Gravando...

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Só tem uma coisa que vou dizer a meu favor e juro que nada mais sairá da minha boca para defender os meus atos.

Estou apaixonada. Dessas paixões que nos pega de surpresa e duram para sempre. Sei que isso não justifica o que eu fiz, mas talvez explique um pouco.

Meu nome é Camila D'Angelo, tenho 17 anos, um cachorro chamado Segunda (para me lembrar que as segundas-feiras têm algo de bom) e pais completamente fora do normal (eu NUNCA fiquei de castigo. NUNCA. JAMAIS). Meus pais são do tipo excentricamente compreensivos. Do tipo que leem livros sobre como educar seus filhos desde que eu estava na barriga e do tipo que acreditam que não existe nada melhor que um bom diálogo para resolver qualquer problema.

Não importa o que eu faça, nunca saímos dessa dinâmica. Não que eu seja do tipo que coloca fogo em um parque de diversões e sai correndo. Mas já fugi da escola uma vez e o que recebi em troca? Biscoitos recheados e um tempo para pensar espontaneamente sobre os meus atos.

Vocês devem estar pensando no por que de eu estar contando isso.

É que essa tarde, justo depois que a coisa toda ficou fora de controle, recebi uma ligação dos meus pais (sim, os dois juntos histéricos no viva-voz.) E agora, enquanto me arrastava para casa sentindo que provavelmente meu coração pararia de bater a qualquer momento, tinha recebido a notificação mais louca que tinha escutado na vida vinda dos meus progenitores: Estava de castigo. E talvez até que cumprisse 30 anos.

Ah. Outro fato importante sobre mim.

Tenho um pouco mais de 700 mil inscritos no meu canal do Youtube e para uma adolescente que nunca havia saído da sua cidadezinha de interior, isso era algo... Era mais que algo.

E isso tem muito a ver com tudo. Principalmente comigo e com o meu desespero. Não me mal interpretem. Esse canal é uma parte significativa da minha vida. Mas é também o que a está puxando ladeira abaixo nesse momento.

Tudo começou há dois anos quando decidi que ter meus pais e amigas como plateia era estupendo, mas que eu precisava de algo mais. Canto desde que tenho conhecimento, meu coração bate em compassos e notas musicais e mesmo quando não digo nada, existe uma canção ecoando na minha cabeça cada milissegundo da minha vida.

Acho que as pessoas gostaram disso. Eu não esperava toda essa reação, mas estou feliz com isso. Agora pessoas que eu nunca vi me escrevem, recebo propostas de casamento e convites para festas em lugares que eu nunca estive antes. E todos na cidade acham que eu deveria cantar em cada um dos festivais que realizamos em praticamente todas as estações do ano. Até saí em um programa de TV no ano passado! Não é incrível?!

Incrível Camila... você é totalmente...

IDIOTA!

— Cam? — A voz de Deby me despertou. Eu vinha sustentando o celular no ouvido sem dizer uma palavra sequer desde que nos separamos no portão da escola e ela me ligou no segundo seguinte. — Você já desmaiou? Devo me preocupar?

— Estou aqui... — Senti que cada passo meu pesava uma tonelada. Era como ser arrastada lentamente em direção a um beco sem saída.

— Você tem que reagir! Deveria explicar para eles! Tenho certeza que irão entender...

— Deby não é com os meus pais que estou preocupada. Eu mereço totalmente ser enterrada no calabouço até meus sessenta anos.

Escutei o suspiro pesado da minha melhor amiga do outro lado da linha. Sabia que ela estava tentando maquinar algo.

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