Capítulo 3

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Lutei contra as minhas mágoas e aceitei passar o fim de semana com meu pai. Minha mãe disse que ele nem acreditou quando soube. Já fazia dois anos que nós dois não passávamos um tempo juntos, nem mesmo depois do divórcio, onde é natural que os filhos passem um tempo com o pai para não romper laços. Pelo jeito, meu pai não insistiu por algo assim, talvez por não ter coragem de me encarar depois de tudo que fez, e não sei como, agora, ele consegue olhar para mim.

— Bom te ver, Saddie. Estou muito feliz. — Diz ele, enquanto abre a porta do carro para mim.

Entro no carro com a sensação de que o fim de semana seria diferente de todos que já tive. Dou uma olhada na casa dos Riccelli por alguns segundos enquanto o carro dá a partida.

Não conversamos durante o trajeto. Não falamos nada. Ficamos apenas imersos em nossos pensamentos, e acho estarmos constrangidos demais para iniciar qualquer assunto.

O plano do meu era irmos para a casa de praia dos meus avós paternos. Eles faleceram há uns anos, e meu pai o alugo nas temporadas. Nesses dois anos, não frequentei a casa, e até achei que tivesse vendido. Pois, se me lembro bem, ele sempre reclamava dos gastos que tinha com manutenção. "É caro mantê-la".

A casa está do mesmo jeito do que eu me lembrava. Nada mudou. Nada.

— Você pode vender essa casa, em vez da minha. — Insinuei, assim que subi os primeiros degraus da escada.

Ele não olhou para mim, não disse nada. Não sei nem se ouviu o que eu disse.

Levo minha mochila para o quarto, que desde quase sempre foi meu. E ele também continua igual. Isso me faz pensar no quarto de Duke, que também continua igual por mais de três anos. Fico me perguntando se meu pai fica no meu quarto, tento a mesma sensação que tenho quando estou no quarto de Duke.

— Quer dar uma volta na praia? Ainda dá tempo de fazer algo legal por aqui. — Diz meu pai, surgindo na porta colocando a cabeça para fora.

— Não sei. Acho que estou cansada, pai.

— Poderíamos ser rápidos. Preciso comprar alguma coisa para nossa geladeira, que está vazia. Não tive tempo de ir antes, e gostaria de ir com você.

Sua expressão tinha um misto de desespero, pois ele nunca gostou de ir ao supermercado. Era capaz de fazer qualquer coisa, só  para não acompanhar minha mãe em um.

— Está bem. Só vou... trocar de roupa.

— Ficarei te esperando lá embaixo.

Assenti com a cabeça e ele fechou a porta.

Abro a porta da sacada separando as cortinas azuis-claros com desenhos infantis de animais do mar. Baleias, conchas, golfinhos e tantos outros. A praia está agitada à minha frente, com ondas furiosas e irritadas. A natureza é sábia, concluo.

Visto um short jeans e uma camiseta branca com estampa rosa clara e azul, sendo duas listras grossas imitando os traços de um pincel em aquarela. Amarro meus cabelos loiros escuros e ondulados num rabo de cavalo. Faz mais de um ano que estou deixando crescer de novo. Quando Duke foi para a Itália, fiquei tão desolada que cortei meus cabelos curtos, tentando, talvez, recomeçar. Recomeçar o que não havia acabado.

Desço a escada que leva para os quartos e encontro meu pai na cozinha bebendo água mineral em uma garrafinha. Acqua Limon, o seu favorito.

— Pronta? — Pergunta ele.

— Pronta.

O supermercado está relativamente cheio. Andamos praticamente em círculo, e dá para perceber que meu pai não tem a menor noção de como fazer compras, e isso me faz questionar como ele anda sobrevivendo sem a mamãe.

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