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Any

Você é o que você come, por isso escolha um doce.
— Any

RUDE, TEMPERAMENTAL, IRRITÁVEL...

Triste e machucada, Any entrou pisando forte na cozinha. Ela tinha sido criada para entender o que estava por trás do comportamento de alguém. Não precisava ser psicóloga para compreender o que Josh tinha, mas ainda assim as palavras dele machucavam.

Ela repetiu a si mesma que Josh estava de luto. Que estava sofrendo. Que era...

Frio. Distante. Intimidador. Formidável.

E obviamente não era muito fã de chá de ervas.

A breve espiada no escritório mostrou-a que o quarto não era nada parecido com o resto do apartamento. Ele cheirava a lenha queimada e couro, tinha personalidade e calor. Calor que emanava de outros lugares além da lareira. Diferente do resto do apartamento, o escritório tinha sido mobiliado com carinho e atenção.

Dois amplos sofás gastos de couro encaravam-se nos extremos de uma mesinha de centro repleta de livros. Não eram livros decorativos, mas de verdade, com os cantos gastos, empilhados aleatoriamente como se tivessem sido lidos há pouco tempo.

Any se lembrou da escrivaninha dominada pelo que parecia ser um computador bem caro e também por um laptop. O cômodo foi presenteado com as mesmas janelas altíssimas que envolviam o resto do apartamento, mas a imagem que mais marcou foram as estantes de livros.

Elas iam do chão ao teto e tinham mais livros do que Any vira em qualquer lugar que não fosse uma biblioteca. As capas não combinavam e volumes encadernados com couro intercalavam-se com edições de bolso menos resistentes. As marcas nas lombadas sugeriam que os livros haviam sido lidos várias vezes e com amor.

Any estava curiosa para descobrir o que Josh lia quando queria fugir de seu próprio trabalho, de seu próprio mundo. Será que lia suspenses ou algo diferente?

Ela não pôde ver mais de perto. Com apenas um olhar e poucas palavras cuidadosamente escolhidas, ele deixou bem claro que Any estava invadindo seu espaço.

Não a queria ali. Ela não era bem-vinda.

Mas antes que fosse embora, Any descobriu outra coisa. Talvez a mais importante de todas. O que quer que Josh estivesse fazendo em seu escritório, não estava escrevendo.

A tela do computador estava vazia. Se a fonte fosse menor ela talvez não percebesse, mas Any conseguiu ler duas palavras: Capítulo Um.

Nada mais.

O que fazia ali durante as semanas em que supostamente estava escondido escrevendo? O que estava fazendo enquanto ela se familiarizava com sua cozinha?

Não estava trabalhando, isto é certo.

Nos momentos breves e constrangedores em que ficou parada juntando coragem para de bater à porta, Any ouviu silêncio. Não havia som algum. Nada. Nada das batidas rítmicas dos dedos sobre o teclado. Do pressionar da barra de espaço. Do suave zunir da impressora.
Se não o tivesse visto desaparecer para dentro do escritório, acreditaria que o cômodo estava vazio.

Any sentiu uma pontada de empatia.
Depois da morte de sua avó, ela lutou muito para sair da cama. Se não fosse pela ajuda de suas amigas, provavelmente não teria se esforçado.

Onde estavam os amigos de Josh?
Por que não estavam batendo à sua porta ou não traziam uma comida quentinha? Por que não estavam insistindo para que saísse do apartamento?

Porque achavam que ele estava em Vermont. Todos achavam que ele estava em Vermont.

Só Any sabia que não.

Milagre Na 5° Avenida - Beauany Onde histórias criam vida. Descubra agora