Capítulo 2 - Libertação

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      Desperto repentinamente de meu sono sem sonhos com um tremer que de alguma forma balançou todo o vazio ao meu redor. O Caldeirão estava sendo movido. Não tive tempo sequer de formular uma hipótese pois tudo se remexeu e eu passei a cair, cair e cair. Dessa vez em direção a pequena luz ao longe que indicava a borda e única saída do Caldeirão. A velocidade era absurda, tão rápida que sinto a dor antes mesmo do impacto quando meus pulmões queimam com o ar e de meus músculos que à muito não se moviam. Permaneço na mesma posição, encolhida e tremendo como um cervo recém nascido, sem ousar me mover, recuperando o ar, acostumando-me ao meu novo corpo.

      —Bem vinda de volta, meu amor. - sinto meus músculos se tensionarem apenas de ouvir sua voz novamente.

      —Cephras.

      Minha voz mal deixa minha garganta. Baixa, fraca e rouca. O nome tem um gosto estranho sobre minha língua e, apesar de familiar, é o som da minha própria voz que quase não reconheço. E, ainda assim, me lembro perfeitamente da dele. Não importa o quão dolorida, ou o quão desacostumada com esse corpo ou quão grande seja minha desorientação, simplesmente a sua voz e sua presença são o suficiente para colocar meu corpo em estado de alerta. Meus músculos se contraíndo para fugir de uma ameaça que pode logo vir.

      —Oh, minha querida, não haja assim! Vou achar que não está feliz em me ver. Finalmente poderemos ficar juntos! Imagino que se lembre do que me disse aquele dia. Bom, eu arrumei uma solução, viu?

      Ah, eu me lembrava perfeitamente. Me lembrava de cada detalhe até o dia em que ele me jogara no Caldeirão. Sento-me e puxo a cortina de cabelos de meus rosto para fitar aquele ser desprezível à minha frente.

      —Lembro. E lembro-me perfeitamente de que eu nunca lhe pedi para que me transformasse... nisso. Eu amava ser humana...

      —Assim você não poderia passar a eternidade do meu lado, querida. - antes mesmo que eu pudesse retrucar ou que ele pudesse finalizar o gesto de me alcançar para que pudesse colocar uma mecha de cabelo molhado atrás de minha orelha, uma criada adentra o salão.

      A reconheco de imediato e ela pareceu me reconhecer também. Boobwi. Era ela quem Cephras enviava para me entregasse seus presentes e cartas quando não o podia fazer pessoalmente e a jovem havia se tornado minha confidente, gastando mais tempo nas terras humanas do que o necessário apenas para me escutar e depois dando a desculpa de tentar inúmeras vezes aceitar o que quer que tivesse sido enviado daquela vez. Boobwi me compreendia melhor do que ninguém e parecia muito surpresa em me ver.

      —Mil perdões, senhor. Fui informada de que deveria trazer uma refeição para seu salão. - sua voz soou baixa, quase temerosa, não parecendo saber o que fazer consigo mesma agora que estavam os três em uma mesma sala juntos.

      —Sim, eu pedi para a minha amada. Depois de tanto tempo ali dentro ela deve estar com fome.

      Tanto tempo. Aquilo só me ocorrera agora mais eu não fazia ideia de à quanto tempo eu estava ali dentro e para um feérico dizer que fazia muito tempo então eu poderia estar ali por muito mais tempo do que eu imaginava.

      —Quanto tempo?

      —O que disse, doçura? - Cephras se vira para mim quase imediatamente, seu sorriso me dando náuseas não importa o quão belo fosse.

      —Por quanto tempo eu fiquei presa naquela droga de caldeirão?! - minha garganta ardia por conta do grito e minha visão estava embaçada por causa das lágrimas mais ainda pude distinguir o que ele disse.

      —Mil e quinhentos anos.

      Não. Não é possível. Pânico começa a subir lentamente por minha garganta, revirando minhas entranhas e deixando apenas um caos dentro de mim. Não podia ser. Mil e quinhentos anos. É tempo de demais. Minha pele queimava e eu podia sentir o fogo de mil sóis por debaixo dela, correndo em minhas veias. Emergindo das profunezas do meu ser como magma, prestes a irromper a superficie da terra.

      — Querida?

      E então toda aquela energia sob minha pele explodiu e tudo o que pue ver foi escuridão novamente.

Corte de Mudança e PoderOnde histórias criam vida. Descubra agora