Sozinha

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Afastei instintivamente o rosto, corando. O garoto sorriu maliciosamente, exibindo um sorriso perfeito e perigoso, com os caninos superiores bem desenvolvidos, como um vampiro. Virou-se rapidamente em direção à porta e pude sentir o cheiro dos seus cabelos. Era surpreendentemente delicioso.

- Acho que já vou indo, se já terminamos aqui. – Keisuke disse parando próximo à porta. Sua voz era muito grave para um garoto de apenas 17 anos.

Minha dupla ainda parecia uma múmia do meu lado, tão encolhida quanto o outro interno. Eu sentia que precisava falar alguma coisa para continuar a atividade, mas estava completamente desconcertada pela atitude do garoto.

- N-não! Quer dizer... ainda gostaríamos de conversar mais... – Eu apertava as mãos suadas.

Ele se virou, parecendo interessado. Cruzou as pernas e os braços, apoiando-se de lado no vão da porta.

- O que você quer saber? – Perguntou abaixando a cabeça e me olhando com um olhar desafiador.

- O que vocês fizeram para estar aqui? – Emi interrompeu com uma voz esganiçada, sem levantar a cabeça.

Ren ficou inquieto na cadeira, estalando os dedos. Keisuke, descruzou os braços e enfiou a mão em um dos bolsos do uniforme do reformatório, tirando um elástico de cabelo. Ele prendeu os cabelos folgadamente, deixando alguns fios de fora.

- Eu roubei algumas lojas. – Respondeu Ren.

- Não importa o que eu fiz para entrar aqui. Importa o que eu vou fazer para sair. Em um mês eu faço 18 anos e não está nos meus planos ir para a cadeia. Mas se interessar, eu sou membro de uma gangue. – Keisuke respondeu dando alguns passos para frente. O uniforme do reformatório, uma camisa branca com um número e uma calça de moletom preta, não escondiam seu corpo que apesar de magro, era forte, musculoso. Neste ponto eu já me esforçava para não ficar olhando para ele.

- Entendi... e como você pretende sair daqui? – Arrisquei.

- Ganhando pontos. Participando de atividades chatas que nem essa. – Respondeu virando-se novamente.

Você não sabe o quanto isso é chato para mim também – Pensei e quase falei em voz alta, mas me contive e tentei ser simpática.

- Bom, acho que já temos bastante coisa aqui. – E me levantei, sinalizando com a cabeça para a minha dupla levantar também.

- Muito obrigada pela disponibilidade e pela colaboração de vocês. – Me curvei em agradecimento, caminhando em direção à porta.

Ren permaneceu sentado onde estava e Keisuke estava a alguns passos da porta. Emi saiu primeiro.

- E Keisuke, não se preocupe, tentaremos tornar essa atividade menos chata das próximas vezes. – Alfinetei-o sem fazer contato visual.

Em um movimento muito rápido e discreto, Keisuke se aproximou de mim segurando meu braço, me fazendo parar. Senti meu coração disparar naquele momento e meus olhos buscaram o guarda no corredor sem sucesso. Antes que eu pudesse fazer qualquer movimento ou gritar, Keisuke aproximou sua boca do meu ouvido.

- Da próxima vez, venha sozinha. Estarei sozinho também. – E soltou meu braço, caminhando tranquilamente em direção à porta com as mãos nos bolsos.

Senti meu corpo todo amolecer e ser invadido por uma onda de adrenalina. Parecia que eu tinha esquecido como andar, minhas pernas simplesmente não obedeciam. O guarda apareceu na porta.

- Sua colega está te aguardando. – Falou sério.

- Ok.

Minha cabeça dava voltas enquanto eu me esforçava para caminhar e tentar parecer normal diante do resto da turma que se juntava para atravessar novamente o pátio. Todos pareciam empolgados em compartilhar os acontecimentos da atividade.

Ficamos mais alguns instantes reunidos na sala discutindo sobre a atividade e sobre o relatório que teríamos que fazer. Não consegui falar nada. Ao final da aula, vi que os alunos estavam saindo aos poucos enquanto a professora ainda estava sentada organizando alguns papéis. Eu precisava me decidir.

- Profª. Hirano? – Me aproximei, ainda incerta do que eu estava fazendo.

- Sim, Srta. Kitamura? – Ela me olhou por cima dos óculos de forma simpática.

- Eu...eu queria pedir um favor. Tive contato com um interno hoje e acho que poderia trabalhar bem com ele. Ele pareceu difícil no começo, mas acho que posso ter avanços com ele. Gostaria de fazer as atividades com ele sozinha. – A cada palavra que eu falava eu me sentia mais maluca, eu só podia estar maluca.

- Entendo Srta. Kitamura...tem certeza de que isto é prudente? Esse tipo de laço pode ser prejudicial para ambos. – Ela cruzou os dedos sob o queixo, cerrando os olhos.

- Estou ciente e não irei deixar isso acontecer. Estou interessada em aprender. – Menti, mais uma vez.

- Certo. Por mim tudo bem. Se sentir que precisa de alguma orientação, sinalize. – E voltou-se para a papelada.

Me virei totalmente incrédula do que eu havia acabado de fazer. Menti descaradamente para uma professora, no meu primeiro período da faculdade, com o único objetivo de me aproximar de um delinquente que em poucos minutos de contato havia bagunçado todos os meus pensamentos e praticamente me colocado em transe.

Eu estava ferrada. 

Prenda-me. - Keisuke BajiOnde histórias criam vida. Descubra agora