SEM REVISÃO
O silêncio que permaneceu dentro da sala era algo quase palpável. Madalena respirou fundo e sentou-se a poltrona a sua frente. Rogério no momento que sentiu Camila soltar-se de seu abraço, deu alguns passos e se aproximou do pequena bar que se encontrava no canto da sala. Encheu um copo com a bebida mais forte que tinha ali e deu um longo gole na bebida.
Duda por sua vez, sentiu a mão de Paulo Vinicius na sua, sorriu ao ve-lo erguer e depositar um beijo nas costas de suas mão. Respirou fundo ao sentir seu corpo tenso, balançou a cabeça e deu alguns passos em direção ao sofá maior que continha na sala e sentou na beirada, acompanhada do homem que amava.
Fabio respirou fundo enquanto encarava a porta por qual sua filha havia acabado de passar. Balançou a cabeça, voltou seus olhos para a mulher que amava. Se aproximou com calma, abraçou o pequeno corpo, depositou um suave beijo em seus cabelos. Camila fechava os olhos ao sentir os braços protetores do amado.
Cada um deles permaneceu perdido dentro de sua mente e tentava entender em que momento o laço que deveria os unir havia se rompido e toda aquela tragedia havia acontecido.
Camila respirou fundo e inalou o cheiro que permaneceu em seus sonhos mais proibidos desde o momento que entrara no elevador a onze anos atrás. Ergueu o rosto e encarou Fabio que tocava em seu rosto e fazia uma suave caricia em sua bochecha direita com a ponta de seu polegar. Inclinou a cabeça aproximando seu rosto ao dele e assim depositou um breve selinho em seus lábios.
Camila reuniu toda as forças que pensou que havia perdido no momento que ouviu o médico alegando que sua menina havia morrido de um mal súbito. Voltou o rosto em direção a única responsável por toda aquela desgraça. Madalena estava de cabeça baixa, as mãos unidas uma à outra. Se afastou do corpo de Fabio, deu alguns passos e parou em frente a sua mãe que erguia o rosto e seus olhos travaram um breve batalha.
— Em toda minha vida, eu tentei entender o seu ódio por mim... Todas as vezes que os professores me elogiavam, eu queria fosse o seu elogio. Todas as vezes que me falavam o quão inteligente eu era para minha idade, eu queria ouvir da sua maldita voz. Eu sempre busquei a sua perfeição e aceitação. Mas não importava, tudo o que eu fizesse era errado aos seus olhos.
Camila parou por alguns segundos, puxou o ar com força. Sentiu as lágrimas escorrendo por seu rosto. De modo brusco passou as mãos por seu rosto.
— Pelo menos uma vez na sua vida, Madalena, seja a mulher que sempre se mostrou porta a fora dessa casa, olhe nos meus olhos e me fale, porque... — soluçou alto — não me ama!? O que eu fiz de tão errado para não ser digna do mesmo amor que transmite a Duda, a meu pai, até mesmo a minha filha. POR QUÊ?! Porque não pode me amar como ama a eles!?
Madalena fechou os olhos enquanto ouvia a filha caçula falar. Sentiu seu coração se apertar. Jamais quisera tratar Camila da forma como a própria acabara de dizer..., mas olhar para filha caçula, era se lembrar do seu primeiro pecado. Voltou os olhos para Rogério que permanecia de costas e cabeça baixa.
Se levantou, ajeitou sua calça que havia se amassado ao sentar de qualquer jeito na poltrona. Fungou e respirou fundo. Limpou as lágrimas que corriam por seu rosto. Encarou Camila que era abraçada por Duda e Fabio. Passou pelos mais novos e andou em direção ao homem que sempre fora dono de seu coração.
Rogério ao ouvir os passos se aproximando, depositou o copo que segurava com calma sobre a superfície de vidro. Girou o corpo lentamente, observou Madalena caminhar em sua direção. Os anos não afetaram em nada sua beleza. Ainda podia ver o brilho nos olhos azuis que conhecera quando tinham apenas dezessete anos.
