O Tesouro do Guerrilha

Capítulo 1 - Summer

Quando se passava tanto tempo no mar quanto Summer, aprendia-se uma ou duas coisas sobre como ele se comunicava. Uma brisa mais salgada, pássaros demais, pássaros de menos. Eram todos sinais sutis que apenas quem conhecia aquela vida passava a se acostumar. 

Naquele dia específico, o tempo estava tão limpo quanto possível. O sol quente castigava a tripulação, e o suor grudava em camadas, sem nenhuma brisa pra gerar alívio. Tão abafado que se tinha consciência de cada parte do corpo banhada de suor. Não havia nenhuma nuvem no céu, mas nenhuma ave também...

- Capitão. - Chamou a voz grave de Lucinda, uma mulher grande, com mais músculos do que braço, pele negra de um tom claro e cabelos curtos, quase rentes ao crânio. O capitão apenas olhou na direção dela, sinal para que falasse. - Há uma tempestade à caminho, lá pela noite. Das ruins. - Os marujos resmungaram entre si mas o capitão abriu um sorriso de dentes amarelados, em seguida cuspiu pro lado.

- Ótimo. Galo! - Ele gritou chamando o homem que estava no leme, outro cara enorme, coberto de tatuagens sobre a pele clara e uma mancha vermelha no pescoço, marca de quando quase foi morto pela forca. - Traçar rota para o continente!

Galo não questionou as ordens do capitão, começando a gritar ordens para os outros tripulantes, que começaram a se mover em sincronia pelo convés, puxando e amarrando cordas, descendo ao porão e reabastecendo canhões. Era uma bagunça caótica, mas ao mesmo tempo harmônica. Uma das coisas que Summer mais gostava, se é que podia dizer que gostava de algo. 

Enquanto todos ocupavam-se na embarcação, o capitão andou de vagar até onde estava Summer, ajoelhada no chão com roupas imundas e cordas prendendo seus pulsos. As botas homem pararam bem na altura de sua visão e a garota estremeceu. 

- Olhe pra mim, cadela imunda. - Mordendo os lábios rachados, ela levantou o rosto de vagar, os cabelos castanhos claro caindo envolta do rosto bronzeado. Ela forçou um sorriso para o homem bem mais velho, mas este só tinha desprezo em sua face. Ele cuspiu, bem no chão na frente dela, que tentou disfarçar o asco pelo cheiro azedo. - Não diga uma palavra, espertinha. Tenho trabalho pra você.

***

O Capitão a desprezava, mas sabia bem da fama e do talento que Summer tinha, sendo ele mesmo um alvo muitas vezes da esperteza da garota. A tarefa que ela recebeu foi bem simples, até: carregar um prisioneiro, ironicamente, em troca de sua liberdade. 

Ao anoitecer, assim como Lucinda previu, uma tempestade atingiu o navio, o fazendo balançar e ranger da forma menos acolhedora possível. Mas ao invés de se abrigarem, os homens estavam tão agitados quanto as ondas lá fora, afiando suas espadas, envenenando flechas e preparando os punhos. O capitão e o primeiro imediato gritavam ordens e xingamentos que eram carregados por ventos fortes e abafados pelos trovões. 

Iriam saquear um navio da nobreza. Pelo que Summer tinha ouvido entre os cochichos da tripulação, haviam tesouros do próprio rei ali, além de alguém cuja a cabeça valia mais do que todo o ouro da embarcação. Só valendo tanto assim para ser trocado pela liberdade da garota. 

- EMBARCAÇÃO À VISTA, CAPITÃO! - Summer não conseguiu ver quem gritou, mas sabia que tinha vindo lá de cima da vigia. Logo em seguida começou a movimentação, mais gritaria, então pouco depois o ar se encheu com cheiro de pólvora, os canhões sendo disparados um atrás do outro. Summer esperou o contra-ataque, mas esse nunca veio. Ela tentou enxergar sobre a murada, mas a fumaça e a chuva ainda cobriam o ar, enquanto mais canhões eram disparados na noite. Houve mais barulho, mais gritaria, mais ordens do capitão, mas em seguida tudo se silenciou, e ela ouviu mais do que viu quando as pranchas foram estendidas de um navio para o outro. 

O som se reiniciou quase que de imediato, o barulho de lâminas deslizando e tiros de escopeta preencheram o ar. Summer se encolheu.

- Vamos. - Uma outra voz disse e a puxou pelo cotovelo, a pondo de pé e levando para o outro lado do navio, até um dos botes de emergência. Lucinda e esse o desconhecido entraram com ela e outros os desceram até a água.