Na noite em que bloqueei Carlos Sainz, senti um alívio misturado com culpa. Tudo ao meu redor estava calmo: a rua quieta, a casa silenciosa, a brisa fresca que entrava pela janela e parecia trazer junto consigo uma paz inenarrável. Primeiro de setembro de 2019 foi uma madrugada estranha, quase com uma magia transparente, fina demais para ser visível. Quando eu olhava para dentro de mim, eu enxergava a dor e a saudade unidas em roxo e preto, ambos enfeitados com um brilho sutil de purpurina. Mas também havia um azul celeste e cintilante que ganhava vida sem timidez e se destacava em meio aos sentimentos escuros: era o alívio. Não sei o motivo das cores se mostrarem para mim em momentos como esse, e não sou eu quem define o tom de cada emoção, no entanto, achei até um pouco irônico a cor do alívio ser a mesma do que um dia foi meu sentimento por Carlos Sainz. Esse azul só não tinha sabor de algodão doce nem era macio como um; não tinha gosto nem densidade, na verdade, apenas chamava mais atenção e reluzia no meio da minha melancolia particular.
Eu não senti vontade de chorar, não me desesperei nem quis desfazer minhas atitudes recentes. Tudo parecia, na mesma medida, natural e automático. Tomei um banho morno, vesti meu pijama, fechei a cortina e me deitei na meia luz do quarto, olhando para o teto. Imaginei que o sono viria fácil, mas foi o oposto: minha mente não quis desligar e meu coração doeu como nunca. Sofri a noite inteira sem qualquer gota de lágrima dar sinal. Dizem por aí que o pior dos sofrimentos é aquele que você não consegue expressar... E naquela noite eu experimentei. Minha dor foi seca e cruel.
Naquele domingo eu acordei perto do meio-dia, e o peso no meu corpo era tão grande que eu não quis me levantar. "Como é possível?", eu me perguntei mil vezes. Pra mim era tão sem sentido estar sofrendo daquela maneira que eu não conseguia aceitar, parecia que eu era indigna de sentir qualquer coisa em relação à minha curta história com Carlos Sainz.
"Não acreditei quando vi. Você me bloqueou em tudo? Sério?"
Uma ligação às 4h37, outra às 4h48 e um SMS às 5h01 estavam registrados na minha tela. Fiquei encarando o celular durante um tempo, à procura da vontade de responder e tentando entender o porquê. Ele não podia simplesmente me deixar em paz? Já não bastava tudo, eu ainda precisaria lidar com esse tipo de coisa?
Ao levantar e me olhar no espelho, o mau humor era visível nas minhas expressões: tudo dentro de mim ardia enquanto meu rosto mostrava que eu não estava para amigos no momento – no fim, eu não queria mesmo ser simpática. Saí do quarto e, diferente do que era costume, não levei o celular comigo; ajudei minha mãe com o almoço e passamos o dia assistindo bobagens na televisão. Na frente dela eu precisava fingir que tudo estava indo bem, o que era um pouco desgastante. Quando voltei para o meu quarto no começo da noite, eu só precisava tomar um banho e chorar um pouco a fim de tentar aliviar o peso de uma dor que passou o dia tentando escorrer para fora.
Enquanto eu secava o cabelo em frente ao espelho do banheiro, flashes de Carlos apareceram em minha mente, me lembrando do dia que quase me atrasei para a aula por estar conversando com ele. Me recordei que naquele momento foi a primeira vez que senti um incômodo por querer tê-lo ali comigo e não poder, agora, olhe só para onde eu estou. Pensar em como teria sido se eu tivesse evitado Sainz desde o começo passou a ser uma pergunta frequente durante os meses em que batalhei para superá-lo.
Andei devagar até meu celular que estava intocado na cama desde a hora em que saí do quarto algumas horas antes. Ao desbloquear a tela, mais sinais de Carlos me esperavam. Eu fechei os olhos e suspirei, sentindo o coração acelerar e o peso crescer outra vez no meu peito.
"Não estou com ela, Laura. Não é assim." – ele escreveu na primeira mensagem.
"Não queria deixar você chateada, vamos conversar."
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Pelo telefone | Carlos Sainz
Romance"Carlos era observador e detalhista. A risada dele era gostosa, calma e seu sotaque me deixou a ligação inteira com um sorriso bobo no rosto. Com a luz apagada e sentada no parapeito da janela, eu desfrutei de uma longa conversa com Carlos até quase...