Quando eu abro os meus olhos, eu percebo que não estou mais na casa da minha avó.
À minha frente se estende um cenário deslumbrante, com árvores majestosas e grama macia em baixo de mim. Estou diante de um lago, um lago cristalino e sereno, reflete o brilho suave do sol, criando uma atmosfera de paz e magia. Parece que está de manhã. O céu tem uma coloração clara, um pouco alaranjada, e seu calor é confortável.
eu sinto uma estranha sensação de já ter estado nesse lugar, sem nunca ter pisado nele antes. Eu tento me mover, mas minha visão está fixa no cenário aonde eu me encontro, até que de repente, minha visão se aproxima da água do lago, e então, pelo reflexo da água, eu me deparo com o rosto de um Cervo! eu começo a beber de sua água. Consigo ver o meu focinho, e a minha língua a puxar a água para dentro da minha boca delicadamente. Eu estou a sonhar com Cervos de novo. Não há chifres em minha cabeça, eu sou um Cervo fêmea de novo, mas se é o mesmo, ou um diferente da outra vez, eu não consigo dizer com certeza. Se eu não soubesse que estava a ter um sonho, eu diria que isso tudo é muito real, uma realidade cruel, pois eu sei exatamente o que irá acontecer com essa pobre criatura, então eu apenas aproveito o meu momento de paz em quanto eu ainda tenho. Bebo minha água, despreocupada do que possa vir a seguir.
Assim como da outra vez, estou sozinha, não há outros cervos por perto. a solidão me atinge, e mesmo cinte do que aconteceu da outra vez, eu não consigo deixar de sentir o medo crescendo em mim, de que a qualquer momento a minha paz vai embora, e em seguida, a minha vida. Mesmo que eu não sinta a dor desse animal, a for que ela sente parece ser real.
Como esperado, de repente algo chama a atenção do meu Cervo. ainda parada, eu rapidamente levanto meu rosto da água e observo a floresta ao meu redor, a procura do que me perturba. A floresta é clara, mas sua grama alta e seus arbustos escondem o perigo eminente. Eu não consigo enxergar nada além da natureza, e meu cervo também parece ter dificuldades para identificar o perigo. Tudo está quieto, um silencio mortal que esconde a gravidade da situação, mas o cervo não se deixa enganar e então, de repente, uma criatura quadrupede pula para fora dos arbustos. É um lobo, um lobo feroz, cheio de fome, e ódio, porém...esse lobo é diferente, não é o mesmo lobo do meu outro sonho. Esse possui uma pelagem preta, olhos vermelhos como sangue, lançando um olhar raivoso que penetra bem fundo na minha própria alma. Enchendo não apenas o meu cervo de medo, como a mim mesma que sou apenas uma mera espectadora. também há sangue pingando de sua boca, indicando que ele já estava a se alimentar de alguma outra coisa antes de me encontrar.
Ao vê-lo, meu cervo não perde tempo, e rapidamente corre na direção contraria do animal.
Eu já estava à espera de que isso pudesse acontecer, mas mesmo assim, eu sinto como se eu estivesse muito mais apavorada agora! Assim como eu, o Lobo não perde tempo e começa a me seguir. Escuto suas quatro patas atingirem a grama com ferocidade logo atrás de mim, A cada segundo o meu desespero aumenta, meu cervo está correndo pela própria vida. Mesmo que eu saiba que esse esforço será inútil, no fundo eu ainda torço para que esse cervo consiga sair dessa situação. Não faz muito tempo desde que começamos a correr, e o lobo já está bem perto de mim, a uma mordida de distância. Eu sinto o seu bafo atingindo a minha pele, prestes a dar uma mordida, e então, eu sinto seus dentes ferozes a penetrarem na minha perna. Solto um grunhido doloroso em quanto eu perco o meu equilíbrio e caio no chão, e mesmo assim, o lobo negro não desfaz a sua posição. Agonizando, começo a gritar, soltar o som típico dos cervos. Em quanto eu estou no chão, eu ainda tento correr, mas é inútil. O lobo balança sua cabeça rapidamente de um lado para o outro em quanto ainda mantem a minha perna presa em seus dentes. Não importa quanto o meu cervo grite e esperneia ou chora. Ninguém vai te ouvir, ninguém vai vir te ajudar. Você vai morrer. Não é o que eu quero, mas eu aprendi que essa é a realidade.
O Lobo dos olhos vermelhos está pronto para dar o próximo passo. Ele solta seus dentes da minha perna. Vejo que há muito sangue a escorrer do meu ferimento. Um machucado grave. Meu próprio sangue escorre por cima de mim, banhando a minha perna em um vermelho que também se encontra na boca do predador. Eu ainda tento correr, arrasto meus cascos pelo chão, mas estou tão enfraquecida, mas mesmo assim, tomada pela dor, o meu medo de morrer é maior, então eu não paro de me mover pelo chão, mesmo sendo inútil. O lobo passa a língua em volta de seu focinho, recolhendo o meu sangue que havia em sua boca e se aproxima do meu rosto e do resto do meu corpo. Minha vontade é de fechar os olhos para eu não me deparar com essa cena violenta de novo, mas não sou eu quem está no controle desse corpo.
