Capítulo 2

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A felicidade é uma borboleta
Tento capturá-la todas as noites
Ela escapa das minhas mãos na luz da lua

Happiness Is a Butterfly - Lana Del Rey

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Um local com os próprios móveis, privacidade, comida e conforto era, geralmente, chamado como casa. Mas o grande problema, na verdade, era quando usavam a palavra lar para se referir a essas mínimas necessidades. Eu pensava que um lar seria o lugar onde ausentávamos todas as preocupações e focávamos naquelas emoções tão leves, tão generosas, tão gentis que sequer sobraria tempo para pensar nas vezes em que você simplesmente decidia desaparecer, evaporar, esvair e se tornar uma das nuvens.

  Eu nunca senti a sensação de ter um lar, porque eu nunca considerei a moradia que eu tinha em Yvishu¹ — o bairro que eu morava atualmente — como um lugar que eu poderia fugir dos meus próprios problemas ou escapar da sombra que sempre me perseguia. Tampouco em Zuckyv², o bairro que eu não tinha vergonha de dizer que fugi — visto que detestar esses dois ambientes, só por haver a minha presença, era a única característica que os dois tinham em comum e̶ m̶i̶n̶h̶a̶ m̶ã̶e̶ d̶i̶v̶i̶d̶i̶a̶ a̶ m̶e̶s̶m̶a̶ o̶p̶i̶n̶i̶ã̶o̶ q̶u̶e̶ e̶u. Contudo, se me perguntassem o que aconteceu enquanto eu estava em Zuckyv, eu não conseguiria abrir a minha boca para expor nada, uma vez que preferia arrancar meu coração fora.

  Escutei o barulho da porta se abrindo e imediatamente fechando-se às minhas costas.

  — Forte? Fraco? Meio-termo? Escolha — enquanto despiu o casaco e o deixou cair sobre o encosto do sofá onde eu estava sentado, Benjamin sugeriu pontos de café, em uma voz monótona. Ouvi seus passos ultrapassando o perímetro do sofá e logo o avistei contornando o balcão, que separava a cozinha e a sala de estar, em passos apressados. 

  — Já disse que não precisa disso tudo — pela terceira vez consecutiva, tentei persuadi-lo, mantendo meus olhos fixos no livro apoiado sobre meus joelhos. Infelizmente, minhas investidas foram em vão e, pelo tom murmurado, ele deixou claro que a negação era insignificante para ele. I̶r̶r̶e̶l̶e̶v̶a̶n̶t̶e̶ p̶o̶r̶q̶u̶e̶ e̶u̶ e̶r̶a̶ u̶m̶ f̶a̶r̶d̶o̶. I̶r̶r̶e̶l̶e̶v̶a̶n̶t̶e̶ p̶o̶r̶q̶u̶e̶ e̶u̶ e̶s̶t̶a̶v̶a̶ o̶ ̶f̶a̶z̶e̶n̶d̶o̶ p̶e̶r̶d̶e̶r̶ o̶ s̶e̶u̶ t̶e̶m̶p̶o̶ c̶o̶m̶i̶g̶o. Não precisei girar a cabeça à direita para sentir um olhar que me perguntava a mesma coisa. — Forte.

  Ele soltou um suspiro forte, quase alto o bastante para ecoar naquela sala.

  — Aonde você estava? — ele finalmente concluiu a pergunta que aguardava a porta de saída abrir desde as 1 hora e 34 minutos que ficamos no carro. — Fiquei preocupado. — Eu conseguia notar isso observando o seu semblante com olheiras fundas, a voz arrastada, bocejos a cada 7 minutos, sendo processados por 13 segundos. Era notório que suas pálpebras estavam pesadas, uma vez que ele se empenhava para não encostar em alguma superfície. 

  Benjamin me ensinou que havia alguns humanos que realmente gastavam tempo se importando com um ser que não precisava de salvação; chegava a ser deprimente.

  Pare de se preocupar comigo, pensei em dizer. Continue fazendo o que ninguém fez e depois aguarde alguns anos para atravessar sua faca em meu coração, era o que eu nunca falaria.

  — Por que perde seu tempo se preocupando comigo? 

  — Porque eu me importo com você, Aiden! — O tom de voz aumentou, mas soou de uma forma tão cansada que dispensei a leve pontada em meu peito.

Relembre-me no Outono (Livro 1 da Duologia)Onde histórias criam vida. Descubra agora