4| Amuleto

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Os próximos dias após a morte de Jacob e a declaração de sumiço por parte de seus outros amigos, foram mórbidos. Alice parecia estar vivendo o luto intensamente, o que me fazia acreditar fortemente na teoria e que ela e Jacob estavam juntos mesmo durante o tempo em que ele dava em cima de mim, o qual era bem recente.

Eu também não estava nada bem. Parecia que um peso muito grande se apoderou do meu corpo, como se eu fosse a estranha ali... Algo que me tornava diferente. Meus pesadelos haviam sumido, mas meus pensamentos agora eram voltados para a possibilidade de que eu pudesse estar louca.

Sim, extremamente louca.

Mal pregava os olhos durante a noite, temendo ser surpreendida por algo sobrenatural em meu quarto. A verdade era que eu não tinha mais noção do que era o real ou não. Minha rotina estava pautada no automático, já que a minha presença mal era notada devido o grande mal de paranóias que se apossava de mim à medida que a notícia se esvaia, caindo no esquecimento do povo.

A morte de Jacob não havia sido nada para as pessoas daquela cidade. Não era a primeira vez que algum jovem bêbado se suicidava ou se metia em alguma encrenca que custasse a sua vida. Nada na cidade importava... As pessoas pareciam presas em seu mundinho, vivendo conforme a 'maré' as levavam. Eu já havia parado de tentar entender o lugar o qual eu vivia.

No entanto, não entrava na minha cabeça os últimos acontecimentos. Só podia ser uma ilusão bem feita da minha própria...

ㅡ Marie?!ㅡ saio dos meus desvaneios assim que a voz de vovó os corta. ㅡ Querida, está tudo bem?

Pisco algumas vezes, recobrando a minha consciência, o que era um milagre nos últimos dias. A olho, notado um pequena ruga de preocupação em sua testa.

ㅡ Sim? ㅡ indico não ter escutado. ㅡ Falou alguma coisa?

Ela inclina levemente a cabeça e analisa minhas orelhas, fechando a cara ao perceber algo de errado.

ㅡ Pode pensar que com esses cabelos longos como um manto, vai esconder isso...ㅡ diz, baixo, me fazendo ficar tensa. Eu havia andado de gola alta na maior parte das vezes, evitando  a sua atenção sob a tatuagem. Não que minha vó se importasse, mas ela era supersticiosa, e como eu não sabia o que estava escrito mas sabia que podia vir, provavelmente, de um pacto ou promessa, acabava me restringindo.

ㅡ Hã?ㅡ me faço de desentendida, o que a faz repuxar o canto dos lábios.

ㅡ Perdeu seus brincos de proteção, Marie?

Congelo. Instintivamente, levo minhas mãos às orelhas, arregalando os olhos ao não senti-los ali.

ㅡ Eu...ㅡ me recordo do momento m que o sacrifiquei para fugir de Jacob, e isso me faz levantar da cadeira, mais assustada que o normal. Tudo cooperava para que fosse verdade o meu último sonho... ou pesadelo. ㅡ Eu não sei! Me desculpe, vó...ㅡ esfrego o rosto com a mão.

ㅡ Tudo bem, acontece.ㅡ me analisa. ㅡ Talvez seja por isso que você ande tão baixa astral. ㅡ solta um risinho.ㅡ Lhe arranjarei um anel ou um bracelete... Assim será melhor.

Suspiro e assinto com a cabeça.

ㅡ Obrigada, mama. ㅡ sorrio de lado e ela pisca um olho antes de indicar a panela sobre a mesa com a cabeça. ㅡ Agora se alimente, Você está mais pálida que alma penada.

Isso me arranca um sorriso. Me sento e sirvo a sopa ao prato que está diante de mim, me desligando um pouco do peso o qual eu carregava.

Mais tarde, quando já é madrugada e a rua não faz mais o mesmo barulho que antes, estou em meu quarto quase que completamente no escuro, se não fosse pelo brilho baixo da tela do meu celular clareando um pouco os móveis

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Mais tarde, quando já é madrugada e a rua não faz mais o mesmo barulho que antes, estou em meu quarto quase que completamente no escuro, se não fosse pelo brilho baixo da tela do meu celular clareando um pouco os móveis.

Não me sinto mais acolhida - como quando eu era pequena - dentro dessas quatro paredes que mais deveriam me proteger. Na verdade, me sinto exposta demais, pois estava sozinha, embora algo me cutucasse no fundo da mente, dizendo o contrário.

