Todos os dias de manhã eu agradecia por ser uma mulher feliz com minha profissão, mas hoje eu fiquei bem mais agradecida que nos outros dias. Se eu não fosse uma educadora física e consequentemente não tivesse bons pulmões graças a isso, eu teria morrido na segunda leva de balões que tive de encher. Mas era por uma boa causa. Uma ótima causa, na verdade.
Eu amava festas de aniversário quando era criança mas nunca entendi muito bem o porquê de meus pais fazerem tanta questão de que eu tivesse uma. Sinceramente, eu não entendia muitas outras coisas que eram indispensáveis para eles quando se tratava de mim mas hoje eu os entendo. Mencionei minhas festas de aniversário porque hoje comemoramos o primeiro ano de minha filha Catarina. Logo eu, que nunca me imaginei mãe.
Quando Clara e eu nos conhecemos, eu sabia que estava pronta para amar e ser amada, mas ela só sabia amar. Mas eu sabia que aquilo era o produto de anos e anos convivendo com uma pessoa rude e sem escrúpulos. Ela tinha um filho incrível que não estava em um bom momento e um marido ruim. Devo ter perdido as contas de quantos conselhos dei a ela. Também devo ter perdido as contas de quantas vezes senti meus pés longe do chão na presença dela.
Eu estava pronta. Eu sabia muito bem o que eu queria e o que não queria em alguém. Entretanto eu não esperava que Clara pudesse preencher essa vaga.Clara se tornou um sinônimo de força desde as primeiras aulas. Não era tarefa fácil se livrar de uma dependência emocional mas ela tirou de letra, claro, com muita calma e terapia. Nesse processo, acabamos nos envolvendo. Me recriminei muito e até tentei me afastar. Mas era como se os nossos caminhos se cruzassem. E então, depois de um tempo, finalmente estavamos prontas para o que poderíamos ter juntas.
Cada amanhecer ao lado dela tinha um aroma diferente, uma cor diferente, uma nota diferente. Não levou mais do que meses até que eu a pedisse em casamento e levasse um não. Eu chorei e saí de casa pra nunca mais voltar. Voltei algumas horas depois e ela quem me pediu em casamento, dizendo que aquilo era um direito dela já que eu nunca havia sido pedida em casamento e ela já. Eu aceitei, enquanto lágrimas de alegria se misturavam ao meu riso de diversão.
A vida seguiu seu curso e fomos acumulando algumas riquezas: nosso apartamento, nossos gatos, um amontoado de fotos nossas e do Rafa e um Jeep que nos levava pelo litoral e o interior em busca de novos lugares e ares. Eramos felizes. Mesmo quando uma das duas esquecia de alguma coisa, ou quando uma discussão acontecia. Ela ainda era a mulher com quem eu desejaria estar todos os dias da minha vida.
Até que um dia estavamos assistindo um filme e apareceu um casal homossexual segurando um bebê. Pelo canto do olho, vi Clara fazer uma expressão curiosa. Sorri apaixonada e voltei a focar no filme. Mas minha esposa continuou meio estranha pelos dias que se seguiram. Vez ou outra, eu a encontrava pensativa em algum canto; as vezes ela acabava se distraindo no meio de alguma conversa; e eu até a flagrei re-assistindo aquele filme.
Foi numa das nossas conversas noturnas que ela matou minha curiosidade. Estávamos abraçadas na cama com a luz apagada quando a ouvi sussurrar, me buscando.
– Meu amor. – Chamou e respondi num muxoxo. – Você lembra daquele filme? Aquele do casal com o bebê.
– Lembro sim. O que tem? – Perguntei procurando seus olhos em meio ao breu.
– Eu... Eu meio que... Eu fiquei pensando... – Clara gaguejou e respirou fundo. – Eu senti falta do Rafa sendo um bebê, sabe? As bochechas, a boca banguela e os pés em forma de bisnaguinha. – Comentou saudosista e eu sorri. – Nossa, eu queria tanto ter dado um irmã pro Rafael. Não com aquele crápula, claro. Mas sei lá... Me sinto meio... Argh, não sei explicar.
Aquilo foi o bastante pra me fazer entender o que minha esposa queria dizer.
– Você quer ser mãe de novo, Clara? – Perguntei e ela não disse nada por alguns segundos. Era a confirmação.
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as coisas tão mais lindas • 𝑪𝒍𝒂𝒓𝒆𝒏𝒂
Fanfictiononde numa tarde enchendo balões, Helena relembra uma linda jornada.