𝙬𝙖𝙣𝙣𝙖 𝙛𝙞𝙣𝙙 𝙡𝙤𝙫𝙚?

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Talvez as noites em claro fossem suas favoritas na cidade grande. Madrugadas vivas e coloridas, repletas de letreiros cintilantes e cafonas que exibiam espetáculos e anúncios de produtos; madrugadas preenchidas por visitas tardias em cafeterias ainda abertas e incertezas sobre onde você acordaria no dia seguinte.

Tóquio era viva. Na verdade, você gostava de acreditar que era justamente à noite que ela acordava de fato. Quando o céu já estava escuro e as vozes da rua cada vez mais altas, esse era o momento em que você renascia.

Mas é claro, era tudo uma visão romantizada e megalomaníaca de alguém que havia crescido fora da capital, onde a noite não era tão viva e as relações não tão líquidas. 

Letreiros feios e vulgares, pessoas mal educadas e atrasadas que transitam como zumbis, garotas escolares escapando com homens mais velhos e engravatados, becos sombrios onde a marginalidade se escondia juntamente com os ratos à espreita das lixeiras bem cuidadas e a irrelevância de relacionamentos íntimos: isso era tudo que Megumi, nascido e criado na capital, conseguia enxergar de verdade.

Ele te observava de canto, nunca admitiria que realmente estava te olhando. Via como seus olhos brilhavam sempre que cruzavam com a porta de vidro da loja de artigos musicais na qual trabalhavam juntos. Era pela porta transparente que você via a cidade se reconstruir na noite, e ele nunca entendeu como algumas luzes idiotas e pessoas apressadas se esbarrando pelas calçadas conseguiam te encantar tanto.

Megumi estava tirando a poeira de prateleira dos discos de rock, sempre distante e calado, terrivelmente calado. Calado de uma forma que embrulhava seu estômago, principalmente quando você estava há pelo menos três meses procurando alguma brecha, a menor que fosse, para que pudesse se aproximar. Suas noites com caras desconhecidos e bicos em lojas de departamento nunca conseguiram tirar de você a adrenalina que a espera por uma resposta do moreno pálido conseguia, e nada te viciava mais que o desespero para ser percebida.

Eram apenas algumas palavras trocadas pelo expediente da noite, por mais que vocês trabalhassem juntos e sozinhos na pequena loja. Nenhuma rede social, ao menos não com o nome dele, nenhum papo sobre o futuro, nenhuma dica sobre o que ele fazia da vida quando as luzes da loja se apagavam e vocês seguiam caminhos opostos na volta para casa.

E seria patético pensar que você se veria tão desesperada pela atenção de um garoto que sequer te olhava direito, mas nos breves momentos em que os olhos dele batiam nos seus, não havia dúvidas de que precisava tê-lo.

- Fushiguro. - chamou ele, que te respondeu sem ao menos virar para te olhar. Ainda estava terminando de limpar os discos e não gostava de ser interrompido pelas suas perguntas intrometidas.

Na verdade, Megumi achava você um saco. Bem, não podia te culpar, era óbvio que você não imaginava que ele percebia a ansiedade no seu tom de voz sempre que fazia alguma pergunta sobre bandas e músicas para ele, mas Fushiguro era um garoto observador e bom farejador de mentiras; ele lia com clareza as intenções por trás dos seus olhares de canto e sorrisinhos forçados.

E ele sabia o quanto você morria todos os dias para conseguir se aproximar minimamente dele, era de dar pena.

Quem precisa perder tempo com relacionamentos? Não eram para ele, nunca foram.

A necessidade afetiva, o compromisso, a presença, a prestação de contas e dramas românticos nunca estiveram na lista de desejos do Fushiguro, que sempre se surpreendia com os rostos diferentes que iam te buscar ao fim dos expedientes. Você era o tipo de pessoa que ele mais evitava ter por perto: a grudenta; o apego ansioso, os casos, os flertes desnecessários e o perfume adocicado quase tão perigoso quanto uma arma branca.

𝙩𝙝𝙚 𝙘𝙞𝙩𝙮; megumi fushiguroOnde histórias criam vida. Descubra agora