Capítulo 4

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— Bom dia, dorminhoca — meu primo me cumprimentou quando eu apareci na sala, enquanto passava o café na bancada da cozinha

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— Bom dia, dorminhoca — meu primo me cumprimentou quando eu apareci na sala, enquanto passava o café na bancada da cozinha.

Ele sorria, como se nada nunca tivesse acontecido entre nós.

Ao que parecia, Fred não havia mesmo guardado mágoa sobre tudo aquilo. E eu estava aliviada por isso: era como se eu estivesse livre para acordar em sua casa, sem me sentir constrangida, culpada ou arrependida.

Às vezes, era difícil vê-lo como o adulto de 25 anos que se tornou, depois daquela puberdade avassaladora. Ele ainda parecia o mesmo adolescente irritante que levava seus amigos barulhentos para jogar, no quarto ao lado, na casa da vovó.

Mas a verdade é que ele sempre se esforçou para parecer mais maduro pra mim. Fred nasceu para ser um irmão mais velho. Mas tanto ele, quanto eu, éramos sozinhos, filhos únicos de pais que não queriam filho algum. É por isso que a vovó nos pegou para morar com ela. Primeiro ele, desde bebezinho, e depois eu, que levou um tempo até ela resgatar, com cinco anos. Fred costumava brincar com isso dizendo que nós dois éramos os órfãos que a vovó adotou.

Sendo assim, nós tivemos um ao outro por muito tempo. E embora Fred sentisse a necessidade de implicar comigo a todo momento, ele também parecia sentir o mesmo por me proteger, sabendo que era o único homem com o qual eu pudesse contar. Isso se traduzia na escola, nas brincadeiras da rua e em todos os lugares que a vovó insistia em nos levar.

Teve uma época, especialmente, em que eu me sentia a criança menos amada da face da terra. Estava começando a tomar consciência das coisas e a me comparar com as minhas amigas. Pra ajudar, a festinha de dia dos pais se aproximava na escola e eu nunca tinha participado de nenhuma delas. No dia das mães, eu levava minha vó, mas achava que seria estranho fazer o mesmo.

Fred me pegou, cabisbaixa, na volta da escola, com o convite nas mãos. Ele medisse para ensaiar a apresentação com os meus outros colegas de turma. Eu não entendi muito bem, mas apenas o obedeci. No dia, ele vestiu uma blusa social maior do que ele, dançou comigo até não aguentar mais e participou de todas as dinâmicas, rindo. Eu tinha 8 anos e ele, só 15.

— Seu travesseiro continua tendo cheiro de baba — é a primeira coisa que eu digo, com a voz ainda rouca.

Fred ri. Ele ainda estava todo arrumado, com um boné e uma camisa de banda, as tatuagens escapando pela gola até o pescoço e pelas mangas para os dois braços. O seu rosto, embora tranquilo, estava abatido, com os olhos pesados. Provavelmente ele estava virado e tinha acabado de chegar da rua.

— Quer café?  — ele oferece.

Assinto, enquanto me sento no banquinho alto, observando o bigodinho que ele deixara crescer. Tantos anos de tentativa e ele finalmente conseguiu ficar bonito com aquela coisa.

— Então, quer dizer que você conheceu meu colega de apartamento.

Dou um sorriso de lado.

— Conheci. De um jeito meio merda, mas sim. Ele é um carinha legal.

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