Catarse

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Aviso

Esse capítulo possui gatilhos de violência. Mortes, ferimentos, dor intensa, e relacionados. As descrições não estão exacerbadas, mas podem causar desconforto em pessoas mais sensíveis ao tema. Tentei dosar da melhor maneira: procurando não causar incômodo excessivo ao público, nem castrando detalhes importantes para a imersão da história.

No mais, fica dado o aviso.


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As árvores passavam a seu lado, rápidas, como borrões compostos por verde e marrom. Seus olhos doíam, e não havia mais nenhuma lágrima para ser chorada. Acabaram todas. Seu braço ferido pulsava, irradiando a sensação para seu tronco, mas a dor foi diminuindo conforme suas pálpebras pesaram.

Não foi um desmaio, e nem um cair no sono, e sim uma desistência. Catherine desistiu. Fechou os olhos, relaxou os músculos e desligou temporariamente sua consciência. Não conseguia lutar, brigar, nem ao menos sentir mais um pouco de raiva.

O vento frio batia nas folhas e o farfalhar era uma singular cacofonia – mas ela nada mais ouvia, à essa altura. Apenas sentia seus pulmões gelarem, pelo ar de baixa temperatura que adentrava irregularmente suas vias respiratórias.

Apagou e assim ficou. Carregada.


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Algumas horas antes...

Dizer que ela estava nervosa seria mentira.

Catherine estava possuída pela mais pura, concentrada e cristalina ansiedade que já tivera em vida. Dezenove anos de uma longa, inquieta e particularmente esquisita vida.

Roera todas as suas unhas e, quando elas acabaram, roeu suavemente a pele em volta. Quando não pôde mais fazer isso, passou a estalar o pescoço. Tinha de descontar em alguma coisa, afinal.

Acordou de madrugada e fez as duas mochilas, conforme o plano. Toalhas, roupas e comida roubadas, além das munições também surrupiadas. Ainda conseguiu passar a mão em uma pequena caixinha de primeiros socorros quando Charlotte cortara o dedo na cozinha: agora tinham antisséptico, ainda que em um pequeno fraco apenas, e um rolo de gaze. Pouco, mas melhor que nada.

Catherine se surpreendeu com o quão boa ficou em roubar coisas sob pressão. Se o mundo não tivesse acabado, ela teria sido uma excelente batedora de carteiras em Amoris, caso o plano de fazer faculdade não desse certo. Oportunidade perdida, concluiu rindo.

Enfim, o sonífero: essencial para derrubar o guarda e resgatar Nina. Ela conseguira um vidrinho, mas estava vencido e pela metade. Se ele não funcionasse conforme o esperado, teriam problemas sérios e a situação escalaria muito rápido. Mas era uma situação de recursos escassos: era o único, e ela checara mil vezes, vidrinho restante. Tudo ou nada.

E o trio resolveu ir no tudo.

Nathaniel passou em seu quarto, como de costume, de madrugada. Cumprimentos, beijos e um considerável desejo de levar as coisas para a cama novamente – mas não era um dia costumeiro então o último item não foi feito. Ela o entregou as mochilas e ele a esconderia no local combinado, na área de carga. Agora caberia a ela cuidar de Nina – na verdade, de derrubar o fardado que a vigiava.

- Não esqueça: se alguma coisa der errado, você pega a Nina e corre para longe daqui. O mais rápido que der. Eu me viro.

A reação dele foi imediata. Acenou a cabeça como se concordasse, mas era pura mentira. Não a deixaria para trás.

7 dias - Nathaniel Carello, Amor DoceOnde histórias criam vida. Descubra agora