Capítulo 23

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Ah, a juventude!

Como passa rápido! Assustadoramente rápido!

Você se vê com quinze anos, logo depois dezesseis, e quando menos espera está com dezessete quase dezoito, e se apavora ao perceber que se passaram três anos e você ainda não fez nada do que realmente queria fazer, apenas perdeu seu tempo com coisas fúteis que pensou serem importantes.

Aguinaldo estava espantado com a rápida passagem do tempo. Ele logo se formaria no ensino médio e não se sentia nenhum pouco preparado para o que viria a seguir.

Tudo o que tinha acontecido parecia não passar de um borrão em suas lembranças, e isso o incomodava muito. Ele tinha se esquecido da ansiedade que sentiu no primeiro ano do ensino médio, de como se apaixonou por Emê de Martnália, se esqueceu do alívio ao conseguir tirar notas altas em provas que nem eram mais importantes, e das sensações de conhecer pessoas novas.

Estava com dezessete e nem mesmo se lembrava direito de quem era aos quinze.

De fato, tudo era muito, muito estranho e passageiro.

Por isso, em um dia qualquer, enquanto assistia televisão, teve a ideia de se reunir mais um vez com seus melhores amigos, para criar novas memórias. Dessa vez, os convidou para aparecerem por volta das 4h da manhã. O plano era assistir o nascer do sol sentados no telhado da casa de Aguinaldo. Os outros três gostaram bastante da ideia.

Claro que Beltassamo foi o primeiro a aparecer, chegando às 22h e afirmando que dormiria na casa de Aguinaldo enquanto não precisassem subir.

Logo depois, por volta das 2h da manhã, Elcione chegou e disse que nem tinha conseguido pregar os olhos de ansiedade e animação para ver o nascer do sol. Ela sempre teve curiosidade de saber como era.

E Emê de Martnália foi a última a chegar, poucos minutos antes das 4h. Ela nem se surpreendeu ao ver que os outros dois tinham chegado primeiro e riu internamente de Aguinaldo porque sabia da tortura que ele devia ter enfrentado sozinho com os outros dois.

Martnália levou um saco de pães de queijo e Elcione levou uma garrafa de café e copos para lancharem no telhado e não tivessem a oportunidade de cochilar antes do sol nascer.

Sendo assim, os quatro subiram a escada que foi estrategicamente colocada perto do telhado e logo se acomodaram lá em cima. Aguinaldo e Emê sentaram um do lado do outro, Beltassamo se sentou o mais longe possível de Martnália e Elcione ficou o mais longe possível da beirada do telhado.

Ao levantar seus olhos para o céu ainda escuro, Martnália sussurrou para Aguinaldo:

— Desculpe ter estado tão distante esses últimos dias... eu...

— Estava ocupada com os treinos, eu sei — Aguinaldo sussurrou de volta, a impediu de terminar.

A verdade é que eles não tinham tido nenhum tipo de comunicação por quase uma semana e isso a assustava. Martnália olhou para seus pés e sorriu mesmo estando triste. Por algum motivo, ela não queria que ele compreendesse. Queria que ele brigasse com ela e exigisse mais tempo para si. Qualquer coisa era melhor do que aquela indiferença que Aguinaldo estava jogando em seus braços. Mas nunca diria isso em voz alta.

— Como você está? — ela perguntou ainda em sussurros.

— Eu tô bem, e você? — ele respondeu, ainda se demonstrando indiferente ao incômodo que ela sentia na situação.

— Tô bem, quer dizer... cansada.

Aguinaldo não respondeu. Dentro de si, uma guerra acontecia. De um lado, o lado apaixonado, ele queria passar os braços envolta dos ombros de Martnália e dizer que estava tudo bem, que ainda gostava muito dela e que tudo seria diferente dali em diante. E do outro lado, seu orgulho lutava bravamente contra se desculpar por algo que nem era sua culpa. Se ela estava com vergonha do que tinha feito, ele não tinha obrigação de a fazer se sentir melhor.

Tudo isso era culpa dela.

— Você está chateado? — Ela perguntou em um fio de voz.

Aguinaldo se virou na direção dela e encarou seus olhos. Ele realmente tinha mudado, parecia tão calmo ao lado de Emê. E fazia algum tempo que ela tinha reparado que os traços faciais dele estavam mais marcados, de alguma forma mais masculinos, e ele também estava mais alto, agora eram quase da mesma altura. E ela sabia que não deveria ser a única a perceber essas mudanças.

— Chateado com o quê?

Emê de Martnália riu de nervosismo.

— Vamos lá, não me faça dizer em voz alta... — Ela pediu em tom de brincadeira para não deixar sua vergonha tão óbvia.

— Na verdade, acho que mereço pelo menos isso depois que você sumiu, de novo.

Agora estava nítido para ela que ele estava muito chateado.

— Aguinaldo, você sabe como eu sou, eu dou essas sumidas de vez em quando, eu preciso disso... — ela tentou se explicar sem muito sucesso.

— Por que? Por que faz isso sem avisar pra ninguém? Você não pode simplesmente dizer "ei, preciso de um tempo", e parar de me deixar preocupado? — Ao dizer isso, os olhos tristes de Aguinaldo se encheram de lágrimas e isso fez o coração de Emê se apertar.

Ela não respondeu por alguns segundos, esse era assunto complicado.

— Sinceramente, nem eu entendo. Acontece tão de repente, de uma hora para outra odeio todo mundo e não quero estar perto de ninguém. Na verdade, não consigo estar perto de ninguém. Você não faz ideia de quantas vezes eu quis fazer isso esse ano, só que dessa última vez eu simplesmente surtei.

Aguinaldo franziu o cenho e imaginou que tinha caroço nesse angu.

— O que aconteceu na sua casa, com os seus pais mais especificamente? — Ele perguntou.

Os lábios de Martnália tremeram e ela sentiu uma súbita vontade de chorar misturada com gratidão por ter ao seu lado alguém que a entendia tão bem.

— Tudo continua como sempre, o problema sou eu que não encontrei uma forma de ignorar. Por último, meu pai disse que se eu continuar nessa "porcaria" de vôlei ele vai me expulsar de casa quando eu fizer dezoito.

Aguinaldo arregalou os olhos e disse algo para confortá-la, mas em seu íntimo ele mesmo estava cansado dessa situação com Martnália. Ele mesmo passava muito problemas com sua mãe e mesmo assim tentava não descontar nela.

Aguinaldo sentia que seu poço de compreensão interna estava secando.

Infelizmente, nenhum dos problemas deles se resolveram nessa madrugada, e continuariam incomodando por muito tempo. Porque é assim que a vida funciona aos dezessete anos e talvez em todas as idades: as coisas dão muito errado.

O sol nasceu, Aguinaldo e Emê de Martnália assistiram e nem perceberam que Elcione e Beltassamo já tinham caído no sono, assim como não perceberam muitas coisas que não foram ditas.

Mesmo assim, os dois continuaram empurrando a situação com a barriga, evitando confrontos maiores e despedidas dolorosas. Estavam acostumados demais com a presença um do outro, foram quase três anos juntos, para reconhecerem para si mesmos que naquela relação a única coisa que resistia firme e forte era a fadiga.

Continua...

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