XXI

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Bati à porta da mulher, esperando pacientemente por ser atendido. A casa parecia vazia, sem sons ou movimentação do lado de dentro, mas mesmo assim continuaria ali, esperando a volta da tal de Carrie.

Depois de muito insistir, a porta se abre finalmente, revelando do lado de dentro um adolescente rebelde, uma carranca no rosto. Ele me avaliou de cima a baixo, pensativo.

O ouriço verde vestia roupas rasgadas, um óculos na cabeça e fones de ouvido em volta do pescoço, que pareciam serem para jogar videogame. Ficamos ambos nos encarando, esperando as explicações virem. Revirando os olhos e respirando fundo, ele inicou, irônico:

- Não é todo dia que recebo visitas. A quem devo a honra?

Sinto o peso que segurava em meus ombros cedendo ao escutar sua voz, dando-me a entender que não precisaria passar por algo constrangedor na inicialização da conversação.

- Sou Shadow The Hedgehog, vim aqui para conversar com Carrie, ela está?

O garoto deu de ombros, desinteressado.

- Não. Quer esperar aqui dentro? - Ao assentir positivamente, me guiou por sua casa até a sala de estar, onde me sentei no sofá. - Meu nome é Scourge - profere, retirando os fones do pescoço, estes intercalando as cores de azul para vermelho, dando a entender que estavam ligados. - A Carrie já vai voltar, ela só foi no mercado.

- O que vocês são? - Minha curiosidade falou mais alto e não resisti à pergunta. Imaginei que me arrependeria, mas Scourge riu, respondendo simplista.

- Ah, somos colegas e bons amigos. Nos conhecemos na faculdade e acabamos por achar uma boa ideia morarmos juntos. Então, voilà, estamos aqui até hoje!

O sorriso astuto em seu rosto mostrava que era sincero, e resolvi acreditar em suas palavras, apesar de nem o conhecer direito. Ele não parecia alguém mau, apenas uma pessoa feliz.

E não é um adolescente, só parece um pelo estilo.

- Ah, que bom! - soltei, lembrando um tempo depois que não havia o respondido ainda. Ele não pareceu perceber a demora, seu sorriso se alargando.

- Ela é legal! Até acho que é irreal às vezes, de tão fofa.

Estava desconfortável com tantos elogios para cima de uma pessoa que era suspeita de abandonar um bebê na porta de um orfanato, mas ainda assim maneava a cabeça, sorrindo. Se não pode vencê-los, junte-se a eles.

De repente, a porta da frente se abre, alguém entrando eufórico na casa, o rosto coberto por sacolas de papel de algum mercado. Scourge foi o primeiro a se manifestar, correndo para ajudá-la no carregamento das compras até a cozinha. Eu, como um bom visitante, esperei na sala paradinho e sentadinho no estofado macio.

Isso não me impediu de ouvir suas vozes altas da cozinha.

- Tem um tal Shadow esperando por ti na sala.

- Nem sei quem é. Vou ver o que ele quer.

- Deve ser testemunha de Jeová.

- Com um nome desses? Duvido.

- Ué, se converteu.

A vontade de rir era grande, mas me contentei em revirar os olhos, esperando ser atendido. As vozes não cessaram, mas foram se aproximando.

- Enfim, tava terminando uma partida do videogame, é a última fase. Se eu passar, eu volto. Se eu não passar, não volto, porque vou ter me suicidado.

- Beleza, boa partida!

Mais uma vez, tive de respirar fundo para segurar os risos, escutando passos em minha direção. O ar foi todo embora de meus pulmões quando a moça sorridente aparece em minha frente, se sentando no sofá próximo a mim.

Os Mil e Um Você (Volume 1)Onde histórias criam vida. Descubra agora