Beijo De Espectro

A História pt2

  5 anos.
  Eu tinha 5 anos de novo.
  Corri daquele homem, meu tio, ele me tocava estranho e doía, eu chorava, ele me tocava de novo, e agora eu estava correndo. Quanto fôlego uma criança de 5 anos precisa pra correr de um tio que deseja seu corpo como deseja um bife de carne? O quintal da casa da minha mãe era grande, nós tínhamos criação de animais, então era um terreno amplo, eu precisava me esconder.
  Eu tinha apenas acordado, e vi um homem me fazendo carinho, mas eu não gostei desse carinho, eu não sabia o que era isso, minha mãe sempre estava ocupada para me oferecer carinho. Que tipo de carinho então era aquele? Por que agora? E porquê está doendo? TIO PARE, POR FAVOR!!!
  De repente, eu tenho machucados, eu estou gritando e sangrando, é um pesadelo? Eu consigo me desvencilhar das mãos que me apertam, mãos grandes, de homem, as mesmas mãos que me acordaram me fazendo carinho, que me seguraram durante esse momento, que me arranharam. Então o empurro e tudo o que eu faço é fugir, fujo, tomo ar e corro, onde vai me levar nem eu sei, mas eu preciso sair daqui. Ele é devagar, é alto porém com uma mobilidade baixa, e eu sou uma criança de 5 anos que acabou de ser violentada querendo socorro sendo que a única coisa que eu tenho agora é medo, o que me resta é só o medo.
  Passo pela porta do quarto e corro para a cozinha, que tem acesso a sala da frente da casa. Logo que chego na sala percebo o que está acontecendo, ele colocou o sofá para barrar a porta, pulo a janela da sala e vou na direção do quintal, eu escuto seus gritos, ele está me alcançando, então eu corro e puxo meu fôlego embargado de choro. Corro como se corresse mil quilômetros, corro como se o bixo Papão que me assombrava as noites estivesse me procurando, corro até meus pés pensarem mais rápido que minha cabeça infantil, corro para me esconder do verdadeiro bixo Papão dos meus pesadelos.
  A minha mãe não estava em casa, como sempre ninguém estava em casa, e dessa vez meu tio bêbado deve ter dormido lá, como as vezes fazia. Não tinha como pedir socorro, gritar estava fora de questão, eu queria me esconder, minha mente de criança só queria que aquilo fosse um sonho, mamãe dizia que sonhávamos com pessoas nos perseguindo quando estávamos crescendo. Então eu me escondi, entrei na casa do cachorro, ele gostava de mim, eu gostava dele, nós brincávamos eu lembro, ele iria me ajudar a me esconder, era meu amigo. Quando cheguei mais pra perto, vi o que meus olhos inocentes não imaginavam: havia algo, meu cachorro estava morto.
  Não consegui gritar, não podia, eu era esperta o bastante pra saber que precisava fazer silêncio. Fiquei lá, chorei por tudo o que me acontecia e fiquei lá até achar que meu tio não iria me achar, eu tinha que esperar minha mãe, que por sorte uns minutos depois estava gritando com meu tio tentando abrir a porta. E agora, eu estava tremendo, respirando ar com cheiro podre, mas nunca mais podre do que o homem que desejou meu corpo pequeno e frágil.

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Calafrios, água, vento, chuva, falta de ar.
  ONDE EU ESTOU???
  Abro os olhos e percebo que estou em casa. Na minha banheira, e... Meus olhos estão ardendo, passo a mão nos olhos no nebuloso desfocado... E, vejo alguém.

                                 ☆