Tatuagem

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— Dalila, vou sentir tanto sua falta, minha querida! 

Minha avó Tereza estava num misto de felicidade e tristeza naquela rodoviária. Seus olhos caramelos brilhavam de orgulho.  Eu estava indo embora do interior para morar com meu irmão mais velho na capital. Consegui entrar na faculdade, para o curso de História. 

Quando o ônibus partiu, ainda pude ver minha avó acenando para mim e se virando para seguir seu caminho, com seu corpo curvado pela idade e uma mão na lombar. Alguns dos fios de seus cabelos brancos estavam soltos do coque no alto de sua cabeça. Com certeza, vou sentir muita falta da minha avó. Ela praticamente criou a mim e meu irmão Thales depois que perdemos nossos pais a 13 anos atrás.  

Encostei minha cabeça no banco do ônibus me lembrando dos meus pais. Tinha apenas 5 anos quando eles partiram. Minha mãe estava consertando o teto alto do celeiro e meu pai que estava chegando da colheita, quando a viu no teto, correu para ajudá-la. Minha mãe sempre foi do estilo “faça você mesmo” e estava incomodada com o buraco no teto do celeiro, preocupada que quando chovesse, molhasse os alimentos dos animais da pequena fazenda.

Ocorre que antes mesmo que meu pai chegasse até ela, por obra do destino ou algo maior, o celeiro veio a desabar. Nenhum dos dois sobreviveram. É triste, mas conseguimos levar a vida depois disto. Passamos a ser criados por nossa avó materna, que morava conosco na fazenda.  

Vó Tereza tomou a frente dos negócios da fazenda e meu irmão e eu sempre a ajudávamos, mas ela sempre deixava claro que nossa prioridade era estudar. Portanto, meu irmão foi embora para a capital quatro anos atrás.  Conseguiu passar na faculdade para veterinária, e já estava trabalhando numa clínica como assistente de um médico veterinário. Meu irmão já era casado, apesar de jovem. 7 anos mais velho que eu, então, aos 24 anos, ele já tinha um filho de 2 o Murilo e a esposa dele, sempre foi como uma irmã para mim. Lídia e eu sempre nos demos bem. Ela ficou muito feliz com minha ida para a capital para estudar e estava se movimentando para me ajudar a conseguir um trabalho. Com 17 anos, não seria tão fácil, mas ela conseguiu uma vaga de atendente numa loja de uma amiga dela, não muito longe de casa. Assim que eu chegasse da faculdade, almoçaria e iria para a loja até as 19hs. Para mim, que estava acostumada com a lida do campo, iria ser fácil, a dona da loja na verdade, queria mais a companhia de alguém do que uma funcionária. 

Cheguei na rodoviária, depois de 7 horas de viagem. Olhei o relógio que marcava 5:15h da tarde. Peguei um espelho na bolsa para checar minha aparência. Meus longos cabelos castanhos estavam no lugar, meu olhos caramelos iguais aos da minha avó pareciam descansados, afinal de contas foi possível tirar um cochilo durante a viagem, e minha pele morena clara do sol da lavoura estava viçosa. 

Desci do ônibus e Thales já me esperava. 

__Dalila, que saudade! - me abraçou apertado e me deu um beijo na testa. 

Meu irmão sempre foi muito carinhoso comigo. De alguma forma, eu sabia que ele se sentia responsável por mim depois que perdemos nossos pais. Ele era mais que um irmão, era o meu melhor amigo. Nos falávamos todos os dias depois que ele me deu um aparelho celular de presente de aniversário. 

Na casa dele, da porta, eu já senti o cheiro gostoso do jantar. Lídia disse que iria caprichar e ela não mentiu. Estava tudo muito bom. Apesar do cansaço da viagem, ainda brinquei um pouco com meu sobrinho Murilo e o coloquei para dormir. Morando com meu irmão e minha cunhada, eu os ajudaria a tomar conta do menino rechonchudo. 

Alguns dias depois, comecei as aulas na faculdade no período da manhã e à tarde, ia para a loja de dona Cleonice. Uma senhora muito simpática, muito pacata. A loja até tinha um bom movimento até as 17hs. Depois disto, o movimento diminuía bastante e ela me permitiu que eu usasse o computador da loja para estudar se eu quisesse. Eu tinha uma patroa muito boa.  

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