Pizza

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Tudo começou em uma sexta costumeira, encomendei uma pizza em comemoração ao início do final de semana. Eu moro sozinho, mas mesmo assim sempre encomendo o maior tamanho possível e geralmente demoro um ou dois dias para comer a pizza inteira.

No sábado, recebi a visita de alguns amigos. Nós nos reunimos para beber enquanto conversávamos sobre a semana, deixando alguns clipes passando de background no autoplay do youtube. Começou a tocar um clipe que tinha uma possessão, e Alex, um amigo meu, iniciou um relato:

— Sabem que esse troço de possessão é verdade, né?

— Tu deve ter ido numa igreja e ter sido enganado por uma atriz cantando Shakira dizendo que tava possuído pelo demônio. — Respondi, incrédulo.

— Não, foi na casa de um primo meu, faz uns 4 anos. Nós fizemos um ritual para invocar um espírito, e meu primo começou a imitar um cavalo. Ele cavalgava pela sala, até deu um coice na televisão.

— Pô, fingir assim é fácil.

— Não foi fingimento! Ele tá internado em um hospício até hoje, relinchando enquanto anda de quatro sem parar.

— Cara, aposto 100 reais que é impossível um ritual desses dar certo.

— Não faço isso de novo nem por um milhão de reais. — Alex tinha uma expressão como se estivesse realmente apavorado.

— Você pode ir embora, só diz como que é. — Não me deixei afetar pela atuação de novela mexicana dele.

— Eu digo, mas não vou apostar nada. Vai que você faz errado

— Eu aposto! — Um outro amigo do grupo, Julio, se manifestou. — Já vi isso funcionar e arrisco 100 pila pra ver isso acontecendo de novo.

Alex instruiu o passo a passo do ritual e então foi embora, ainda pedindo para que não fizéssemos o ritual. Realmente ele acreditava de que aquilo daria certo. Todos riram tanto da crença absurda dele.

Fizemos tudo como o recomendado: palavras desconhecidas, sangue, danças estranhas, velas, e etc.

Nada aconteceu. Ganhei os 100 reais do Julio e nos despedimos alguns minutos depois, afinal tinha acabado todas as cervejas.

Deitei na cama para dormir, o teto girando pelo excesso de álcool. "Vou comer um pedaço de pizza, beber água e tomar um banho", pensei ao levantar-me da espiral torturante do meu repouso.

Caminhei até a caixa da pizza, colocada dentro do armário para que nenhum amigo meu roubasse o meu rico alimento oneroso do final de semana. Ao encostar na caixa, ela se moveu. "Puta merda, algum rato entrou e comeu minha pizza, de novo. Eu preciso adotar um gato." Abri a caixa devagar, receoso no que eu veria. Para a minha surpresa, não havia nada de estranho, apenas o resto da pizza. Fui pegar um pedaço, mas uma dor lancinante me fez afastar a mão. Olhei o motivo: metade do meu dedo mindinho fora decepado. Como um ketchup temperando a pizza, sangue voava na massa. Tentando compreender a situação, fui surpreendido por uma voz grossa e imponente:

— Hum! Que delicia, cara!

Olhei para baixo, a pizza estava falando comigo. O queijo se movia, e a abertura parecia um portal infinito, pequenos dentes afiados decoravam o buraco.

— Você é muito gostoso, joga um pouquinho mais de sangue aqui pra dar um saborzinho.

Chutei a caixa e a pizza caiu no chão, mas levantou-se imediatamente. Então tentei chutar a pizza, mas ela prendeu o meu pé e começou a mastigar o meu dedão. Puxei a minha perna com força, sangue espirrou pelas paredes do quarto com a nova mutilação. Corri, mancando, mas escorreguei sem conseguir firmar o meu pé, não estava acostumado a não ter o meu dedão. Ao cair, bati a cabeça e permaneci estatelado no chão, atordoado com a pancada. A adrenalina com a situação de vida ou morte até me curou da embriaguez, mas o golpe deixou-me imóvel, sem conseguir reagir. Notei a pizza aproximando-se e tentei levantar, mas escorreguei no meu próprio sangue novamente e caí sentado.

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