mas continuo aquela garota começando um misto quente sozinha na arquibancada, teoricamente.

Minha avó sempre sabia o nome de todas as árvores e flores que encontrávamos quando passeávamos no parque. Sempre que eu apontava para uma ela me dizia seu nome, de onde vinha e talvez até uma história engraçada a envolvendo. Dessa maneira sabia exatamente quando e como usar cada plantinha do mundo.

Eu nunca sabia as respostas. De nada.

Deste modo, aqui estou eu, recém formada no colegial, com 18 anos e sem um motivo para viver. Não, não estou planejando me matar, até porque acho emocionante acordar sem saber se irei morrer naquele dia. E essa não é uma estória de autodepreciarão. Mas, o que eu vou fazer da minha vida agora? Tenho uma poupança com dinheiro que junto desde os 15, trabalhando de babá, diploma de inglês, nenhuma ambição profissional e uma leve impressão de que meus pais me querem fora de casa.

Funcionários públicos e próximos da aposentadoria, vivem me mostrando reportagens sobre a busca pelo primeiro emprego ou universidades. Deixam "sem querer" anúncios de apartamentos a venda sob a mesa e até pagaram TKT para que eu pudesse lecionar inglês fora do país.

Não me admira que queiram férias de mim, eu também iria querer. Posso ser bem insuportável quando quero.

Outro dia, quando voltava de um passeio pela cidade, encontrei um panfleto de um cruzeiro sobre a mesa onde, geralmente, eles deixavam as indiretas para mim. Peguei e folheei, admirando as fotos do grande provável futuro Titanic 3.0.

- Oh! - disse mamãe, chegando a cozinha - Chegou agora, filha?

Assenti.

- Cadê o papai?

- Está ao telefone com um amigo. Gostou do que viu? - perguntou, assim que soltei o panfleto na mesa.

Dei de ombros.

- Você sabe que não sou muito fã de navios.

- Sim, sabemos. Por isso sua mãe e eu pensamos em conversar com você. - começou papai, encaixando o telefone sem fio na base - Estávamos pensando em ir neste cruzeiro junto com amigos daqui a poucas semanas. Você se importa em ficar sozinha?

- Quer dizer, - complementou mamãe - ficaríamos gratos em pagar-lhe uma viagem para conhecer novas culturas, mas, já que não gosta de cruzeiros, nós...

Eles já tinham sido melhores em tentarem me persuadir. Eu não sou um parasita para depender do dinheiro deles até depois da maioridade. E por isso não aceito o dinheiro oferecido para sair do país e deixá-los voltar a ser um casal, não uma "família". Se for para sair, sairei com minha poupança. Mesmo que não seja lá grande coisa.

Andei pesquisando uns países, descobrindo culturas e temperaturas, ocupando o meu tempo e me deparei com uma propaganda de boas passagens para dali a duas semanas. Pesquisei mais sobre o país, sobre os fenômenos naturais, sobre a qualidade de vida lá. Me vi apaixonada pelas paisagens, pelas praias, principalmente.

DrowningOnde histórias criam vida. Descubra agora