Joshua Beauchamp
Os jogadores de quadribol normalmente odeiam a temporada de neve, se têm bom senso: a visibilidade cai para poucos metros, o vento desestabiliza a vassoura, a neve corta a pele descoberta como pequenas facas... Enfim, uma merda. Janeiro e fevereiro são considerados meses de descanso para os times de quadribol, que passam os dias se empanturrando de comida no Grande Salão e jogando qualquer idiotice de tabuleiro na Sala Comunal. Quando chega o equinócio de primavera, em março, estão tão moles quanto pudins de carne.
Por culpa dessa indolência foi que a Sonserina perdeu a taça por três anos seguidos. Os corvinos e lufanos, que treinam em conjunto de vez em quando como os fracotes amigáveis que são, estavam todas as quartas-feiras sem falta no campo, com neve ou sem. Até aqueles asquerosos grifinórios montaram um sistema de treinos semanais, enquanto os verdadeiros campeões — aqueles que deveriam vencer sempre — entupiam os traseiros de sobremesa e suco de abóbora. Desde que abdicara ao cargo de capitão, no último ano, já não era minha função arrastar os cabeçudos sonserinos para a quadra; tudo o que eu podia fazer era reservar o lugar para o time da Sonserina tantas vezes quanto fosse possível. Se a Sonserina não treinaria nas terças e quintas, nenhuma outra casa o faria.
Eu treinava sozinho, enfeitiçando a goles para que ela atacasse os aros repetidamente, vinda de todas as direções, e eventualmente usava mais de uma goles ao mesmo tempo. Às vezes, quando sentia que já havia defendido o suficiente, lançava um balaço no ar e voava por uma hora em zigue-zague, desviando, mergulhando e empinando, praticando as manobras na vassoura durante o tempo ruim. Eventualmente o balaço me atingia, especialmente nas curvas fechadas, e os treinos terminavam com uma coleção de hematomas e dentes lascados ou quebrados. Madame Pomfrey já desistira de tentar corrigir o meu comportamento e limitava-se a exigir que eu guardasse os dentes para que pudesse enfiá-los no lugar mais tarde.
Era uma quinta-feira à noite e minhas mãos estavam adormecidas nas luvas de goleiro, como se os dedos pudessem cair a qualquer momento. Eu tinha mais quinze minutos de treino antes de precisar devolver o equipamento e voltar ao castelo a tempo do toque de recolher, e queria usar cada segundo daquele período. A goles enfeitiçada não dava trégua e preparava-se para uma nova investida, arremetendo contra os aros do gol tão velozmente que era difícil enxergar seu vulto contra a neve que caía. Rangi os dentes e voei de encontro a ela, as mãos posicionadas para receptar a bola, quando um movimento inesperado chamou minha atenção. O momento de distração foi o que bastou para que a goles me atingisse no ombro com um 'crac' forte; caí para a frente, embicando a vassoura em direção ao solo que se aproximava rapidamente. De alguma maneira que não entendi bem, consegui desviar no último segundo, sobrevoando o chão branco por alguns instantes antes de cair em um monte de neve.
A minha queda assustou o pequeno animal que me havia chamado a atenção, um gato preto de compleição esguia e olhos astutos. O gato me encarou com algo parecido com pânico nas íris de um amarelo pálido como pêssego, saltou para o lado e começou a correr enquanto seu corpo tremia e parecia aumentar de tamanho. O felino cresceu até atingir a estatura de uma pessoa.
— Merda.
Em um piscar de olhos, a figura atrapalhada de uma garota havia surgido no lugar do gato, os escuros cabelos cacheados espalhados sobre a neve como uma poça de lama. Ela ergueu-se meio cambaleante, batendo o gelo de suas roupas com as mãos espalmadas, e reconheci o rosto irritado de Any Gabrielly. Any deu uma olhada rápida em mim, caído ao lado da vassoura com uma expressão meio idiota, resmungou um palavrão e saiu correndo.
— Merda, merda, merda — ela repetiu baixinho, a capa rubro-dourada da Grifinória ondulando atrás de seu corpo, e sumiu no caminho que levava ao castelo. Observei sua fuga sem entender direito o que acabara de acontecer, mas sabendo com certeza de uma coisa: Any Gabrielly estava em apuros.
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Da cor das estrelas
FanfictionAny Gabrielly é uma aluna exemplar: monitora-chefe, notas impecáveis, nunca pegou uma detenção na vida. É simplesmente ridículo imaginá-la violando as regras da escola, e ainda mais ridículo supor que ela quebraria as leis do mundo bruxo. Ainda assi...