"Gaspar... você me ama? De verdade?"
"Você é o único amor da minha vida, Gilda. Sempre foi."
Ela acelerou o carro em direção ao penhasco.
Deus realmente estava do lado deles, pois um milagre aconteceu. A queda dos dois foi amortecida pela água - único motivo pelo qual não houve morte instantânea. Com o impacto, o vidro das janelas quebrou, inundando o veículo antes que pudessem processar a situação. Antes que o carro parasse de funcionar completamente, Gaspar conseguiu abrir a porta e sair do rio profundo. Ele olhou em volta, incrédulo com o fato de que tinham escapado, até que percebeu a sua repentina solidão.
Gilda não estava com ele.
Dominado pela adrenalina e pelo desespero, o homem pulou de volta no rio, ignorando o ardor de seus olhos por mantê-los abertos. Não demorou para que encontrasse Gilda. Lá estava ela, ainda no banco do motorista. Aparentemente inconsciente. As portas já não funcionam mais. Então, com cautela - mas o mais rápido possível -, Gaspar retirou o resto dos cacos de vidro, soltando o cinto de segurança da ex-dona do Grande Hotel Budapeste e a puxando pela janela.
Houve dificuldade por estarem submersos e sem ar, porém, eventualmente, a dupla chegou à margem. Finalmente com oxigênio nos pulmões, Gaspar sentia seus batimentos acelerados, que só pioraram quando ele se virou para Gilda, deitada como se dormisse. Seus cabelos estavam sujos de terra, e sua roupa, encharcada. Ela, que sempre fora a mulher mais vaidosa e arrumada da cidade inteira, parecia deslocada naquele fim de mundo. Ainda que fosse o Diabo encarnado, ela estava linda como sempre. Uma pintura renascentista que jamais seria destruída.
Ele não sabia o que faria se ela não acordasse.
Como se escutasse seus temores, Gilda abriu os olhos e se sentou. Ela tentou respirar, o que resultou em uma crise de tosse. Demorou vários segundos para que fosse capaz de expulsar toda a água que engolira. Enfim, ela encarou o céu tal qual um anjo caído, exausta e confusa, até notar estar sendo observada. "Gaspar?" Sua voz falhou, e ela limpou a garganta com um pigarro. "Você me salvou?"
Indo em sua direção, ele deixou escapar um sorriso aliviado. "Eu achei que fosse te perder."
Eles estavam a centímetros de distância, e Gilda o olhava de um modo estranho. Como se essa fosse a primeira vez que o enxergasse de verdade - as águas tinham lavado sua mente da obsessão que tivera por Orlando, tão curta e tão intensa, a livrando para o mundo novamente. Contudo, um instante se passou e seu brilho no olhar foi encoberto por uma soberba extremamente familiar para eles. "É impossível acabarem comigo. Eu sempre volto."
"Ressurgindo das cinzas." Ele riu, observando os arbustos perto da margem. Não havia nenhuma flor, exceto por uma pequena, praticamente deixada de lado.. Amor-perfeito. "Ou melhor, do rio. Poético."
"E você nem teve tempo de fazer respiração boca-a-boca."
"Eu não preciso de primeiros-socorros para ganhar um beijo." Provocou, segurando o rosto de Gilda e colocando a flor atrás da orelha dela, se aproximando ainda mais.
Antes que o beijo acontecesse, no entanto, ela o empurrou para trás. "Agora não, Gaspar."
Percebendo que ela tentava se levantar, ele rapidamente estava de pé para ajudá-la. "'Ocê consegue andar?"
Gilda bufou, fazendo questão de se levantar sozinha, ajeitando a flor em seus cabelos. "Eu estou ótima." A rouquidão em sua voz não deixava seu argumento nem um pouco convincente. "Nós temos que ir embora antes que a Polícia nos ache."
"Para onde? A gente tá no meio do mato, Gilda!"
A mulher procurou por alguma saída, com o pensamento ágil. "Vamos continuar andando até achar alguma cidadezinha. Dizem que sempre tem uma perto de um rio. Depois, é só achar um transporte."
O olhar de Gaspar continuava retornando para a água. "Mas e se acharem o carro?"
"Que achem! Vão nos dar por mortos e nos deixar em paz. Isto é, se você ficar quieto e vier logo!"
Ela tinha razão: não era hora para ter dúvidas. Juntos, o antigo casal de amantes partiu sem voltar atrás. Uma coisa que sempre tiveram em comum foi o egoísmo, ou, ao menos, o pensar em si antes de nos outros. Mais uma vez, o passado estava morto, com exceção de Gaspar e Gilda. Eles estavam seguindo para um novo país.
Rumo a uma nova vida.
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amores-perfeitos guiando o caminho
Fanfiction"Gaspar... você me ama? De verdade?" "Você é o único amor da minha vida, Gilda. Sempre foi." Ela acelerou o carro em direção ao penhasco.