Helô observava a força policial deixando sua casa, levando todos os vestígios de que qualquer coisa fora do normal havia acontecido por ali. A movimentação era intensa, mas tudo passava em câmera lenta na frente dela, a realidade dos últimos meses finalmente começando a cair para a delegada. Havia acabado. Ela gostaria de dizer que era ponto final, mas ao olhar para o lado e ver Stenio ainda abraçado de maneira forte à Creusa no sofá da sala, ela entendeu que as feridas que haviam sido abertas ainda demorariam para cicatrizar.
Eles conseguiriam voltar à normalidade? Como seria a vida deles a partir de agora?
- Helô, a gente vai organizando tudo na delegacia – Yone disse, quebrando o silêncio e trazendo a delegada de volta – Você vai com a gente pra lá?
O primeiro impulso de Helô foi dizer que sim, que ela iria. Heloísa era metódica com seu trabalho, gostava de sempre estar à frente, liderando, agindo, sendo exemplo. Queria encarar Pilar atrás das grades, jogar na cara dela que jamais teriam a localização do cofre.
Mas o olhar dela se encontrou com o de Stenio, que rapidamente abaixou a cabeça com uma tristeza no olhar que Helô sentiu direto no peito. Ele já esperava que ela fosse. Ela sempre ia. Já havia dito uma vez que não poderia ficar nem por ele.
Essa era Heloísa Sampaio.
Pela primeira vez Helô se permitiu sentir o impacto de tudo que havia acontecido. Ela poderia ter perdido tudo isso. A família dela, que agora repousava a salvo em sua sala, poderia não estar ali. Durante o sequestro de Stenio, Creusa jamais saiu do seu lado. Durante o sequestro de Creusa, Stenio sempre se fez presente. Ela sempre lutou para mantê-los seguros e conseguiu.
Mas poderia não ter conseguido e o simples pensamento fez a garganta fechar com o choro engasgado.
- Helô? – Yone chamou a delegada ao perceber a confusão no olhar dela.
- Eu vou ficar – ela disse com a voz fraca, limpando a garganta antes de repetir – Podem ir, eu vou ficar aqui.
Ela não olhava para Yone, ela olhava diretamente para Stenio e Creusa. Viu o exato momento que o advogado a encarou confuso, mas havia algo diferente no olhar dele. Talvez, se ela fosse corajosa para encarar os sentimentos dele, poderia chamar de esperança. Mas ela preferia não nomear nada agora.
Ela não se despediu da policial. Helô apenas se encaminhou para o sofá, se sentando ao lado de Creusa, repousando a cabeça no ombro dela. Não demorou muito para sentir a mão de Stenio, que se sentava do outro lado da empregada, chegando ainda que desajeitado em suas costas. A delegada fechou o olho e respirou fundo. Parecia que era a primeira vez em dias que o ar entrava de verdade em seus pulmões.
Yone ficou olhando a cena que se desenrolava à sua frente. Era como se os três não percebessem mais sua presença ali, imersos em um mundo particular, ela se sentiu invadindo o espaço deles. Um momento que não deveria estar sendo visto por mais ninguém. Sem fazer barulho, ela foi até a porta e partiu rumo a delegacia.
A delegada estava onde deveria estar.
Stenio foi o primeiro falar, tirando os três do silêncio que dominava a sala.
- Eu vou fazer um chá pra gente – ele olhou para Helô como quem pede autorização, ela respondeu um sim com a cabeça e um leve sorriso nos lábios.
- Creusa, vai tomar um banho, vai – a delegada disse enquanto Stenio ia até a cozinha – eu também vou e depois a gente toma um chá e come alguma coisa, tá?