Ligação

Capítulo 03

Manhã - Casa da Soraya

Soraya sente o calor dos primeiros raios da manhã sobre sua pele. Acordou devagar, os olhos ainda inchados de tanto chorar. Odiava ser tão emotiva, mas era assim, não conseguia esconder o que sentia e acabava deixando os sentimentos transbordar pelo olhar. Neste meio tempo, entre não saber se estava sonhando ou se de fato já estava consciente, sentiu o perfume de Simone. Estava exatamente na mesma posição que dormiu, era inegável a paz que sentia quando estavam juntas. Se existia alguém que Soraya não conseguiria viver sem, esse alguém era Simone. De repente, sentiu uma alegria, e até empolgação, tomar conta de todo o seu corpo, e em segundos estava ajoelhada na cama, acordando a amiga com um beijo demorado na bochecha.

— Bom dia, dorminhoca. Levanta dessa cama, hm? Vamos tomar café antes de deixar a Elena na escola e a Fe na faculdade? A gente pode ir para a empresa juntas, o que acha?

Simone ri, Soraya era sempre ligada no 220, mas naquela manhã, não esperava que a amiga acordasse tão bem e animada. Na verdade, esperava mais da Soraya "não quero ver ninguém, olha como ninguém me ama".

— Ei — respondeu, enquanto esfregava os olhos para despertar de vez — O que aconteceu entre o momento do "vou morrer de tanto chorar" e o "está tudo bem, vamos viver a nossa vida normal"?

Com uma postura perfeita, séria, e de quem sabe exatamente o que está fazendo, Soraya responde:

— Eu só... entendi que não vale a pena. Esse noivado estava fadado ao fracasso, e... — demorou um pouco mais, sabendo que o assunto era território perigoso — Eu acho que estou apaixonada por outra pessoa, é isso.

— O que? E como assim você não me falou isso antes? Soraya, sou eu — Foi a vez de Simone pular da posição em que estava e ficar de joelhos na cama, frente a frente com Soraya. Sentiu uma pontada de ciúmes e indignação, e lá no fundo, sabia que não era por saber da informação agora, e sim, por por Soraya aparentemente já estar a fim de outra pessoa que não era ela.

Quando a loira ia responder, a porta do quarto se abre, dando espaço para a cabecinha loura de Elena:

— A barra tá limpa aqui? — Os imensos olhos azuis da menininha demonstraram a desconfiança de quem apesar da pouca idade já havia passado por muita coisa.

Soraya sentiu-se horrível, sabia que seus problemas afetavam as duas meninas, que apesar de não carregarem seu sangue, eram mais que afilhadas, eram suas filhas. Elena e Fernanda também eram primas de segundo grau de Simone, filhas de Marisa. As três eram inseparáveis, cresceram juntas, frequentaram a mesma escola e acompanharam de perto a curta vida de uma parte importante do trio. Quando receberam a triste notícia de que Marisa se fora, choraram abraçadas por horas, não só pela perda, mas pelo medo de como seria o futuro das duas menininhas que ficaram órfãs. Entretanto, Marisa era inteligente e sempre pensava em tudo, naquele mesmo dia, um pouco mais tarde, receberam a notícia de que teriam que dividir a guarda das duas, um alívio no meio de tanta tristeza. E assim o laço entre as quatro começou a se atar, muito mais forte do que Soraya um dia pode imaginar.

Soraya então levantou da cama, foi até a menina, segurou em uma das mãos tão pequenininha e sorriu.

— Está sim, pequena. Nada de choro e drama, eu prometo — Levantou a mão que estava livre, em forma de juramento e a abraçou.

10h00 - Escritório SS Eventos

O dia seguiu tranquilo, Simone não conseguia parar de pensar em quem seria a nova pessoa que entraria na vida de Soraya e consequentemente na sua e na das meninas. Sim, ela tinha certeza de que independente de quem fosse, em pouco tempo pintaria um romance porque era impossível não se apaixonar por Soraya. Ela era brilhante, e não só intelectualmente falando, mas literalmente, ela brilhava. Tinha uma luz interna que se externava e contagiava a todos. Além disso, era linda, dona de um corpo escultural e que deixaria qualquer pessoa fissurada. O incômodo sentido era tanto que ela se remexia na cadeira e se concentrar no trabalho era quase impossível, olhou o horário, quase 10h da manhã. Pegou o celular e só então lembrou de Leila. Puta que pariu, não avisou que dormiria fora de casa, e muito menos que iria trabalhar direto lá. Fodeu. Foi a única coisa que conseguiu pensar. Abriu as mensagens de Leila e teve a certeza que além do novo amor de Soraya, ia ter que lidar com outro problema.