Capítulo 13

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  Ele me encara surpreso pela pergunta.
- O que?
- Você falou que não consegue dormir, meu palpite é que tem algo te incomodando, falar sobre ajuda. - Ele nega com a cabeça. - Tudo bem, você não é obrigado a nada, quando quiser falar com alguém, eu estou disponível para escutar, tenho ótimos conselhos. - Falo amigavelmente. - Mas ressalto, guardar as coisas para si mesmo só vai te fazer mal. - Lucien encobre sua angústia sob o disfarce de uma pessoa brilhante e carismática, se preocupa profundamente com as pessoas e deixa ser afetado por mais coisas em seu íntimo do que deixa transparecer.
- Espera. - Sussurra quando estou pronta para voltar para meu aposento. - Sei que não vou conseguir dormir de novo, então... Me faz companhia? - Como meu sono já foi perdido, concordo com um aceno.
  Ele passa por mim tão perto que prendo a respiração, seu braço roçando no meu, o que está acontecendo comigo? Não consigo me reconhecer quando estou perto dele. Burra, para de palhaçada, se recompõe, me estapeio mentalmente e vou atrás dele. Ele passa pela porta, indo até a varanda, apóia os braços na pedra que separa a varanda de uma queda mortal, pelo menos para humanos.
  Fico olhando para ele examinando seu perfil, seus olhos caem para os meus, ele inclina a cabeça indicando para chegar mais perto dele.
  Lucien começou a contar sobre algumas partes da sua vida, contou sobre a feérica inferior por quem se apaixonara e foi morta pelo seu pai e irmãos, contou sobre o relacionamento horrível que tinha com eles, falou sobre sua mãe, em como era a única daquele lugar que se preocupava com ele e como era sua vontade tirá-la de lá, mas não aconteceria enquanto Beron vivesse. Falou sobre seu tempo na primaveril e quando conheceu a quebradora da maldição, a maldição que assolou Prynthian, mais conhecido como Amarantha, em como ela morreu e foi refeita como feérica. Disse sobre as irmãs Archeron mais velhas, que o rei de Hybern raptou elas e as jogou no caldeirão, como um experimento, contou sobre a segunda mais velha ser sua parceira.
  O rosto do homen se transforma em dor, os lábios formam uma linha fina, percebo ele lutar contra a vontade de derramar algumas lágrimas. Ele  parece preso em seus pensamentos, mordo o lábio inferior esperando que continue.
- Quando Feyre voltou para corte primaveril e enganou Tamlim, para destruí-lo de dentro para fora, ela me ofereceu a ir com ela para corte noturna, eu aceitei. Queria saber se valeria a pena lutar pela minha parceira, lá eles me deram um papel de emissário, não muito diferente do que eu tinha na primaveril. Só que dessa vez, era para as terras humanas. Feyre ofereceu para morar com eles, na cidade deles, mas, não me encaixei lá. Com meu trabalho de relatar para eles tudo o que acontecia aqui, resolvi morar com Jurian e Vassa. O bando de exilados, excluídos. - Ele disse sem expressão enquanto encarava a claridade surgindo do  horizonte, pesar percorreu minhas veias.
- Acho que eu nunca me encaixei em lugar nenhum, aqui foi onde me senti mais confortável, acho que por todos nós estarmos tão quebrados e ninguém nos querer. - Lucien engoliu em seco,  seu sussurrou entrecortado me atingindo com força, sua postura vacilou e seus olhos lacrimejaram, uma lágrima escorreu por sua bochecha. Sinto um aperto horrível por ver ele assim, ele parece sentir desgosto, desgosto de sim mesmo. Não é preciso bater para machucar, a palavra dói, o silêncio dói, o desprezo dói e a indiferença dói. É impressionante saber o quanto ele sofreu ao longo da vida e está aqui. Quebrado, machucado e com feridas profundas, mas sendo forte o suficiente para continuar. Ele é um guerreiro e verdadeiro sobrevivente.
  Sem pensar muito em minhas ações, pego o rosto dele entre minhas mãos e o forço a me olhar, enxugo suas lágrimas delicadamente.
- Eu tenho certeza de que todo seu sofrimento um dia será recompensado.
- Parei de acreditar nisso a muito tempo. - Um tremor nos lábios, seu olho opaco e sem vida, desesperança no olho vermelho.
- Você sobreviveu aos piores dias da sua vida. Você sobreviveu a ausência de pessoas que já considerou serem essencias para sua vida. Você sobreviveu à dores e decepções e continuará sobrevivendo, porque apesar de não ser de ferro, você é tão forte quanto. Você é forte a partir do momento que coloca um sorriso no rosto e finge que está tudo bem, você é forte ao levantar todas as manhãs da sua cama e enfrentar um dia após o outro mesmo não querendo, mesmo sem ânimo. Você é forte ao enfrentar tudo o que lhe aparece pela frente, mesmo que à noite você desabe, é normal, faz bem, ninguém é forte o tempo todo, ninguém está bem sempre. É difícil lidar com toda essa confusão de sentimentos que nos atropelam pelo caminho. A gente tenta ser forte, não demonstrar que está doendo, finge não sentir, sentindo tudo intensamente. Coisas ruins acontecem e infelizmente às vezes não conseguimos fazer nada para impedir, não se ache insuficiente por isso, você não é insuficiente, pelo pouco tempo que conheço você, sei que é incrível, por mais que diga que não, que não veja isso, que negue, mas querendo ou não, você é! Alguns planos dão errado. Algumas pessoas vão embora, mesmo quando desejamos muito que elas fiquem. Tragédias acontecem, alguns sonhos acabam não se realizando. Podemos questionar o motivo, nos revoltar, culpar os outros, nos culpar, ou entrar em estado de negação. Mas nada disso pode mudar o que já aconteceu. A nós cabe apenas enfrentar o medo e a dor que essas decepções nos causam, para recomeçar, nos reconstruir e renascer das cinzas. Só assim poderemos nos transformar em nossa melhor versão.
  A boca de Lucien abriu uma, duas, três vezes e fechou porque não sabia o que dizer diante de minhas palavras. O ruivo parecia não se lembrar qual tinha sido a última vez que alguém tinha se importado verdadeiramente com ele, de enxergar o que acontecia dentro dele, de o entender e tentar mostra-lo que ainda existe algo bom para ele, um futuro.

 

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