6. Uma Exceção à Regra

26 7 41
                                    

Jamais!

- Não! Eu não entro nessa cidade! - O Andarilho afirmou exasperado, quase que berrando. Ele não costumava perder as estribeiras dessa forma, na maior parte das vezes era muito calmo e paciente, mas não nessa situação específica; O que Ústia estava pedindo que ele fizesse era algo além de todos os limites estabelecidos por si ao longo de sua vida.

- Por favor... eu não posso ir sozinha pra lá - implorou Ústia ao Andarilho.

Apesar das lamurias de Ústia, O Andarilho não cedeu. Mesmo após todos os lamentos e súplicas de Ústia para qus ele a ajudasse, O Andarilho na cedeu. Ele nunca esteve disposto à levá-la além daquele ponto, e agora sabendo que ela mentiu para si, ele não tinha a mínima intenção de alterar a sua decisão.

Porém ele ainda não sabia exatamente de que forma havia sido enganado. Mas não importava. Contudo.... ele queria saber a verdade, não sabia porque, talvez estivesse apenas curioso? Ou talvez tivesse se aproximado demais de Ústia, e agora não queria simplesmente abandoná-la naquela cidade asquerosa e precisasse apenas de algum motivo - algo certo, não só a constatação de que tinha sido usado. (Ele precisava saber a verdade exata) - que permitisse que ele a deixasse ir sem remorsos. Então decidiu ouvir o que Ústia tinha a dizer.

Ao invés de contar uma história sobre uma jovem mulher que foi vítima de um sistema injusto e opressor, sisyeka esse que preza mais força e poder do que verdadeiras virtudes como; empatia, solidariedade e bondade, ela forneceu ao Andarilho uma descrição muito mais realista e negativa sobre o que realmente aconteceu. E dessa vez, não foi algo ensaiado, realmente soou como se fosse a mais pura verdade, enunciada com grande dificuldade e até mesmo um pouco de vergonha.

------- --------- ---------- ----------- ---------- -----------

Ústia não havia sido presa por ter atacado um guarda que estava assediando uma menina. Ela, na verdade, nunca nem chegou a ser detida pelas autoridades, muito menos ir para a prisão. Mas isso não necessariamente era uma coisa boa, pois, ela fez algo de errado, algo que justificava o fato dela estar sozinha e ferida no meio do deserto quando o Andarilho a encontrou. Pelo menos foi isso que o Andarilho pensou. Mas ele logo viria a descobrir que estava errado e que, apesar de Ústia não ter sido a justiceira que inicialmente afirmara ser, ela estava longe de ser uma ameaça. Uma inimiga ainda mais.

Ele não conseguiu compreender exatamente o que na história dela o motivou a tomar a decisão que tomaria a seguir, mas com certeza compaixão esteve envolvida nesse escolha. Afinal, ele não entraria em Jofériko de novo, depois de tantos anos, a toa. Não... claro que não. Ele percebeu que precisava acompanhar Ústia pela cidade adentro pois ela era apenas mais uma vítima de seu maior inimigo. E esse inimigo não era uma pessoa, mas sim um grande grupo de pessoas: a sociedade. Mais especificamente os membros da sociedade que apoiavam o sistema em que o mundo se baseiava. Que apoiavam o governo corrupto e maligno que controlava quase um quarto do Deserto Lamurioso. E se O Andarilho ainda estava disposto a lutar contra o sistema, se ele ainda queria poder ajudar os outros como há muito tempo prometera, e não só se esconder nas profundezas do deserto, então ele deveria ir junto com Ústia, pois ela era uma pessoa que era contra o sistema e precisava de ajuda.

O Andarilho assim decidiu que, após tanto tempo, ele poderia finalmente deixar de lado a sua promessa, abrindo assim um ÚNICA exceção à sua regra suprema: nunca entrar nas cidades.

-------- ----------- ---------- ---------- ---------- -----------

- Fuufff... - O Andarilho suspirou pesadamente após ouvir a história de Ústia, e de um grande período de reflexão. - Eu.... - ele começou a falar mas hesitou brevemente - Eu vou com você para dentro da cidade.

Depois de ouvir a resposta do Andarilho, Ústia desatou a chorar. De alegria? Por alívio? Depois de se recompor em alguns segundos, ela levantou a cabeça e agradeceu em meio de soluços o Andarilho:

- Muito obrigada! Você não tem ideia do que isso significa para mim. Obrigada Górfez. Eu não esquecerei nunca disso, ficarei eternamente em dívida com você.

O Andarilho tentou demonstrar alguma indiferença à felicidade da jovem moça, mas não conseguiu se conter e deixou escapar um largo sorriso. Que rapidamente contaminou o rosto umido de lágrimas de Ústia.

O Andarilho então voltou para seu camelo, que observava tudo com grande curiosidade, e subiu nele. Depois seguiu em direção a Ústia estendendo sua mão para ajudá-la a subir. Seguindo agora em direção a fronteira de Jofériko, ultrapassando o seu antigo limite, e estando o mais próximo da civilização que alguma vez já esteve desde que abandonou Jofériko há muitos anos.

------------ --------- ----------- ----------- ----------- -------

"Quando face à um conflito, aqueles que lutam, aqueles que fogem, aqueles que desabam e aqueles que permanecem indiferentes a todo custo. Porém, no final do dia, o verdadeiro herói é aquele que apesar de todos os seus receios, suas vontades covardes de auto-preservação e seus traumas, é capaz de colocar tudo isso de lado e se sacrificar pelo bem alheio, pelo fim do conflito, pela justiça e pela verdade."

                           Ditos Lamuriosos, por autor desconhecido.

Você leu todos os capítulos publicados.

⏰ Última atualização: Dec 01, 2023 ⏰

Adicione esta história à sua Biblioteca e seja notificado quando novos capítulos chegarem!

O Andarilho SolitárioOnde histórias criam vida. Descubra agora