𝑼𝒎 𝑮𝒖𝒂𝒓𝒅𝒂-𝒄𝒉𝒖𝒗𝒂 𝒑𝒂𝒓𝒂 𝑳𝒖𝒅𝒆𝒙.

309 36 7
                                    


       ...

       Etérea.

       Esta era uma palavra presunçosa para quem se propusesse a descrever aquela madrugada. Oh, não... Beirava o eufemismo.

        Os bêbados e errantes já estavam acostumados com a presença de Ludex pelas alamedas em noites fúnebres. Era sempre uma possibilidade a se pensar que os céus se fechariam caso deparassem-se com aquele par de olhos indecifráveis. Entretanto, dos tempos vindos, as possibilidades tornaram-se presságios, e dos presságios, só restaram as certezas de que o cosmos choraria.

       "É oficial. Neste exato momento, a metrópole reitera que encerrou-se o período de 24 horas... Liath é confirmada a décima quarta melusine a desaparecer em um intervalo curto de três dias..."

       O juíz estava desolado. Não era Liath com quem ele havia encontrado-se há alguns dias apenas para conversar levianidades sobre o clima?

        Àquela altura, Elynas certamente o desprezava. Ele havia falhado, falhado desde a primeira declaração.

       ...

        — ... — Sozinho, Neuvillette encarava os céus em meio à corte noturna de Fontaine. Suas noções desvanecendo-se junto às gotas de chuva que ecorregavam em sua pele pálida, próximas aquele par de olhos meândricos. Era um dos poucos momentos em que sua vulnerabilidade e desespero burlavam aquela máscara inacessível que pintavam e cobravam de sua persona... Talvez, ele só precisasse que os céus parassem de lamentar sobre ele.

       E repentinamente... Pararam. Ao menos, por alguns instantes, pois um tecido negro e impermeável cobriu seu corpo visivelmente ensopado.

       — ... Está perdido? — Ele nunca ouvira algo com aquele timbre, com aquela intensidade... Com aquela voz. Entretanto, fora suficiente para abafar o mundo imensurável fora daquele guarda-chuva. Seu olhar foi puxado para o novo par de botas próximo às suas, para uma calça acinzentada, uma jaqueta carmesim de manto cinzento, cabelos negros mechados, e enfim... Para o magnetismo de duas íris gélidas que analisavam-no com o mesmo empenho. — ... Me deparar com um homem parado em meio à chuva não é exatamente um espetáculo recorrente para mim.

       — ... — As gotas que desciam batiam e desgastavam o asfalto, escorrendo entre suas frestras. O calor daquele corpo quente transferindo-se para o corpo encharcado de Ludex.

       — Ao menos... Não um tão... — Tudo nele era tão cinzento, pensou Neuvillette. Quase como um dia tempestuoso, mas ao contrário do esperado, aquilo não o incomodou. Não incomodou-o nem um pouco, aliás. Para ele, fora a primeira vez que vira o cinza tornar-se uma cor quente. — ... Perturbado.

        — ... — Eles entreolharam-se. — ... Perturbado? — Neuvillette repetiu, sua voz soara fraca como um sussurro experimentando a palavra nunca dita por seus lábios antes. Era quase como um refúgio para ele ter alguém ali para que nomeasse as emoções que transpareciam em seu rosto, que transpareciam nos céus, e quem melhor para fazer isso do que um humano?

        — ... Desculpe. É um costume pensar alto.

        — ... — O Ludex não respondeu por um momento. — ... Agradeço.

       — ... — O homem encarou-o, e em seguida, olhou brevemente para o referido guarda-chuva, entretanto... Aquele brevemente foi o suficiente para que aqueles longos cabelos níveos sumissem em meio à tempestade.

       ...

       "Não acredita? Pois pergunte aos que residem sobre os mares terrestres... Toda vez que o soberano chora, as lamúrias dos céus caem sobre a terra."

      

Lágrimas de um Céu Falso Onde histórias criam vida. Descubra agora