De repente, dentes afiados perfuram o pescoço, fazendo com que um grunhido agudo e repetitivo saísse do lobo negro. O choque percorre meu corpo e, estranhamente, o cervo parece compartilhar da minha perplexidade. Diante de nós, surge um lobo cinza, veloz e decidido, avançando na direção do lobo negro. Com uma mordida feroz no pescoço, ele demonstra uma ferocidade surpreendente. Ao se afastar, o lobo cinza posiciona-se à minha frente, o olhar firme e as orelhas abaixadas, uma postura defensiva que transmite uma mensagem clara. Eu estava à espera de que um confronto sangrento pudesse acontecer entre eles aqui e agora, porém os latidos pararam, o lobo negro desistiu, e ainda machucado, eu o vejo se afastar de nós. Ele anda com dificuldade e entortando seu pescoço, tentando aliviar de alguma forma a dor que ele sente. Sou deixada a sós com o lobo cinza. Os dois provavelmente estavam brigando para decidir quem iria ficar com a presa, e fazer dela sua refeição. O lobo se vira para mim, e consigo ter visão de seus olhos azuis, mas não é um olhar raivoso. O lobo olhar para todos os lugares, confuso, pensando no que ele irá fazer a seguir. Será que esse é o mesmo lobo de antes? O do meu outro sonho? O meu corpo treme, treme pelo medo do que pode vir a seguir, mas sou incapaz de fugir, minha perna ainda está machucada.
O lobo cinza me observa com suas orelhas atentas. Sua boca está aberta com sua língua para fora em quanto ele ofega. Ele está bem próximo de mim. Sem dúvidas, esse é o mesmo lobo de antes, mas por algum motivo ele não parece hostil. De repente, Ele se move para fora do meu campo de visão, mas não se afasta totalmente. Em vez disso, sinto sua presença ao meu lado, sua figura imponente se deitando de forma serena. Me envolvendo com o seu corpo canino.
Seu queixo repousa no chão, oferecendo um suporte confortável para minha cabeça. A cabeça do cervo se acomoda de forma natural sobre a dele. É um gesto estranho e inusitado, e a pergunta que ecoa em minha mente é: por que? Será que esse lobo ainda pretende me atacar? Minha confusão persiste, mas uma sensação surpreendente começa a se instalar em mim.
Apesar das feridas e do medo que ainda pulsa em mim, a presença do lobo me traz uma sensação de segurança. Sinto-me protegida, como se, por um instante fugaz, a harmonia fosse possível até mesmo entre criaturas tão distintas.
No silêncio frio da floresta, os minutos parecem se estirar, esticando-se como fios invisíveis que nos mantêm presos naquela cena estática. A calma respiração do lobo, que agora repousa a um fio de ar da minha pele, é como um suave sussurro de vida em meio à quietude sepulcral. Meus pulmões retomam, aos poucos, o compasso tranquilo e regular, como se o próprio lobo, em sua proximidade, tivesse o poder de acalmar meu corpo exausto. Sinto meus olhos ameaçarem a se fechar em quanto ainda descanso minha cabeça por cima do lobo. Não sei se eu estou morrendo por falta de sangue, não sei se apenas estou desistindo, ou se esse lobo só está esperando eu adormecer para enfim me devorar, só sei que o meu Cervo está usando esse momento de trégua para descansar e repor as suas energias. O que vai acontecer depois? Se ele lobo vai me devorar, se ele vai embora, ou permanecer ao meu lado? Eu não faço ideia, e juro que eu gostaria muito de saber.
A cada vez que eu pisco os meus olhos, mais eu demoro para abri-los de volta, e posso sentir que o lobo faz a mesma coisa. eu permaneço confusa. Não é dessa forma como as coisas deveriam acontecer, então por que isso está acontecendo? Isso vai contra tudo o que eu conheço sobre o que é a vida.
Enfim, os olhos do cervo se fecham completamente. Não sei dizer se estou morta, ou apenas a dormir, e muito menos sei o que irá acontecer a seguir. Eu não sei de mais nada. Minha mente está em pedaços, e mesmo diante de tantos questionamentos, eu ainda consigo sentir a respiração calma do lobo ao meu lado, e por algum motivo...isso me deixa emocionada.
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Histórias De Inverno (A Chapeuzinho Vermelho e o Lobo)
WerwolfBaseada no conto da Chapeuzinho vermelho... Astrid é uma jovem garota que viaja pelas frias terras nórdicas a caminho da casa de sua avó, Porém o caminho é traiçoeiro há perigos no fundo Da floresta e o lobo mau passeia aqui por perto...