O Amor Mora na Casa ao Lado

antes - amanda

Amanda Arends

O balanço chega ao nível máximo. Fecho os olhos, me deliciando com a sensação do vento em meu rosto. Quando chego no chão, arrasto o pé pela grama.

Estou na minha chácara, no balanço que eu sempre vinha quando precisava pensar em algo. Hoje eu vim até ele para pensar sobre meu futuro.

Em um mês, estarei me mudando para cidade grande - após morar a vida toda no interior. Estou indo para realizar o meu maior sonho, ser atriz e espalhar minha arte pelos palcos e televisões do mundo.

-Mands, você está aí? - Ouço a voz que eu tanto amo escutar. Ele aparece em meio às árvores, sorrindo de forma deslumbrante. O balanço range quando desço para abraçá-lo, devido a tantos anos de uso.

Corro em sua direção e entrelaço os braços em seu pescoço, sentindo seu cheiro amadeirado como se fosse a última vez. E dói em pensar que logo seria.

-Eu te amo tanto, Heitor. - declaro.

-Sabe que eu também. - ele sorri novamente.

Ele encosta seus lábios nos meus rapidamente, com medo de sermos vistos. Meu pai desaprova totalmente a nossa relação, e só tem se tornado mais difícil após eu declarar que iria para São Paulo.

Meu namorado trabalha para o meu pai há anos, nosso romance se iniciou assim que eu avistei ele pela primeira vez. Tínhamos apenas 10 anos, e ele foi meu primeiro e único amor.

-Já te disse que odeio seu pai? - Ele debocha, me apertando ainda mais.

-Eu já sei. Mas agora que vamos nos afastar por um tempo, quando voltarmos a nos ver, ele já vai estar mais maleável em relação a isso - trocamos outro beijo. - Se morássemos juntos lá, obviamente seria mais fácil. Mas eu te entendo, por mais que seja meu sonho você não precisa...

-Você fala como se só eu tivesse que abrir mão das coisas, Amanda- Ele continua a me beijar -Você ainda não decidiu se realmente vai ir, né? Poderíamos casar aqui no seu sítio e viver juntos para sempre, ter uns 4 filhos e todo o resto.

Me afasto dele imediatamente, irritada. Heitor sabe muito bem o quanto essa viagem é um sonho realizado, uma oportunidade que eu aguardei durante anos e anos. O início da minha carreira como atriz.

-Eu já decidi, sim. - declaro, e vejo seu humor mudar de repente. - Caramba, eu te amo muito. Mas eu não vou deixar de seguir meu sonho, querido. Vamos voltar a se ver de novo, eu sei disso.

Vou abraçá-lo novamente em uma tentativa de acalmá-lo, mas ele permanece totalmente estático enquanto o envolvo em meus braços.

-Não- negou, balançando a cabeça repetidas vezes.

-Não o que, Heitor? - fico confusa. Ele me afasta abruptamente e quase caio no chão com a força de seu braço. Fico em estado de choque.

-Você vai deixar sua família, me deixar? Apenas para sair por aí beijando outros homens! - ele esbraveja, meu humor mudando como o seu.

Como ele poderia me acusar de estar indo embora por querer beijar outros homens? Ele me conhece, me ama e sabe que eu o amo tanto quanto.

-Heitor, você tem que entender que eu não quero ter filhos tão cedo. Eu não quero ser apenas sua esposa troféu e cuidar dos nossos filhos enquanto você trabalha. Tenho os meus sonhos também, assim como você! - grito tão alto quanto ele, nem pensando na possibilidade de alguém aparecer. - E caralho, você me conhece e sabe que eu te amo e nunca beijaria outro.

-Você me ama mesmo, Amanda?

-Claro que sim.

-Então chegou a hora de você escolher. - ele abaixa o tom de voz, se aproximando novamente. - Eu ou São Paulo?

-Meu Deus, não é possível que você esteja fazendo isso. - minha visão começa a nublar enquanto as lágrimas se formam. - Eu simplesmente não preciso escolher, quero ter você e minha carreira.

-Não tem essa. Responda a pergunta. Nós ou seu sonho idiota?

-Não vai existir nós se você continuar agindo assim! - Ele arregala os olhos, em choque com a minha resposta repentina.

-Quero uma resposta. - Ele respira fundo, me encarando. - Você quer a vida que a gente sempre sonhou, vários filhos, vida simples e feliz...

-Pare de falar como se isso fosse um sonho meu! - esbravejo, perdendo a paciência. - Você está dizendo o seu sonho, não o meu. Esses planos sempre foram apenas seus.

-Se você escolher São Paulo, não vai me ter nunca mais. - ameaça. - Imagino que agora saiba sua escolha, diga em voz alta.

É como se o amor tivesse sido substituído por outro sentimento, muito diferente. Onde estava o homem que eu me apaixonei? Aquele que me tratava carinhosamente, que declarava seu amor todos os dias? Ele estava sendo extremamente egoísta, o oposto da pessoa gentil que eu conhecia.

-Você tem razão, Heitor. - as lágrimas escorrem descontroladas, mas apesar da visão turva, vejo seu sorriso malicioso se formar. Ele abre os braços e vem em minha direção, aguardando que eu o escolhesse. - Não quero te ter nunca mais. Escolho minha carreira, meu sonho, e espero encontrar alguém que não me faça escolher.

Eu esperava tudo, que ele fosse me abraçar, me entender, ou apenas ir embora, mas eu nunca esperei ouvir o que ouvi.

-Puta. É isso que você é, Amanda. Fui idiota de acreditar que você poderia ser a mulher da minha vida algum dia.

Nem pensei antes de depositar um soco no meio do seu nariz, o fazendo soltar um urro. Se ele realmente pensou que eu seria trouxa ao ponto de aceitar aquilo, queria que soubesse o engano que cometeu. Eu não aceitaria aquilo nunca. Não aceitaria receber menos do que mereço.

Ele saiu andando em direção ao amontoado de árvores, sua mão segurando o nariz que jorrava sangue. Senti vontade de gritar, chorar, sumir, explodir, tudo que me fizesse esquecer que uma das pessoas que eu mais acreditava amar acabou de me chamar de puta. Apenas porque eu escolhi realizar meu sonho ao invés do dele.

Naquele momento, eu decidi algo que sabia precisar fazer. Deixaria tudo para trás, o que mais importava no momento era minha carreira. Meu sonho seria a única coisa que eu amaria e me dedicaria a partir daquele dia. O difícil era enfiar essa ideia na minha cabeça relutante.