POV REBECCA
Eu dirigia para o trabalho depois de mais uma noite mal dormida, aguardando o próximo contato de Samanun, se é que esse contato viria. Sonhava dormindo e acordada com isso, com outro contato, com a possibilidade de vê-la. Faziam dois dias que ela havia me mandado uma mensagem da mesma forma que costumava dois anos atrás, de um celular descartável e de um número impossível de rastrear, e desde então, eu passava o tempo todo tocando a tela do celular para verificar as notificações. A única coisa que eu sabia é que ela tinha conhecimento sobre o fato de eu ter tido acesso às suas fotografias, encontradas em meio aos documentos apreendidos no dia em que Roman foi preso, mas como?
Buscava respostas enquanto me afundava aos documentos apreendidos. Haviam muitas informações, porém tudo que analisava me levava a lugar algum. A organização do crime sempre me impressionava, nesse caso específico, as articulações pareciam complexas, e muitas das informações encontradas pareciam plantadas ali, para nos fazer andar em círculos. Criminosos profissionais pensavam em absolutamente tudo, não costumavam deixar rastros, o que me fazia questionar sobre quão fácil estava o acesso às fotos de Samanum no aeroporto.
Havia também o depoimento de Roman, que depois de preso, passou a se limitar a respostas curtas e algumas pistas sem sentido. Nós já não esperávamos muito dele, afinal gente envolvida em crime organizado neste nível não costuma entregar ninguém, pois qualquer deslize acaba por colocar em risco a própria vida e de sua família.
Absorta em meio ao quebra-cabeças do caso Roman, recebo a informação de que Kade, uma colega que havia se formado investigadora junto a mim e atuava no distrito vizinho, estava à caminho da delegacia. Ela havia solicitado uma reunião de urgência e pedia minha presença, para troca de informações sobre um caso que havia recebido. Não demorou muito para que eu observasse a mulher passando pela porta de vidro e sendo encaminhada para a sala de reuniões. A segui imediatamente.
- Kade?! - Adentrei a sala. August e Nop já se encontravam no local, e a cumprimentavam.
- Rebecca! Quanto tempo! - Ela abriu os braços me puxando para um abraço apertado demais, demonstrando sua sociabilidade e simpatia exageradas. - Você não vai acreditar no que tenho aqui!
Dando início à reunião de forma direta, Kade passou quinze minutos falando sobre a denuncia que recebera. Em resumo, uma empresária extravagante da região havia sido enganada e roubada. O desvio havia sido milionário, e segundo a vítima, a suspeita do crime era mulher, alta, magra, tinha cabelos pretos e ascendência asiática. Por um momento, já ligando os pontos, senti que meu coração batia tão forte que era possível observar minha camisa se movimentando no ritmo dos meus batimentos. Kade abriu sua bolsa, retirando dela uma pasta preta. Procurava por algo específico para nos mostrar.
- Yolanda Terence, ao vir a nós para fazer a denúncia, já trouxe consigo um retrato falado, acreditam? - Kade estendeu o desenho sobre a mesa. Minhas palpitações aumentaram. Sem sombra de dúvidas era ela, Samanun.
- Samanun Anutrakul. - disse Roman - ela está de volta e não está para brincadeira.
- Exatamente! - Kade voltou os olhos para mim - E eu sei que o caso foi deixado em "stand by" depois de tanto tempo do desaparecimento dela, mas como Rebecca é a maior conhecedora do assunto, achei importante trazer as informações até vocês, para que façamos uma colaboração entre distritos. - O que você me diz, Rebecca?
Kade estranhou meu silêncio. No fundo, eu pensava se deveria expor naquele momento sobre a mensagem de Samanun, sobre sua provocação, sobre sua foto. Mas anos antes, essa exposição havia comprometido minhas chances de prendê-la. Mesmo tendo conhecimento de que estava errada, opto por não falar nada. Estava estranhamente e irresponsavelmente disposta a colocar em risco minha integridade profissional pela paz de espírito que imaginava ter quando a encontrasse e a prendesse.
- Me perdoe, Kade, confesso que estou surpresa com suas informações... com este retorno inusitado. Podemos trocar colaborações, sem problemas, se estiver tudo certo para August. - Meu chefe assentiu, mas também percebi que Nop me observava um tanto confuso, pois ele sabia que o retorno de Samanun não era novidade para nenhum de nós.
As informações sobre o que sabíamos do retorno de Samanun foram muito bem filtradas antes de serem passadas à Kade. August tinha receio de comprometer qualquer avanço no caso Roman, que vinha tendo muita repercussão na imprensa após a localização e libertação de muitas vítimas mulheres. Já Kade, nos passou mais detalhes sobre como Samanun havia desviado tanto dinheiro da empresária Yolanda Terence.
Segundo a vítima, a criminosa se identificava como Freen Sarocha Chankimha, uma possível investidora para seus negócios no ramo alimentício, o nome, obviamente falso. Elas haviam se reunido em sua casa, e a mulher havia feito de tudo para seduzir Yolanda.
- Ela "forçou a barra", foi inconveniente até conseguir o que quis! - contou Kade. Minha expressão se fechando com a informação.
- Então elas se relacionaram? Típico de Sam. - August perguntou, balançando a cabeça. Kade completou:
- Não exatamente. A vítima conta que a mulher forçou um beijo entre elas, usando o momento também para pegar seu celular e conectar um dispositivo que liberava acesso à suas contas de outro dispositivo. - Kade evidenciava que a própria empresária já levava consigo laudos de profissionais que analisaram seu celular. Tinha parte da investigação já a sua disposição por conta própria, coisa possível de se fazer quando se tem muito dinheiro. Eu tinha a impressão de que havia algo errado com essa mulher. - Depois disso foi fácil, ela transferiu quase toda a grana de Yolanda para contas diferentes, que triangularam o dinheiro até que fosse impossível de encontrar...
Ao término da reunião, eu já tinha certeza de uma coisa: para encontrar Samanun, eu precisava de mais. Precisava ter acesso à Yolanda Terence. Estranhamente, me incomodava saber que essa mulher estivera tão perto dela. Eu não tinha e não conseguiria permissão para investigar Yolanda, esse caso era de Kade, de outro distrito. A não ser que fizesse isso daquele "jeito" que infelizmente estava virando rotina: às escondidas.
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Tão perto
FanfictionCompletaram-se dois anos desde que a investigadora criminal Rebecca Armstrong teve notícias sobre a peça principal do seu mais significativo e complexo caso: Samanum Anuntrakul. Sob o pseudônimo de "Sam", essa mulher havia cometido inúmeros crimes d...