𝐒𝐂𝐎𝐑𝐏𝐈𝐎 & 𝐒𝐏𝐈𝐃𝐄𝐑

Capítulo onze

Andrei

Coloco meu traseiro encostado na cama, me sento, estou exausto de tudo hoje.
Octavia logo passa pela porta, ela logo fecha, dando privacidade.

— Pode falando — ordeno.

— Tá.

Ela pega uma cadeira do meu quarto e arrasta até ficar na minha frente. Se senta e respira fundo, como uma preparação.
Sua cara está fechada.

— Primeiro, já vou avisando que essa é uma longa história.

— Só fala logo.

— Está bem! — exclama e respira fundo mais uma vez — Você sabe que eu fui criada com a minha mãe até os treze anos, né?

Eu pesquisei muito sobre ela, desde a primeira vez que dormiu na minha cama. Porém, tenho certeza que as informações que eu tenho são só a ponta do iceberg.

— Sim, você morava em um muquifo com sua mãe em Kiev.

Ela revira os olhos.

— E não era?

Octavia finge que não escuta.

— Eu sempre fui pobre, Andrei. Era só eu e ela numa casinha horrorosa, eu mal me alimentava com qualidade. Eu vivi essa vida pois ela trabalhava com meu pai, e tiveram um rolo, aí eu nasci. Depois disso eu vía Enzo quando ela cobrava pensão, ou queria dar a minha guarda pra ele. — diz — Meus irmãos são mais novos que eu, e eu mal sei seus nomes.

— E por que você morou com seu pai?

— É engraçado — sorri — minha mãe me expulsou de casa, eu tive que andar pelas ruas sozinha até achar um abrigo... Até que uma hora eu vi um carro caro e segui até uma cafeteria. Pedi ajuda para ele, e por incrível que pareça ele me ajudou. Dei meu nome e o homem me levou até vocês.

— Essa parte eu já sei.

— Então, viver com o meu pai foi horrível... Ele me torturava de diversas formas. Fazia chantagem comigo por causa dos meus irmãos. Prometia por cem deuses que se eu fizesse o quê ele pedia eu teria família. E quando eu me iniciei as coisas ficaram mais puxadas pra mim, foi difícil.

Sinto sua expressão se fechar mais a cada palavra do seu passado. Reviver um trauma não é fácil para ninguém, é um gatilho que você vai ter para o resto da vida.

— E depois da sua iniciação?

— Eu já estava com o plano todo completo... — suspira — Ele queria que eu matasse seu pai.

Não respiro. Ela tira dentro do bolso uma ampola e joga para mim. Pego o frasco e leio seu nome, Deus, isso é veneno.

— Na cabeça dele eu faria isso e depois eu também morreria, eu sei que meu pai me odeia. — Ela continua falando, mas eu não escuto mais nada —Porra, eu não quero fazer parte disso Andrei, eu queria ser normal!

Ela chora, desaba. Seu rosto fica molhado pelas lágrimas, seu corpo se encolhe como um casulo.
Pego sua mão e a puxo para mim. Octavia me abraça sentada em meu colo, retribuo mas, não sei fazer carinho e muito menos demonstrar afeto.
Mesmo assim, eu abraço todos os seus problemas, medos, traumas, preocupações. Expresso um tipo de acolhimento exclusivamente para Octavia, algo muito especial.