Há anos que passam voando; há outros que se arrastam tanto que parecem décadas. Já aquele último ano, para mim, tinha durado mais do que um século.
Acho que foi essa a razão pela qual nunca me senti tão ansioso quanto nos minutos finais para a abertura do salão do Clube dos Sírios. O baile do último dia de carnaval estava para começar. Um ano de espera e cada segundo dele se espremia nas três últimas voltas do ponteiro: a ansiedade; a busca de uma fantasia de arlequim que fosse a mais parecida possível com a do baile do ano anterior e que meu irmão caçula tinha estragado regando-a com suco de uva. A estranha febre de que fui acometido, dias antes de embarcar para a casa da minha tia em São Paulo, e que quase me impediu de estar presente; a chuva inclemente dos três primeiros dias de carnaval, que fez meus tios cancelarem a vinda deles para os bailes... Sobretudo, a constante lembrança da Claudinha, com seu cabelo chanel como que apontando para mim duas flechas, seus olhos negros amendoados e seu sorriso amplo. Espremido na fila para a entrada no salão, ainda podia sentir em meus dedos o toque frio de seu ombro ligeiramente suado enquanto meu rosto se aproximava do dela.
Um ano inteiro pensando em Claudinha... Custou mais a passar do que a soma de meus outros dezessete carnavais.
Agora, com passos miúdos, eu me dirigia, novamente, ao salão. "Ano que vem, estarei aqui, Plínio. Quem sabe a gente não se vê...". Respondi que sim. Mil vezes sim! Que eu voltaria para São Paulo nem que fosse a última coisa que eu fizesse na minha vida. Garanti a Claudinha que, no próximo carnaval, eu estaria ali, com a mesma fantasia, esperando por ela. Sorrindo com timidez, deu mais um selo nos meus lábios e sussurrou um "eu também! Com a mesma fantasia". Nunca alguém dissera palavras tão doces quanto aquelas.
Não se esquece de uma colombina como Claudinha, de saia rodada, ombros nus e uma máscara negra delicada nos olhos, que contrastava com a brancura da pele de seu rosto. Eu, ao menos, nunca a esqueci. Jamais tinha beijado ninguém até então. E não voltei a beijar. Essa castidade toda não fazia parte das promessas que, expressamente, fiz a ela; mas achei que lhe devia isso. Algo dentro de mim me assegurava que ela também passaria o ano todo mantendo seus lábios longe de qualquer outro sujeito. Se eu não fizesse o mesmo, era como se o encanto todo daquela cena se quebrasse para sempre.
Já eram dez e quinze da noite quando, finalmente, passei pela portaria, onde dois sujeitos mal humorados – e quem não ficaria, trabalhando como estavam em plena terça-feira de carnaval? – ticavam sem nenhuma pressa os bilhetes de entrada. Ao menos três marchinhas já tinham ficado para trás. Olhei com avidez para todos os cantos procurando por ela, mas essa primeira incursão visual não produziu bons frutos. Antes que eu tentasse me fixar no rosto das pessoas que passavam animadas por mim, meu primo Tadeu cutucou-me por trás.
– Que tal uma loirinha, primo?
Loirinha? A pergunta, não fosse pelo fato de que Tadeu era a pessoa mais parva do mundo, pareceria uma provocação. Eu lá queria saber de loirinhas? Por acaso, o Tadeu não sabia que a Cláudia era ruiva?
– Loirinha... – insistiu ele. – A gente divide uma...
– Não... – respondi, desviando o olhar para as pessoas em volta. – Prometi para a minha mãe que eu não ia beber nada.
– E ela lá vai saber?! Vamos aproveitar, primo! A vida é curta.
Sim. Eu sabia. Mas o ano tinha sido muito longo. Aquela noite era a única chance que eu tinha de rever a Claudinha e não podia me apresentar bêbado para ela. Voltei a dizer que não trairia a confiança da minha mãe e Tadeu virou-me as costas com um riso nos lábios, deixando escapar um "esse aí termina padre", enquanto se dirigia ao bar do clube, do lado de fora do salão.