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KURT REED

Minha mãe sempre me disse que ao olhar para os olhos de uma pessoa, você poderia lê-la. O fato era interessante porque a mulher que me criou, a mais doce de todas, tinha o olhar mais triste que já vi quando era criança e adolescente. As pessoas erram e amadurecem, perdem e ganham, elas se reencontram, mas minha mãe transmitia pelos olhos que ela nunca iria conseguir ir em frente.

Eu sabia que minha mãe, em algum momento, foi feliz. Eu sabia que ela teria orgulho de quem eu e Andrew somos, Deus, ela iria pirar com Cole como neto...

Eu pensava que minha mãe era a mulher mais bonita com o olhar mais triste que eu já vi. Estava terrivelmente errado. Eu só não encontrei uma mulher mais bonita como encontrei ela com o olhar muito mais triste. Chasina não deixava suas emoções aparecerem com frequência, mas em certos momentos, sua máscara deslizava.

Eu vi isso quando Mallory fez sua escolha, quando Dora morreu, quando eu sequestrei Lin e mais recentemente quando viu o corpo do seu animal de estimação morto. Seus olhos cinzas escureceram e foram para longe, um olhar triste tomou de conta de suas íris e ali, naqueles momentos, eu me perguntava como ela poderia ser tão parecida com minha mãe.

A história que May me contou fez com que várias peças do quebra cabeça se encaixassem. Havia uma possibilidade muito grande de eu estar certo, mas não poderia arriscar e derramar totalmente meus planos. Eu tinha que derrubar meu pai do poder e depois do que May me mandou os arquivos, eu já sabia como. Apesar do meu pai ter me passado o seu cargo (eu ter tomado dele) ele ainda tinha vários seguidores e fonte de renda de alguns clubes e outras coisas que não faziam muito sentido, mas agora tem. Graças a May.

Olho para a foto da minha mãe. Olhos escuros, cabelos pretos azeviches que batiam até metade de suas costas, pele pálida, corpo alto e esguio. Bochechas saltadas, nariz reto e levemente empinado, olhos de boneca e lábios vermelhos.

O destino realmente estava em nossas mãos? Eu deveria ou não ter puxado aquele gatilho? Naquela garota assustada e suja de sangue que me encarou com aqueles olhos, os olhos mais tristes. Anos atrás eu nunca pensei na possibilidade de reencontrá-la, afinal, era para ela estar morta. Lembro-me de ter ficado noites acordado me lembrando daqueles olhos cinzas cheios de medo. Esses mesmos olhos voltaram a me assombrar quase uma década depois.

— O que está fazendo? — sua voz rouca, baixa e doce ecoa pelo meu escritório. Ainda olhando para o meu copo de whiskey e sem levantar o olhar eu me recostei na poltrona. Eram quase três da manhã. Ela não dormia. Ela iria vir até mim. Ela veio.

— Pensando — respondo, finalmente erguendo meu olhar para aquelas íris cinzas. Seus cabelos estão soltos emoldurando seu rosto elegante. Ela está com seus óculos de armação preta deslizando pelo seu pequeno nariz a cicatriz escondida pela escuridão da sala, apenas com a luz do abajur.

Ela pegou meu carro mais cedo e voltou com várias malas, eu não estava aberto para discussões. Eu precisava de mais informações de May e eu não podia arriscar que Chasina fosse morta. Antes, talvez. Agora? Não.

Com meu rompante mais cedo sei que ela não gostou nenhum pouco da minha ordem ou do meu tom de voz. Mas eu sabia que se não fosse isso, ela não iria me obedecer. Afinal, ela não obedece ninguém. Sua raiva é tangível, ela passou a tarde inteira com Cole e fazendo coisas no seu laptop e no celular. Não me olhava, falava ou ouvia. E eu sei que se Cole ainda estivesse acordado — o que ele não está porque ela foi colocar ele para dormir  horas atrás — ela não estaria aqui porque Chasina é igual a mim. Seus pensamentos são altos demais e ela precisa se distrair.

Tão iguais.

— Pensando o que? — questiona rodando pela sala. Ela usa um pijama de marca cara de cetim preto, com manga longa não consigo ver as tatuagens em seu braço. A calça esconde as belas pernas, mas os primeiros botões da camisa estão abertos e eu vislumbro levemente a renda preta do seu sutiã.

DARK ANGEL (FINALIZADO)Onde histórias criam vida. Descubra agora