Dear, this mess was not intended when I began...

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É inútil tentar descrever o "antes" daquele despertar. A consciência não emergia de um mero sonho dormente e abstrato, mas da constância vazia do maior dos medos humanos. E que experiência há para se descrever naquilo que é definido pela inexistência? Um segundo atrás... Nada. Não havia nada. Apenas um corpo posicionado com cuidado no centro de um salão escuro. Tinha sido uma mulher. Seus cabelos estavam bem penteados e ela usava roupas leves e cerimoniais, tudo por meio de outras mãos, menos frias e inertes do que as que repousavam ao lado do corpo, tão rígida quanto o mármore sob elas.

Se em um segundo não havia nada, no seguinte ela abriu os olhos. Como uma criança que acabava de vir ao mundo, nada do que via fez sentido, tudo a assustava, não por ser desconhecido, mas por saber que não deveria estar ali. Os pulmões até a pouco inativos sentiram a dolorosa expansão de novamente abrigar ar dentro de si, fazendo o peito subir e descer violentamente até que o antigo ritmo retornasse e o ar parasse de queimá-la por dentro. Ela já estava sentada com a mão no peito, sentindo o ar estranhamente quente que escapava de seus lábios entreabertos. Aterrorizada e cega pelos múltiplos estímulos do mundo material como se tivesse nascido uma segunda vez, ela entendia apenas fragmentos da realidade: o gosto metálico, a dormência dos músculos, um líquido deslizando sobre sua testa, o cheiro de incenso queimado. Eram coisas individuais que não conseguia unir em um único quadro.

Abriu e fechou as mãos, sua mente começando a entender que estava ali, dentro daquele corpo outra vez, que era real e podia controlá-lo. Ainda observando as mãos com estranhamento, sons ritmados preencheram o local, e ela só lembrou que este era o som de passos quando um homem atravessou a porta e hesitou na entrada, encarando-a com alívio e ternura.

- Adrienne, você... Você está aqui... - Ele sorriu e chorou ao mesmo tempo, desprezando a distância entre eles em poucos segundos. A luz de uma vela que ela não percebera antes brilhou no caminho que as lágrimas deixaram em seu rosto, e sem esperar resposta, ele a abraçou.

Adrienne. A familiaridade parecia certa. Adrienne e Steven Bradley.

Adrienne não lembrava de já ter recebido um abraço assim. A força e o rosto de Steven enterrado em seu pescoço a fez perceber que o gesto era mais necessário para ele do que para ela.

- Que bom... Que bom que deu certo - ele disse, e riu como uma criança. - Eu passei dias para conseguir. Penteei seu cabelo, cuidei de você... Eu cuidei de você, Adri. Ah! Eu... Eu encontrei seu colar...

Ele tirou do bolso um adereço simples, uma pedra azul translúcida em um cordão preto. Adrienne olhou do homem para o colar e de volta para ele, a vela refletindo em seus olhos pelas lágrimas contidas. Com seu olhar sentido, quase como se ela ainda pertencesse ao luto e à dor, o sorriso dele esmaeceu, e ele abaixou o colar. Ele ainda chorava silenciosamente, estudando cada reação.

- Você disse que era o seu colar favorito.

Adrienne tocou o pescoço, sentiu as escoriações na pele com a ponta dos dedos, e por um instante o ar desapareceu. Sua mão envolveu o pescoço quase inteiro, segurando-o sem muita força, mas a sensação era muito parecida com a memória de outras mãos naquele lugar. O presente e o passado aconteciam ao mesmo tempo, ela era uma nuvem ao amanhecer, aquecida em uma face pelos primeiros raios do sol enquanto o outro ainda encarava a noite. Adrienne o encarou com uma expressão séria.

- Escute, amor - Steven estendeu a mão para o pescoço dela.

- Não encoste em mim...

Mágoa e rancor em cada palavra. Finalmente, uma lágrima escorreu pela bochecha direita e seus dedos vacilaram, trêmulos. Ela soltou o aperto em seu pescoço. Steven se sentou, a cabeça entre as mãos, soltando um longo suspiro antes de suportar a acusação dos olhos dela outra vez.

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⏰ Última atualização: Apr 28, 2023 ⏰

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