Então é isso?

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Pov's S/n

Eu já sabia que minha mãe tinha pouco tempo, e por saber disso, em vez de ficar triste durante esse tempo, eu tentei aproveitar o máximo, tentei criar as melhores lembranças, os melhores momentos, tentei transformar esse pouco tempo na maior felicidade momentânea que eu pudesse.

É engraçado, para não dizer desgraçado, como não temos controle de nada. Por mais incrível que o ser humano se ache, por mais que ele se ache o dono de tudo, se ache imbatível e indestrutível, é quando as coisas que não temos controle, como a morte, aparecem em nossas vidas que percebemos o quão impotentes e insignificantes somos.

No dia da morte dela, eu senti tantas coisas ao mesmo tempo, tristeza, angústia, raiva de não poder fazer nada, me senti um lixo, eu acredito que tenha algo acima de nós, não necessária mente um deus, mas alguma existência, e naquele dia eu com certeza o amaldiçoei de todas as formas possíveis, porque não era justo ela ir.

Eu nunca tive muitas pessoas, mas pela primeira vez eu me senti completamente sozinha, desolada, e sem ninguém, mesmo que Kaiser estivesse do meu lado o tempo todo. Nada fazia mais sentido para mim, eu queria morrer naquele momento, queria que fosse eu no lugar dela. Passei dois dias sem comer e sem sair do quarto, eu não parava de chorar, só parei quando precisei sair para arrumar as coisas do enterro. E logo chegou o dia.

Hoje é o velório dela. Vejo muitas pessoas que fazem muitos anos que eu não via. Por mim eu não chamaria ninguém, mas minha mãe deixou uma lista com o nome das pessoas que ela gostaria que eu avisasse sobre a morte dela, algumas pessoas ela também visitou enquanto ainda tinha tempo. São nesses momentos que eu me pergunto: Como pessoas que nem se importavam com o falecido em vida, conseguem dizer que sentirão falta?
Significa que só são capazes de sentir falta quando a pessoa não está mais aqui? Porque até onde eu me lembre mais da metade das pessoas aqui poderiam ter visto minha mãe em vida, mas não fizeram, e agora estão aqui chorando pelos cantos como se tivessem perdido uma parte deles, quanta hipocrisia.

O que mais me remói, que faz meu ódio pela falsa empatia de pessoas em velórios aumentar, é ver meu pai e sua família aqui. Achei que ele teria a mínima noção de não vir, mesmo que tivesse sido convidado, se ele fosse uma pessoa que conseguisse pensar um pouquinho, ele não viria, mas acho que noção não é o forte de algumas pessoas.

Observo todas as pessoas aqui, além de mim e de certa forma Kaiser, não há mais ninguém da família de minha mãe, a maioria das pessoas são amigos dela, poucos são funcionários do hospital e que ela virou próxima e alguns outros ex colegas de trabalho.

Muitas pessoas aqui a presença me incomoda, pois quando foi descoberto a doença da minha mãe, muitos se afastaram dela, como estivessem agindo como se ela não estivesse mais aqui antes mesmo de ir, e isso me irritou, e agora me irrita mais ainda vê-los aqui chorando pelos cantos e falando as coisas boas de minha mãe. É lindo como todo mundo vira um anjo quando morre, e como todos que estão vivos viram tão empáticos.

━Você não parece bem. - Kaiser diz olhando para mim. - E não estou falando sobre tristeza, você parece com raiva.

Kaiser estava um doce desde que minha mãe faleceu, ele esteve comigo o tempo todo, desde o dia que eu briguei com ela, até o dia que nos resolvemos, e quando ela voltou para o hospital e eu receber a notícia de seu óbito 40 horas depois.

━Quero que isso acabe logo, não aguento mais essas pessoas.

Nós estávamos em um canto na sala do velório, eu deveria receber as pessoas e elas deveriam me consolar, mas eu claramente não ia conseguir fazer isso, então senhora Sansara, uma amiga de longa data de minha mãe e que cuidou de mim quando eu era criança, e minha amiga Narsha, se ofereceram para fazer isso. Mas claro, nem tudo ficaria pela conta delas, eu ainda tinha que fazer o discurso. Faltava pouco para eu poder encerrar tudo, então vejo uma mulher se aproximando, uma mulher que eu não gosto nem um pouco.

𝗞𝗮𝗶𝘀𝗲𝗿 𝗜𝗺𝗽𝗮𝗰𝘁 /𝕀𝕞𝕒𝕘𝕚𝕟𝕖 𝕄𝕚𝕔𝕙𝕒𝕖𝕝 𝕂𝕒𝕚𝕤𝕖𝕣/Onde histórias criam vida. Descubra agora