Quanto tempo

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"Quanto tempo o tempo tem?
Eu não sei, não lembro muito bem
Mas aquele sentimento eu não esqueço"

Calidez. Essa foi a primeira coisa que Simone Tebet sentiu quando, já era quase de manhã, e ela despertou mesmo sem abrir os olhos. A ministra do Planejamento e Orçamento apenas sorriu contra o travesseiro porque havia dois braços fortes ao seu redor. Os braços de Alessandro Molon, e aquele perfume único pelo qual ela é apaixonada, uma combinação perfeita de maresia, alegria genuína, cedro, e uma mistura tentadora de Minas Gerais com Rio de Janeiro.

Felicidade. Esse foi o segundo sentimento ocupando sem pedir licença o peito de Simone naquela manhã de quarta-feira, logo após a Páscoa. Preguiçosamente, ela abriu os olhos, piscando na luz fraca do amanhecer que entrava pelas cortinas do quarto. Era como se sentisse algo florescer em seus pulmões. Tão bonito que não quis nomear, talvez nem soubesse.

Tebet respirou fundo, se permitindo ficar naquele aconchego, afinal ainda levaria um tempo até seu primeiro despertador tocar. No dia seguinte, logo pela manhã, ela iria para São Paulo cumprir agendas e só retornaria a Brasília no domingo à noite. A ministra fez um carinho suave no braço bronzeado pensando no feriado de 1º de maio, não muito distante.

Desde o carnaval, ela queria organizar um tempo maior para os dois além dos encontros que quase sempre conseguiam manter no meio da semana, quando a agenda dela de ministra e os horários dele de professor permitiam, ou quando os fins de semana dos dois em Brasília coincidiam no calendário. Na Páscoa, Alessandro foi com a mãe visitar uma parte da família em Belo Horizonte enquanto ela foi para São Paulo passar os dias de folga com as filhas.

A ideia de voltar com ele ao Guarujá, mas sem chuva, sem trabalho, apenas para estar na casa em frente ao mar, aproveitar a praia quase particular que havia ali e a companhia do namorado, tomava forma dentro dela. A ministra sentiu os braços se apertarem ao redor de si e sorriu ainda mais largo. Um beijo em sua nuca, os lábios macios roçando em sua pele fizeram o corpo de Simone reagir imediatamente. Ela riu baixinho.

- Você tá pensando tão alto que, mais uns cinco minutinhos acordado, e eu consigo ouvir o que é - Alessandro sussurrou, puxando Simone mais para junto de seu corpo, inalando o perfume dela. Tebet suspirou.

- Tá muito cedo ainda, volta a dormir - a ministra falou com a voz um pouco mais rouca do que o habitual.

- Cê não vai mesmo me contar no que tava tão concentrada? - Molon deixou um beijo no pescoço dela, bem perto da orelha, tentando convencê-la.

- Talvez... quando a gente estiver tomando café, logo mais, tá bem assim? - ela se virou dentro dos braços dele e se aconchegou bem junto do professor, entrelaçando as pernas dos dois.

Alessandro apenas resmungou uma resposta que era qualquer coisa ininteligível, mas não importava, porque tinha Simone junto dele, os corpos se tocando por inteiro, a troca de calor na pele. Ela sentiu um beijo suave nos cabelos e retribuiu o carinho beijando o ombro dele, já de olhos fechados.

Em outros tempos, Tebet não teria se importado de levantar mais cedo do que seu horário pedia, não teria se importado de começar mais cedo do que precisava com suas obrigações. Apenas porque não havia motivos para que não o fizesse. A cama era apenas dela. Mas ali, na companhia de Alessandro, ela desejou ter muito mais do que apenas mais uma hora de sono. Por trás de suas pálpebras, Simone Tebet sonhava com uma manhã preguiçosa, feita de beijos, sorrisos e cumplicidade.



Estavam juntos à mesa do apartamento novo dela, Alessandro tinha se servido da segunda xícara de café e observava Simone segurar a segunda xícara de chá, mas com o olhar distante e o pensamento mais ainda. Ele gostava de poder ser testemunha desses momentos em que ela viajava para dentro de si, como se estivesse fazendo algum combinado com ela mesma. O professor sempre esperava o tempo da ministra, achava que interrompê-la seria quase um pecado. Entendia também como sinal de intimidade entre os dois que ela se permitisse esses momentos de divagação enquanto ele estava presente.

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