Apenas a minha respiração e o barulho do ventilador preenchem o silêncio da casa, mais especificamente, do meu quarto. A noite estava fria, e eu já estava enrolada dos pés à cabeça para esquentar um pouco o corpo. No entanto, o frio não fez com que eu deixasse de ligar o ventilador. O silêncio absoluto me incomodava. Odiava fingir estar dormindo, quando na verdade, minha mente estava atenta à qualquer sinal estranho.

Aperto os olhos, engolindo em seco. Meus dedos tocam o pelo macio de Toddy, enquanto Sam se aninhava e esquentava meus pés, o que me acalmava um pouco.

ㅡ Você já é adulta, Marie...ㅡ murmuro em um sopro.

Alice não estava comigo. Ela havia preferido dormir com vovó dessa vez, já que parecia estar se sentindo mal nos últimos dias. Estou presa em meus pensamentos quando, de repente, a porta é aberta. Rapidamente me sento na cama e ergo o celular com os dedos ágeis já ligando o flash.

ㅡ Calma, minha filha!ㅡ a risada falha de vovó preenche  quarto e também o alívio em meu coração.

Ponho a mão sobre o peito, sentindo meu coração retumbar fortemente.

ㅡ Minha nossa, vó! Quando achou uma boa ideia entrar no quarto de alguém na madrugada? 

Ela bufa em resposta e anda até mim, ligando a luz do abajur ao meu lado.

ㅡ Ora! Desligue isso. Já estou ficando cega!ㅡ resmunga, abaixando minha mão para tirar a luz de seu rosto.

Desligo o flash e levanto, andando até a porta, onde encontro o interruptor ao lado e o ligo.

ㅡ Sim? ㅡ digo, assim que recomponho meus sentidos. ㅡ Alguma coisa com Alice?

Ela nega com a cabeça, e dá dois tapinhas em meu colchão em uma mensagem silenciosa. Assinto, mesmo que confusa, e volto para a cama, dessa vez a encarando melhor.

ㅡ Aconteceu algo, vó? Está me preocupando...

Ela leva a mão ao bolso, onde puxa uma pulseira artesanal.

ㅡ Aqui, para você.

Pisco algumas vezes enquanto encaro o objeto delicado. O pego, erguendo a mão na altura do meu rosto para o enxergar melhor.

ㅡ Oh... Mais um protetor?

ㅡ Um amuleto.ㅡ corrige. ㅡ Vai afastar algumas energias pesadas e negativas. ㅡ olha ao redor, semicerrando os olhos.

Arqueio uma sobrancelha.

ㅡ Acha que estou tão mal assim?

Ela não ri.

ㅡ Não sei o que se passa na sua cabecinha, Marie... Mas coisa boa é que não é. ㅡ se levanta, me deixando sem palavras. ㅡ A conheço o suficiente para saber que tem algo sério a preocupando. Você está metódica... Longe da realidade.

ㅡ Não se preocupe vó, estou bem. ㅡ a asseguro, deixando que um sorriso saísse logo em seguida. 

ㅡ São os pesadelos?ㅡ franze a testa. ㅡ Eles voltaram?

Nego.

ㅡ Na verdade, fazia um bom tempo que eu não dormia direto.

Ela inclina a cabeça.

ㅡ Então...

ㅡ Alice me preocupa. Só isso. A morte de Jacob e o desaparecimento de seus amigos não está sendo fácil para ela. ㅡ solto a primeira coisa que me vem a mente, e vovó parece cair perfeitamente, pois sua expressão vai de analista para preocupada.

Ela baixa  a cabeça e suspira.

ㅡ É...ㅡ sua boca se torna uma linha fina antes de dizer: Você já deve saber que eu não ia com a cara dele... Mas não deixo de me assustar com a rapidez a qual sua vida se fora. ㅡ me olha. ㅡ Espero que tomem mais cuidado dessa vez. Bebidas demais, não dá certo. Temo por vocês duas, Marie.

Sorrio fraco e me inclino para segurara a sua mão e depositar um beijo em seu dorso.

ㅡ Eu sei, vó... Eu sei. Teremos mais cuidado, mesmo que eu duvide que as festas voltem à acontecer tão cedo para nós duas.  ㅡ ela sorri levemente, concordando,  e se levanta. ㅡ Boa noite.

ㅡ Boa noite, menina. ㅡ dá dois tapinhas e minha cabeça e sai, fechando a porta com cuidado e me deixando sozinha mais uma vez, mas dessa vez com seu amuleto caseiro em mãos.

Me And The Devil ( Em Andamento)Onde histórias criam vida. Descubra agora