Madalena parou em frente a Rogério, o único homem que amara por toda sua vida. Jamais precisara de outro para saber que o homem a sua frente era sim sua alma gêmea, mas ela infelizmente, em um momento de raiva e impulsividade havia quebrado o amor deles. Se jogou aos pés dele, enquanto chorava.
— Me perdoa. Me perdoa.
— Madalena...o que está fazendo!? — Rogério encarou confuso a mulher que estava ajoelhada e agarrada a suas pernas.
— Eu jamais quis trair nosso amor..., mas eu estava tão sufocada... tão carente.
— Do que exatamente está falando?!
Madalena se afastou, mas permaneceu ajoelhada, ergueu os braços que os contornou em torno de seu próprio corpo, em uma forma de buscar conforto naquela situação. Com vergonha encarou Rogério e confessou seu maior pecado:
— Camila...é fruto de uma traição.
— O que?! — Rogério sussurrou enquanto processava a informação.
— Eu jamais quis o trair. Mas desde o nascimento de Duda, você me jogou de lado. Duda havia se tornado seu mundo...enquanto a mim, você me dava apenas migalhas de um amor que fora seu mundo antes. Nem me procurava mais na cama!! Aquilo era confuso em minha mente. Eu ainda era sua esposa, sua mulher, sua amante — gritou — mas desde que Duda nascera, ela se tornou seu mundo!!
Camila balançou a cabeça, soltou um suspiro baixo, sentou-se na poltrona que sua mãe estava a poucos minutos. Tapou o rosto envergonhada de toda aquela situação que estava presenciando. Tudo agora se encaixava. De certa forma entendia a vergonha que a mãe sentia. Afinal o mesmo amor que ela acabara de confessar era o mesmo que sentia por Fabio.
Entendia o que era ter que guarda um segredo como aquele. Afinal jamais havia revelado que Fabio era o pai de Isis até aquele momento. Todo aquele sentimento de culpa que corroeu dentro de si todas as vezes que olhava para o ex-marido de sua irmã e tentava imaginar caso eles tivessem tido coragem e enfrentassem a todos. Compreendia perfeitamente o sentimento de mulher que a mãe professara ali, mas ainda assim, não fora justo com ela.
Duda encarava sua mãe que permanecia ajoelhada em frente a seu pai. Balançou a cabeça e deixou algumas lágrimas caírem. Sempre imaginou como teria sido, se tivesse tido um segundo filho. Como o teria lhe tratado, afinal ele seria fruto de seu casamento, mas não de seu verdadeiro amor.
As três mulheres permaneciam de cabeça baixa. Afinal todas se encontravam interligadas não apenas pelo laço sanguíneo, mas sim pelas escolhas que fizeram enquanto jovens e o quanto aquilo afetara profundamente a vida de quem lhe cercava.
Camila permaneceu amando Fabio enquanto ainda era o marido de sua irmã mais velha.
Duda fora fiel ao sentimento que tomou conta de seu coração no momento que avistara Paulo Vinicius pela primeira vez.
Madalena em um momento de raiva e frustração traiu o único amor de sua vida e precisou esconder a consequência de seu ato.
Por mais que três tivessem errado em algum momento, jamais deixaram de ser fiel ao seus corações. Antes mesmo de serem filhas, mesmo que uma tenha sido rejeitada pela mãe enquanto viviam sob o mesmo teto. Antes de descobrirem o quão forte podiam ser ao entender o que significava amor de mãe. Mesmo que uma tenha ferido uma filha para que a outra fosse feliz.
Todas ainda eram mulheres, não perfeitas, não exemplos de mãe e filha, apenas mulheres com suas falhas, medos e que quando precisaram erguer a cabeça e seguir em frente, cada uma fizera o seu melhor.
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Laços Que Nos Unem
Literatura FemininaUma família. Três vidas afetadas de formas intensas e dramáticas. Três mulheres. Três escolhas. E um segredo que ao surgir em um fim de semana podem mudar laços que jamais deveriam ser desfeitos.