Selena nunca entendeu de fato porque sua mãe foi embora e a abandonou quando ainda era apenas um bebê recém-nascido. Seu pai não falava muita coisa sobre isso, e ela não fazia a menor ideia de como era ter uma mãe. Nem com quem se parecia fisicamente, mas uma vez, sua avó lhe disse que ela herdara os cabelos lisos, negros e selvagens da sua mãe, e a pele morena avermelhada do pai. E que também, o dom da criatividade e o espírito inquieto era herança do pai.
A grande verdade, era que por vezes, no momento de dormir, sentia falta de um abraço de mãe, e nessas horas, ficava se perguntando porque todos os seus amiguinhos tinham uma e ela não. Até o príncipe Elam era mais sortudo que ela, e também tinha uma mãe. Muitas vezes a avó a colocava no colo e cantava algumas cantigas. Até seu pai, quando podia, também a colocava no colo e contava histórias sobre heróis e sobre os espíritos da mata.
Selena gostava desses momentos, e quando ele apagava a lamparina para que ela finalmente dormisse, as histórias ainda continuavam reverberando na sua mente. Até que começou a contar histórias para ela mesma. Nunca fazia isso em voz alta, apenas mentalmente. Ela criava seus próprios heróis e dava a eles o destino que achasse mais adequado para cada um. Em algumas dessas suas histórias, ela era a própria heroína, que salvava o povo da Serra da Lua Negra do gigante malvado, que aparecia pisando nas serras, nas árvores e destruía tudo.
Talvez pela agitação do dia, da novidade de ter o filho do Imperador dividindo o quintal da sua casa, a possibilidade da ida para escola, um mundo desconhecido para ela, Selena desejou naquela noite, ter um colo para deitar e alguém para fazer carinho em seus cabelos. Sua cabeça estava girando com tantos pensamentos e ela se remexia inquieta na cama, até que ficou de bruços, numa posição um pouco incômoda. Mas vencida pelo cansaço, pegou no sono.
Quando estava dormindo, sentiu que sua posição não estava mais tão ruim. Alguém havia virado seu corpo, e então suas mãos e braços pararam de formigar. Era como se ela estivesse realmente deitada no colo de alguém. Sentiu uma mão fria, porém, extremamente gentil, acariciando sua testa e seus cabelos. Aquilo era tão bom e reconfortante, que se remexeu o quanto pôde, se aconchegando cada vez mais naquele colo.
Algo roçou suas bochechas, fazendo cócegas, então, Selena passou a mão, tocando em uma mecha de cabelo de fios finos e sedosos. Quis abrir os olhos, mas o sono era maior que tudo, ainda mais tendo sua cabeça tão gentilmente acariciada.
— "Linda Selena, a tua história serás de uma grande coragem".
Alguém sussurrou em seu ouvido, mas ela não tinha consciência se aquilo era sonho ou apenas fruto da sua imaginação, ocasionado pelas histórias que contava para si mesma.
— "Prepara-te, minha querida, porque o chamamento acontecerás para ti. Aprenderás a lutar, a dominar o arco, e serás de grande valia na defesa da nossa terra! Arma-te dos grandes ensinamentos do nosso povo, porque serás o ponto de equilíbrio e força para o príncipe, quando a hora chegar!"
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SELENA
RomancePatrimônio natural de Arrebol e o mais valioso de todos os mundos, a Serra da Lua Negra é um lugar remoto, guardado e preservado por causa da sua biodiversidade e suas grandes jazidas de cristais, aflorando por todo canto da sua superfície. Entretan...