7| A ponte e o estranho

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Exatamente cinco dias.

 Cinco dias que eu estava nesse inferno.

Eu não aguentava mais. Meu corpo estava exausto, minha mente cansada e minha cabeça doendo. Meus olhos não conseguiam mais se manter abertos durante tarefas cotidianas... Parecia que cada vez mais eu estava sendo puxada para o fundo do poço, se é que eu já não estava no mesmo.

No entanto, hoje havia sido diferente. Pela manhã, quando notei que já não daria tempo de tentar me fazer dormir, chorei o quanto pude, surtei, e berrei para os ventos que não aguentava mais. Vovó talvez devesse ficar preocupada com a minha saúde mental. Durante o caminho para o trabalho, me mantive pensando em como seria me jogar da ponte e acabar com o vazio que se mantia dentro de mim.

E era isso que eu estava fazendo agora. Encarando a ponte que provavelmente os corpos de Jacob e seus amigos teriam sido achados. Mas nada se passava mais na minha cabeça, a não ser o som do mar batendo contra as pedras lá em baixo.

Era como se por alguns segundos, a paz tivesse reinado em minha mente.

Toco a borda do limite da ponte, me inclinando para observar melhor as águas lá em baixo. Estava atrativa. O som das ondas e a brisa que batia contra o meu rosto, pareciam cantar para mim. Continuei observando, e me entretendo com o som. Fecho meus olhos, respirando fundo e exalando meus pesares.

Estava tudo tranquilo, até eu sentir a sensação de estar sendo puxada para longe, me assuntando. E então, vejo olhos escuros como a noite me encarando.

Eram lindos, moldados pelos extensos cílios escuros, e um leve puxar nos cantos, os deixando em um formando belíssimo... No entanto, estavam sérios e frios, até frios demais, o que me fez arrepiar.

ㅡ O que pensa que está fazendo? ㅡ sua voz ecoa por meus ouvidos, ativando um certa lembrança de que eu já havia a escutado, mas nada me veio à mente.

Parecia que eu tinha perdido a capacidade de raciocinar.

Me afasto bruscamente ao perceber que era um estranho ali, me segurando pela cintura firmemente. O encaro por alguns segundos, agora observando melhor a sua feição. Era um homem, mais parecido com um anjo de tão lindo. Traços fortes, mas ao mesmo tempo delicados, parecidos terem sido feitos à mão.

Meus olhos pulam para as tatuagens em seu pescoço, e depois observo os braços cobertos pelas mangas pretas do casaco, me pegando tentando adivinhar se tinha algumas mais por ali.

ㅡ Eu só estava observando a água. ㅡ digo, e logo o encaro ao perceber que não lhe devia informações, mesmo assim fico quieta.

Eu não havia percebido seus passos, o que devia indicar o quão distraída eu estava.

Ele ergue uma sobrancelha, e continua me encarando, sem desviar nem por um segundo.

ㅡ Estava quase subindo no muro, garota. 

Pisco algumas vezes, me dando conta.

ㅡ Ah! E-eu não ia fazer o que você está pensando...ㅡ sorrio sem graça. ㅡ   Mas obrigada, do mesmo jeito.

ㅡ Você ia pular. ㅡ diz, com certeza, o que me faz franzir o cenho.

ㅡ Eu não ia. ㅡ digo, confusa por ele insistir no assunto. ㅡ Tá tudo bem, moço. Eu só estava dispersa...

O homem me analisa por um breve momento, antes de pôr as mãos no bolso do casado e dizer:

ㅡ Tome cuidado da próxima vez, você ia acabar caindo do mesmo jeito se continuasse se inclinando.

Engulo em seco, e assinto, permanecendo em silêncio.

ㅡ Qual é o seu nome? ㅡ pergunta, parecendo menos tenso.

Pisco algumas vezes, cogitando se falava a verdade ou não.

ㅡ Ah... Marie. ㅡ respondo, mesmo não estando a fim de conversa. Aliás, ele havia sido gentil. ㅡ E o seu? ㅡ pergunto por educação.

ㅡ Ian. ㅡ relaxa o olhar, e sinto uma pontada em minha nuca. ㅡ Clarke...ㅡ um leve arrepio...ㅡ Schultz.

Levo minha mão ao lugar dolorido na nuca, e é quando seus olhos pulam para a minha pulseira. 

ㅡ O que é isso? ㅡ franze o cenho.

Esfrego o indicador na tatuagem, sentindo um leve choque agora. Ian me encara rapidamente, o que me faz tirar a mão dali e olhar a pulseira artesanal de minha avó.

ㅡ Um amuleto de proteção. Minha avó é supersticiosa. ㅡ sorrio levemente.

ㅡ Sua avó...? ㅡ repete, mas não parece uma pergunta.

Mesmo assim, assinto e desvio meu olhar para ele, que ainda me encarava. Mas seus olhos estavam mais sombrios agora, me assustando um pouco.

 ㅡ Ah... Acho que tenho que ir.ㅡ  ponho as mãos no bolso do casaco também.ㅡ  Valeu, aí... Ian. ㅡ ele não responde, então sorrio fraco e me viro para ir embora.

Embora eu ainda sentisse o seu olhar fervente nas minhas costas, continuei caminhando, sentindo a tatuagem parar de latejar conforme eu me afastava.


Me And The Devil ( Em Andamento)Onde histórias criam vida. Descubra agora