Capítulo 1

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No dia seguinte, eu resolvi não inventar uma desculpa qualquer para ignorar o Michel por no mínimo uma semana. Por mais que pareça loucura, eu estava começando a pensar num relacionamento sério com aquele maldito. Mas ele, que sempre demonstrou gostar de mim, me descartou como se eu não fosse nada. Só por uma menina mais bonita, inteligente, elegante, gentil, bonita... enfim, só por que uma deusa a visão de todos apareceu. E pra compensar, a vagabunda canta ópera.

Longe de mim parecer ciúme. Aquela vaca já namorou meu irmão mais velho, eu sei do que ela é capaz de fazer para conseguir o que quer, e como usa as qualidades dela pra isso.

Coloquei a roupa mais normal que alguém poderia imaginar, sério, bem sem graça. Uma regata branca, uma calça jeans e um tênis. Tanto faz, eu não queria ir mesmo.

Talvez antes eu quisesse ir.

— Lorena, você parece uma mendiga. - João passou por mim e me deu um beijo de "bom dia".

— São 08:15 da manhã, você acha que eu vou estar como uma deusa? Me erra.

— Ela já acordou mau-humorada? - Carlos me olhou de forma sarcástica.

— Ela tem uma reunião com o lindo e gostoso Michel. - Lorenzo riu se sentando ao meu lado.

Eu apenas virei o dedo do meio para ele, que foi retirado automaticamente quando um tapa de João foi desferido para a minha mão.

Eu fui criada pelos meu pai e meus irmãos, João é 8 anos mais velho que eu, e Carlos 4. Basicamente nossos pais incrivelmente metódicos conseguiram fazer a proeza de ter filhos a cada quatro anos.

Só não foram organizados assim o suficiente para impedir um incêndio enquanto estávamos na casa dos nossos avós. Que deixou a minha mãe com uma bela cicatriz e com um divórcio alegando que meu pai teria deixado aquilo acontecer de propósito. O que foi provado pela justiça que era mentira, mas a esse ponto, a confiança já tinha ido para a casa do cacete.

De qualquer forma, eu conheço a mente masculina de várias formas diferentes, nunca achei que o Michel seria o tipo de cara que me largaria como se não fosse nada assim que outra garota aparecesse. Sinceramente, eu não sei se mesmo ainda querendo tanto o sentir, se eu seria capaz de voltar para ele, mesmo de forma casual.

— Cadê o pai? - Perguntei entre um gole de café.

— Saiu mais cedo. - Carlos respondeu.

— Acho que já vou também, se eu pegar trânsito pelo menos não atraso. - Disse me levantando e pegando a bolsa.

— Camisinha. - João disse em tom brincalhão.

— Ele namora.

Mandei um beijo para todos e saí da casa em direção ao carro. Dirigi pelo trânsito da manhã, rotina. Depois de de cerca de quarenta minutos eu finalmente cheguei, já que essa peste marcou no centro e o lugar mais longe da minha casa. Rapidamente entrei no prédio comercial depois de estacionar. Simplesmente passei pela recepção já que todos me conhecem.

Estava tranquila até o elevador parar no andar dele, alguma coisa fez meu coração disparar. O que era bizarro, eu me sentia assim as vezes quando estava com ele, mas o ódio que eu passei nos últimos tempos fez o que poderia se transformar em sentimento, em completo desprezo.

Tentei manter a postura e logo bati a porta dele.

— Entra! - A voz dele ecoou.

Eu logo adentrei e ele estava apoiado na janela, de costas para a paisagem linda que tal janela proporciona. Fechei a porta atrás de mim e me sentei na mesa dele, só esperando a bronca.
Eu fiz algumas coisas erradas, que incluem: ter errado duas notas do meu solo, ter me atrasado para o último ensaio e não ter ido a última bebedeira da galera.

— Lorena, eu tenho uma coisa para te perguntar.

— Pergunta logo então, não que tenha pressa ou algo assim, só quero sair da sua presença.

— Por que você me odeia? A gente não tinha um grande romance, era um um caso casual.

— Não quero debater meus sentimos com você, Michel. - Suspirei e apoiei as mãos na mesa - qual é, por que você se importa tanto?

— Por que eu gosto de você, e você sabe disso.

— Não não lindo, você gosta da Laila, a sua namorada. - Disse o encarando, ele apenas revirou os olhos e se aproximou.

A presença dele balança meus átomos de uma forma que eu adoraria ignorar, mas é impossível. Ele sempre foi imponente, sempre chamou atenção não importava onde estivesse ou com quem, todos o olhavam. Eu me sentia apagada ao lado dele, mas eu nunca quis brilhar então tanto faz.

Ele se aproximou de mim e apoiou uma das mãos ao meu lado, eu conseguia sentir a respiração dele contra o meu pescoço.

— Eu só estou com ela por que precisava de uma desculpa para os meus pais.

— Que fofo, a mamãe e o papai precisam saber que o filho deles não é um solteirão que não tem um relacionamento sério e só transa com quem quer? Ótimo, bom para você.

— O problema é que agora meus pais amam a Laila, não comigo. Ela resolveu ir pra um bar e por coincidência transou com o meu irmão mais velho, eu só tinha dito aos meus pais que estava namorando. Não com quem. - Ele sentou ao meu lado e suspirou - e quando eu fui perceber, a Laila estava conversando com o meu irmão e ele mostrou uma foto dela, ou seja, minha desculpa foi por água a baixo.

— Que triste, contrata uma puta. Não vejo motivo para você ter me chamado.

— Você não é burra, Lorena. - Ele ajeitou o terno e fixou seus olhos em mim.

— Então eu me faço, se for alguma coisa do tipo, "aí, fica comigo pra eu te mostrar pros meus pais" eu tô fora. - Me levantei da mesa e já caminhei em direção a porta.

Toda aquela vontade de querer ele de volta estava me inclinando a aceitar, mas seria humilhação demais.

— E aquele papo de "eu não fico com ninguém da orquestra nhe nhe nhe".

Ele deu risada enquanto ainda me olhava. Uma humilhação não é nada demais não é? Eu mal lembrava o quão bom é essa risada. Ele costuma a ser muito rígido nos ensaios, mas eu o conheci primeiro assim, rindo e sendo chato, só que um chato legal.

— Esse papo foi por água a baixo, eu realmente te quero de volta. E eu já terminei com a Laila, o que a gente tinha sempre foi meio fachada.

— A jura? Nunca tinha percebido a falsidade no olhar daquela vaca, e você nunca gostou muito de beijinhos rápidos. - Dei risada em resposta e acenei da porta - vou pensar no seu caso.

— Pensa com carinho. - O vi levantar da mesa e se aproximar um pouco mais - aliás, quer tomar um café?

— Eu já tomei.

— Você não recusa um cookie e um capuccino. Vamos logo e para de drama. - Ele sorriu me empurrando para fora e trancando a porta do escritório.

— Mandão. - Dei língua para ele e ri.

Talvez eu pense bem nisso.

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