RICARDO
Aconteceu uma coisa estranha, no dia que o Metralha veio jantar aqui, eu tenho quase certeza que senti alguma coisa me cutucando.
Mas deve ser só a carteira dele, ou ele tava assim sem querer mesmo, as vezes acontece, né? Mas não deixa de ter sido estranho.Des de anteontem eu não vi mais ele, ainda bem, porque oh carinha arrogante é aquele carioca. Toda hora ele tenta dar um jeito de me perturbar, ou é buzinando a moto atrás de mim, ou falando mal do Nordeste, julgando meu sotaque... como se o dele fosse lindo.
Hoje dona Malvinha vai visitar uma amiga, só vai voltar depois de amanhã, como hoje é sábado, vou fazer uma faxina na casa e lavar os lençóis, Fabiane inventou de comer em cima do colchão e deixou o prato cair na fronha, e eu acabei derrubando leite no cobertor...São umas 6:44 da manhã, fui comprar uns pães pra tomar café, e aproveitar pra saber mais do babado do padeiro chifrudo.
- bom dia senhor Emanuel - entro na padaria vendo ele meio abalado
- bom dia meu filho, vai o de sempre? - ele pega uma sacola branca, pondo 5 reais de pão.
- claro - vejo ele meio pra baixo - mas o que que foi Emanuel, porque ce tá tão quietin?
- oh meu filho - ele põe as mãos no rosto e começa a chorar, se apoiando no balcão - a Rita me traiu - meteu foi gaia.
- oh meu amor - entro na portinhola do balcão e dou um abraço nele.
- que saudade daquela pinguça (cachaceira) meu filho. - dor de corno é foda. - ela ainda quer que eu assuma os bebês porque o cara não quer assumir. - hm dessa eu não sabia.
- e o que você vai fazer?
- vou assumir... - KKKKK - eu amo a Rita, eu não ligo se ela me traiu, a gente dá um jeito - ...
- oh meu sinho, faça o que você achar melhor. - eu pego a sacola de pão e dou o dinheiro. - mais tarde a gente se ver.
Saio da padaria e aperto o passo, quero ver meu banco de informações logo.
Depois da fofoca, eu volto pra casa, tiro a camisa, coloco uma pisadinha "quem me dera" na televisão no último volume e começo minha faxina.
Limpo a sala inteira, deixei um brinco naquele chão, meti água naquele banheiro inteiro, quase morro intoxicado pelos produtos que passei. Também coloquei um remix de "ta rocheda" e lavei a varanda inteira, deixei aquilo brilhando de tão limpo. Quando comecei a limpar a cozinha...METRALHA
- ei cara, tá tudo bem? - vejo Galo vir na minha direção enquanto recarregava um pente de pistola.
- tô de boa mano. - disse enquanto resolvia uns bolos de contas e anotações na agenda.
Esses dias eu ando meio pensativo sobre o que aconteceu comigo naquele dia, eu tô confuso sobre o que eu... gosto.
Sempre que eu vejo aquele cara, sinto meu coração bater, antes eu pensava que era raiva, mas agora eu não sei mais.
Sempre venho perturbando ele, pra ver se o sentimento era de raiva, mas porra, o que eu sinto? Eu nunca senti isso antes, eu sinto nojo de mim mesmo. Eu até esqueci de falar sobre a minha camisa, vou ter que voltar lá amanhã.Ontem eu acordei todo molhado, pensei que tinha me mijado, até que lembrei do sonho que eu tive.
Eu preciso de uma igreja, terreiro, buda tanto faz, eu preciso sair desse transe. Já sei o que é, falta de sexo, não dou umazinha a um tempão.- sei lá mano, tu anda meio esquisito esses dias - não olho pra ele, apenas ignoro e continuo na agenda - é algum problema aí na quebrada?
- é pessoal cara, esquenta não.
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O dono do morro e a luz da serra (Gay)
RomanceRicardo, um nordestino de 24 anos teve que se mudar para um morro por condições financeiras precárias. Metralha, o dono da comunidade do alemão, marrento e autoritário.