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Meu caminho é cada manhã
Não procure saber onde estou
Meu destino não é de ninguém
Eu não deixo meus passos no chão

Nunca gostei muito de estar sozinho. Acho a solidão meio mórbida. De qualquer forma, não é como se eu quisesse estar cercado de gente hoje. Não, hoje eu queria estar só.

Se você não entende, não vê
Se não me vê, não entende
Não procure saber onde estou
Se o meu jeito te surpreende

Assistir a chuva cair através da tela na varanda de casa era tão mórbido quanto. Talvez eu não gostasse de estar só pois isso significaria estar sozinho com meus pensamentos. Simplesmente caótico, era assim que eu era. Era assim que sempre fui e só assim que sabia ser.

Se o meu corpo virasse Sol
Minha mente virasse Sol

Havia sido um ano caótico, talvez até mais do que eu jamais fui. Talvez por isso eu não estivesse sabendo lidar, engolir os fatos. Gostaria de dizer que normalmente não fico remoendo o passado, mas, infelizmente, eu tinha esse péssimo hábito, mesmo que evitasse ao máximo entrar nesse estado de constante melancolia. Eu juro que sempre tento estar mais animado quanto possível.

Mas só chove e chove
Chove e chove

— Merda.

Joguei a cabeça pra trás, me levantando em seguida para procurar o celular e pausar aquela maldita música que só piorava as coisas. Onde eu enfiei aquela porcaria?

Me arrastei até a sala de estar e vi o aparelho em cima da mesa de centro, sentindo um alívio instantâneo ao pausar a música. Porém, a sensação durou pouco, visto que logo em seguida senti o smartphone vibrar na minha mão, exibindo na tela o último nome que eu gostaria de ler hoje.

Respirei fundo ao jogar o aparelho no sofá, onde continuou vibrando por alguns minutos até parar, mas, para a minha desgraça, somente para voltar a vibrar instantes depois.

— Funerária Santa Luzia. Sua morte, nossa alegria. – atendi, me esforçando para não parecer o bosta que estava me sentindo.

— Amo seu senso de humor, Thi.

— Já falei para não me chamar assim, Gina.

— Vai agir assim até quando? – sua voz soava impaciente do outro lado da linha. Não que fosse novidade.

— O que você quer? Estou ocupado. – respondi com um suspiro, ainda mais impaciente. Tentando não ser um bosta, completei mentalmente.

— Preciso falar com você.

— Você já está falando comigo. O que quer?

Não sei se foi o meu tom ríspido ou se ela já estava irritada quando ligou, mas a ouvi suspirar e pude jurar que consegui ouvir as engrenagens funcionando no cérebro dela, pensando numa resposta.

— Pessoalmente. Preciso conversar com você pessoalmente. – fez questão de enfatizar a última palavra.

Desliguei a chamada sem dar resposta. Eu não estava pronto para aquilo. Descobrir um par de chifres no meu aniversário já tinha sido emoção suficiente. Já passava das quatro da tarde e, por mim, aquele dia já teria acabado há algumas horas.

Andei a passos largos em direção a cozinha, onde peguei uma long neck na geladeira e abri, sedento pelo líquido amargo, retornando à varanda após um longo gole. Eu e minha frustração.

Regina e eu sempre havíamos sido um caso complicado e nosso relacionamento sempre foi bem medíocre. Na maioria das vezes, era eu quem me esforçava mais e, autopiedade à parte, percebi tarde demais que estava apenas assumindo meu papel de trouxa. Uma amizade medíocre se transformou num flerte medíocre, viramos ficantes medíocres e evoluímos para aquela relação torta que chamávamos de namoro, onde eu estava disposto a quase tudo por ela e ela... é. Acho que fui meio gado.

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⏰ Last updated: Dec 17, 2023 ⏰

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Sobre partir || EM ANDAMENTO Where stories live. Discover now