Rei, Poeta ou Soldado?

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Ontem a noite a dor caminhou ao meu lado. Por isso eu nem lembro quantos cigarros eu fumei ou quantas vezes eu disse que eu te amo.
Eu acho que faleci em frente ao Copacabana Palace esses dias, atropelado por um Maverick anos 70 vermelho na busca do meu grande amor e você não estava lá. Pois na época que eu te conheci as fábricas já eram shoppings e ouvir a voz de Jimmi Hendrix no Walkman era quase impossível.
Você sabe que todas as vezes que eu disse que te amava eu fui sincero, meu bem. E todas as vezes que eu fumo e essa dor me vê na calçada e atravessa pra o outro lado, eu me lembro de quem eu sou ou de quem eu fui. Até porque eu lembrei que você ama ler as besteiras que eu escrevo, mesmo eu não sendo muito de escrever.
Talvez os livros que li me descrevam, e eu nem sequer terminei de ler a minha própria história. Mas eu te amo, falei outra vez.

"Que nossos versos se eternizem, nossos gostos se combinem e os desgostos nos ensinem. Que a vida seja simples. Tão simples quanto Zeca Pagodinho. - Um som de domingo, sol de 40 graus e churrasquinho. Ou até um friozinho daqueles que a gente tanto gosta e se enrosca em cobertor, em amor e proposta."
"Eu vim dos medos, dos segredos, dos olhares, dos pesares, dos andares e dizeres que o mundo esqueceu. Eu vou pra longe, pois sou um monge que se esconde em algum monte sendo a prata, o ouro, ou o bronze ter um beijo seu. E me apaixono a cada traço, por cada segundo que me envolvo em seu laço. Eu faço, desfaço, me lasco, refaço. Perco minha postura, ganho teu abraço. Eu poetizo o romantismo de não ser omisso."

Não haviam melodias pra tornar esses versos que o vento me trouxe uma canção fazendo as pessoas dançar numa noite de Jazz. E eu sei que a vida no fundo não é tão bela quanto parece, mas, Fernando Pessoa com certeza ficaria orgulhoso e diria "para viajar basta existir". Eu sei que você me entende.
E foi aí que eu peguei um vôo pra bem longe. Eu me isolei do mundo. Me lembro que da última vez que fiz isso encontrei Elis Regina e Clara Nunes sentadas juntas sorrindo e cantando; interpretando a música Sabiá de Chico Buarque. Onde anda o meu amor? Eu sei que parece loucura, e de fato é. Mas o que nessa vida é real além do que eu sinto por você?
Queria ter coragem o suficiente para dizer tudo aquilo que penso olhando nos olhos desta mulher, sentada ao pôr do sol, de costas pro caos, ela me olha serenamente.

Se por um acaso, esquecido, eu partilhasse tal vivência aqui sem diálogos tenho total certeza que ainda assim roubaria toda a sua atenção por horas. Todavia sem diálogo o amor desfalece e grita: tua droga é rápida. Eu sei que não teve graça, William Shakespeare quem me contou essa.
"Mas para onde tu viajaste, enfim, deste modo? Com um beijo."
"Oh, meu amor, não vos aborreça." Arfei "apenas deixei a vida, atravessei a ponte, passei pelo mar do esquecimento e retornei renuente ao meu ponto inicial."
Me resta viver neste ciclo até que o meu karma se sinta satisfeito e minha alma esteja de fato livre. Só então minha personalidade e minha alma estarão unificadas e a necessidade de reencarnação cessará.
Mas desta vez, era mais uma tentativa arriscada como um jogo de pôquer. Só que ainda mais vulgar. Com dispositivos móveis conectados a todo tempo, relacionamentos virtuais e jovens se embebedando com coquetéis de Vodka e seus corpos quase nus.

"Estás a tentar convencer-me de que fostes um rei, um poeta ou um soldado em outra vida?"
"Não sei bem o que fui, amor."
Juro-te que não é mais uma estratégia linguística do meu prosear. Mas pense vós. Se tivesse sido um rei tal como Francisco Alves meu adeus teria sido mais perpétuo do que o apresentado nas linhas anteriores. E imagine eu, poeta como Tom Jobim, pendurado a janela, frente ao corcovado, morreria ali.
"Se fosses um soldado não serias tão ingênuo."
"Então vamos apostar no eu poeta." Replico ao pegar sua mão. "Venha, vamos curtir a vida, irmão pequeno, e teremos boas horas sem razão"
"Não sou vossa irmã. Nem tampouco pequena. Mas razão certeza que tenho."
"Para um bom entendedor, meia palavra basta."
Sinto que me apaixonei. E pensar que em meu último laudo cadavérico minha morte foi dada por circunstâncias parecidas. Desta vez irei tentar não morrer até o próximo capítulo.

O Malandro Do PoetaOnde histórias criam vida. Descubra agora