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Josh

Josh encarou o brilho da tela.

Eu pareço uma assassina para você?

Essas palavras dispararam uma enxurrada de ideias em sua mente, mas nenhuma viajou da cabeça para os dedos. Ainda havia muitas perguntas sem resposta.

Era como ver um novelo de lã todo emaranhado. Os fios estavam ali, mas, até o momento, Josh não havia sido capaz de desembaraçá-los e tecê-los de modo que seus leitores devorassem uma página atrás da outra.

Mas tinha algo. Sabia que tinha algo.

Josh levantou-se e caminhou até a janela do escritório.

Era esse o seu superpoder: a habilidade de examinar em profundidade a mente das pessoas comuns e expor e explorar seus medos mais íntimos. Se não fosse escritor, Josh seria investigador do FBI. Ele tinha contatos, criara algumas relações próximas ao longo dos anos. Se pensasse nisso por muito tempo, seria perturbado pelos caminhos que sua mente tomava. E, no momento, ela não estava indo a lugar algum.

Seu agente ligaria de novo em breve. E seu editor também. Em breve pediriam mais do que apenas uns capítulos. Pediriam a porcaria do livro inteiro.

Josh estava ficando sem tempo. Deveria entregar o livro na véspera de Natal. Tinha menos de um mês. Nunca escreveu um livro tão rápido. Estava chegando a hora de revelar a verdade aos dois. Teria que contar que o livro não estava terminado. Que não havia nem começado. Que não tinha sequer uma palavra escrita.

Um aroma percorreu o apartamento e Josh voltou o rosto para a porta na tentativa de localizá-lo.

Canela.

O momento em que identificou o cheiro coincidiu com uma suave batida na porta. Ele a abriu e viu Any de pé, com uma bandeja em mãos.

- Pensei que você pudesse estar com fome. Vou fazer o jantar mais tarde, mas por ora assei uma leva de meus famosos biscoitos natalinos de especiarias. Eu ia congelar para você, mas como está aqui, pensei que pudesse comê-los agora.

Josh olhou para a travessa. Os biscoitos eram em forma de árvore de Natal com açúcar polvilhado sobre a superfície marrom.

- Biscoitos não costumam ser redondos?

- Eles podem ser do formato que você quiser.

- E você escolheu fazer árvores de Natal.

- São só biscoitos, sr. Beauchamp. Coma-os se tiver vontade.

Ele examinou a bandeja nas mãos de Any. Junto à travessa de biscoitos havia uma caneca cheia de...

- Que diabo é isso? - Uma fatia de limão boiava sobre o líquido amarelado.

- É um chá de ervas.

- Ervas...? - Josh balançou a cabeça. - Com certeza você não achou isso nos armários da minha cozinha.

- Não achei nada nos seus armários.

- Eu bebo café. Forte. Puro.

- Você não pode beber café forte e puro à tarde. Vai perder o sono. Chá de ervas é refrescante e calmante.

Josh raramente conseguia dormir, mas não ia contar isso a ela. Já tinha visto tanto de sua vida pessoal sendo exposta na mídia ao longo da última década, que se tornara mesquinho com os detalhes que compartilhava.
Chá de ervas. Como se isso fosse resolver seus problemas.

- Pode levar. - Se fosse um whisky puro, ele teria sorvido de um gole, mas não ia beber chá de ervas por nada. - Pareço o tipo de cara que bebe chá de ervas com biscoitos em formato de árvore de Natal? - O tom de Josh veio infundido em uma aspereza mil vezes menos palatável que o chá em sua frente, e Any o examinou por um longo momento.

- Não, mas não dá para dizer muito de uma pessoa só pela impressão, não é mesmo? Foi você quem me ensinou. Te ocorreu que eu talvez não queira agradar, mas envenenar você, sr. Beauchamp? - Ela empurrou a bandeja para as mãos dele e se afastou, dispensando-o com um abanar de suas mechas cacheadas.

Josh encarou-a fixamente, vacilando pelo contraste entre o rosto doce e a censura cortante.

Envenená-lo?

Era isso.

Finalmente estava pronto para digitar algo e tinha as mãos ocupadas. Josh entrou com a bandeja no escritório e colocou-a sobre a mesa.

Já era escuro e a única luz no recinto vinha do brilho de seu computador e da luz estranha e luminescente que refletia na neve janela afora.
Voltou para a tela. Até o momento, havia apenas duas palavras sobre a página.

Capítulo Um.

Ele se sentou e começou a escrever.

Milagre Na 5° Avenida - Beauany Onde histórias criam vida. Descubra agora