Capítulo 10 - Nanon

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Pego a minha cerveja e me viro para o palco para ver ele tocar. Ele fica impressionante tocando bateria, a forma como se entrega, os movimentos rápidos e precisos das suas mãos, o seu corpo se movendo em um ritmo frenético e o suor que cobre toda a sua pele. Ele fica sério, sorri, fecha os olhos e quase parece estar excitado, a calma que vai progredindo até chegar a brutalidade e por fim o êxtase quando dá a última batida.
Ele olha para mim e sorri, então bate as baquetas quatro vezes e a próxima música começa, quando olha para frente novamente eu viro para pedir outra cerveja.
- Tem alguém sentado aqui?
Eu olho e uma mulher senta ao meu lado, ela sorri para mim de forma sedutora, mas eu ignoro, a última coisa que eu preciso agora é de uma bruxa.
- Então você é o anjo que chora.
Não foi uma pergunta. Tento não reagir ao que ela falou e continuo bebendo a minha cerveja. Ela faz um sinal para o barman e se vira.
- Aquele deve ser o seu Nefilim, estou certa?
Tento não reagir a isso também, mas sinto um puxão na sua direção, olho para trás e vejo a criatura se aproximando dele, é incorpóreo, mas é possível ver o ar que ondula em torno dele, é um cão do inferno. Quando está subindo no palco eu me viro para o bar novamente.
- Encoste nele e você morre.
- Então, você é o anjo que chora?
Eu penso no que fazer, mas não quero arriscar a segurança dele.
- É o que dizem.
Ela ri e paro de sentir o puxão, ele não está em perigo por enquanto.
- Isso é impressionante, para o último anjo chorar tivemos que criar uma guerra e um genocídio, o que te fez chorar?
Eu olho para ela e não acredito no que eu acabei de ouvir.
- Qual guerra?
- A segunda guerra, a sequência de eventos que tivemos que criar, bombas, batalhas, o holocausto... Foi necessário tudo isso para termos uma única lágrima.
- O que aconteceu com o anjo?
- Ele desistiu de lutar e se corrompeu. Agora me conta, o que te fez chorar? Foram as guerras do oriente, os desastres naturais, a situação na África?
- O que você quer aqui?
Ela suspira dramaticamente a olha para o palco.
- A cabeça do seu Nefilim... quer dizer, o coração dele foi colocado a prêmio, fiquei curiosa, queria saber se a história era verdade e se vale a pena tentar ganhar o prêmio.
- E você vai arriscar?
Ela me olha e sorri mais uma vez.
- Não, mas eu posso te ajudar.
- Eu não preciso de ajuda.
- Mas talvez o seu Nefilim precise, eu posso selar a proteção da lágrima.
Mais uma vez eu tento não reagir, mas ela talvez tenha as respostas que eu preciso, analiso as minhas opções, mas uma bruxa vai ser sempre uma bruxa, não dá para confiar em demônios, mesmo os mestiços.
- Como eu disse, eu não preciso de ajuda.
Mais uma vez eu sinto que ele está em perigo.
- Eu arranco o seu coração antes mesmo do seu cão chegar perto dele.
Ela me olha assustada.
- Como você...
Ela não sabe como perguntar e eu também não saberia responder, sinto o puxão aliviando até não existir mais, acho que o cão foi embora.
- Não é só a lágrima, não é? Tem mais alguma coisa.
- Não sei do que você está falando, mas está na hora de você ir embora e não se preocupe, a sua bebida é por minha conta.
Ela fica me encarando por um tempo então se levanta, eu a ignoro e me viro para olhar para o palco novamente.
Quando o show acaba ele vem direto até mim e me beija.
- Quem era aquela gostosa conversando com você?
Não gosto de como ele de referiu a ela.
- Aquela era uma bruxa.
Ele olha para a porta como se esperasse que ela fosse entrar a qualquer momento.
- Porque ela estava aqui?
Eu olho para ele e tento decidir se conto ou não sobre o que ela falou, mas é melhor que ele fique atento.
- Segundo ela existe um prêmio pelo seu coração, ela veio ver se valia a pena tentar.
- O que aconteceu?
- Ela desistiu.
- Isso é bom?
- Foi bom ela ter vindo, porque não vamos ser pegos de surpresa agora que sabemos disso, a partir de agora eu vou para onde você for, você não vai ficar sozinho até termos certeza de que é seguro.
- Por causa das bruxas?
- Não apenas por elas, tem os mestiços machos, anjos caídos, demônios, nefalens, talvez os próprios anjos.
- Vai com calma, mestiços machos? Nefalens?
Eu olho em volta e me levanto.
- Você está pronto?  Eu te explico no caminho de casa.
- Claro, vamos.
Chegamos no carro, ele abre a porta e pergunta.
- Para sua casa ou para a minha?
- Se importa em ficar no meu apartamento? Ele é mais seguro, digamos que é mais difícil de um cão do inferno escalar mais de 70 andares.
- Cão do inferno?
Ele me olha assustado.
- Entra que eu te explico.
Ele entra e eu olho para o lado, onde um cão do inferno está parado, quando ele fecha a porta eu entro. Enquanto ele vai dirigindo eu observo para ver se o cão nos segue.
- Fale sobre os mestiços.
Eu olho para trás mais uma vez, então me concentro nele.
- Bruxas são mestiças como você, como eu já tinha explicado, os machos não são feiticeiros, são jinns.
- Jinns?
- Eles são conhecidos também como gênios.
- Tipo o gênio da lâmpada? Eles concedem desejos?
- Eles são metade demônios, então eles conseguem fazer pactos e conceder desejos como os demônios.
- Nossa! Nossa! ... E os nefalins?
- Esses são filhos de anjos e demônios. Possuem a luz de um anjo, mas tem a natureza traiçoeira de um demônio.
- E você acha que eles vão vir atrás de mim?
- Provavelmente, é praticamente impossível encontrar um nefilim hoje em dia, então o seu coração realmente é muito valioso.
Ele para o carro e vira para mim.
- E se eu for embora? Eu posso voltar para a vila dos nefilins, me afastar de você, assim você fica seguro.
É visível nos seus olhos como dói para ele dizer essas palavras, assim como me dói ouvir que ele acha que é uma alternativa me deixar.
- Se for necessário você vai, mas eu daria a minha vida antes de que essa seja uma opção. Eu vou te proteger, eu prometo.
Ele se aproxima e me beija, tento me controlar para não me perder nesse beijo, me afasto, clareio a minha mente e digo.
- Vamos embora, não é seguro aqui.

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