Quando você não está aqui

Presente / part. 5

Roberta

O clima estava um pouco estranho entre Sn e os pais dela, principalmente com o pai dela que não parecia estar muito à vontade após ela ter falado algumas coisas para ele na nossa frente. Não sei o que tinha motivado ela a estar assim, mas parecia algo que ela realmente se importava já que não estava tão próxima assim do pai. Após todos esses anos eu percebi que ela tinha mudado algumas coisas, ela já não fazia suas brincadeirinhas e nem suas piadinhas, que já era uma marca registrada dela em nossos almoços e saídas todos juntos. Ela estava mais séria, não era de estar espalhando sorrisos para todo mundo, passei a manhã toda e consigo contar nos dedos as vezes que vi ela sorrindo. Não que eu queria que a mulher estivesse do mesmo jeito de anos atrás, apenas sempre tive a certeza que ela nunca se distanciaria dos seus pais e seria sempre bem grudada com eles como na infância. A mulher também não saia do celular e nem se metia muito nas conversas, em alguns momentos ela dava sua opinião, mas logo já ficava em silêncio de volta. Tentei me aproximar dela quando a mulher estava lavando as louças do almoço, mas não tive muito sucesso. Estava tentando arrumar um jeito de conseguir conversar com ela sem ninguém por perto, queria entregar o colar e agradece por ter lembrado da nossa promessa. E além disso ainda queria saber um pouco mais sobre a vida dela, sempre quis falar com ela em todos esses anos, mas ela nunca esteve em nossos almoços e saídas, só não procurei ela por achar que ela não queria papo comigo.
- Você deveria ir atrás dela. - Disse minha mãe e eu encarei o ambiente vendo Sn se levantando com seu celular e entrando na casa, encarei minha mãe e concordei. O máximo que poderia acontecer era ela gritar na minha cara falando que me odeia por ter terminado com ela anos atrás e ainda falar que nunca mais quer olhar na minha cara pelo resto da vida dela se ela puder. Entrei na casa e consegui ver ela entrando na cozinha e eu segui ela a passos lentos, agora chegando mais próxima para conseguir ter esse momento para falar com ela eu não tinha tanta certeza se queria fazer isso. Estava morrendo de medo de falar com ela e levar uma negativa e perceber que ela realmente não quer mais ter nem um tipo de contato comigo, e nem aceitar o colar de volta. Pisei ali na cozinha e cheguei a abrir a boca para falar mas acabei perdendo a coragem, já estava virando para sair quando escutei a risadinha baixa dela.
- Mamãe disse que você falou para ela que queria falar comigo sozinha, eu já vim umas quatro vezes aqui dentro e você não acompanhou. - Disse ela e eu me virei parando ali e encarei ela que estava apoiada na pia.
- Não sabia que ela tinha te falado eu pedi para ela não contar. - Falei e ela concordou e ficou em silêncio me olhando e esperou eu falar o que eu queria, o problema era que eu já não tinha tanta certeza do que falar e como começar isso. - Encarei meu colar e levei minha mão até ele e encarei a mulher que me olhava atenta, eu estava usando um dos dois colares que a gente tinha juntas. Como estava querendo me acertar com ela sobre o que aconteceu no passado, optei por usar o que a gente ganhou dos nossos pais quando a gente ainda era crianças e nem entendia nada. - Você lembrou da nossa promessa. - Falei e sorri voltando a observar ela que desviou seu olhar do meu e encarou o copo que estava em sua mão.
- E eu lembrei sim, te falei que ia cumprir a minha parte da promessa, infelizmente a parte de estar lá para te receber quando você voltasse eu não pude. - Falou me olhando e eu sorri.
- Eu queria ter falado com você nesses anos todos, sempre que eu estava aqui eu queria te procurar para a gente conversar. Mas você sabe que nossos pais sempre deixaram bem claro que você estava estudando na outra cidade, e depois se estava sempre trabalhando eu não queria atrapalhar sua rotina. E eu também não tinha muito certeza se você me atenderia em sua casa ou no trabalho. - Expliquei e entrei mais na cozinha ficando a uma boa distância dela.
- Eu estudei na cidade vizinha mesmo, e foi bom que você não me procurou nessa época, eu virei uma bostinha nessa época. É claro que eu te atenderia Roberta, e eu também não sabia se você queria me ver até porque eles não me falaram nada de você. Acho que eles pensavam que eu te odiava por ter ido embora, nunca entendi muito bem o porquê deles não comentarem sobre você na minha frente. - Disse ela e eu fiz uma nota mental para perguntar isso mais tarde para os nossos pais.
- E você não odeia? - Perguntei e ela franziu sua testa me olhando e negou confusa.
- Não, eu não tenho motivo para te odiar, você fez o que tinha que fazer, não tinha outro jeito de ter feito aquilo se não daquele jeito. - Falou e por um momento eu soltei o ar que nem eu sabia que estava prendendo.
- Eu também não te odeio, na verdade sempre que eu vinha eu torcia para você ir junto nas nossas saídas. - Comentei e ela encarou o chão da cozinha.
- Algumas vezes eu não sabia onde vocês estavam, então eu não podia ir até lá, e em outros momentos meu pai falava que era melhor eu não ir. Na minha cabeça sempre achei que era porque você não queria, mas depois eu tava falando com os seus pais e eles me convidaram para ir até a casa deles em um momento que você estava na cidade. - Eu não sabia dessa parte da história, mas agora queria saber tudo sobre esse assunto.
- E porque você não foi? - Perguntei e ela me olhou.
- Eu estava com raiva do meu pai e achei melhor não ir, porque se eu chegasse lá e você falasse comigo de boa eu ia odiar meu pai por ter sempre falado que era melhor eu não ir. É bem sério, eu não queria odiar meu pai mesmo ele tendo errado em ter feito isso, então eu resolvi ficar no meu canto mesmo. Você mesmo sempre disse que se fosse para a gente se encontrar o destino ia se encaminhar disso, e agora meu pai resolveu me chamar para o almoço e você está aqui. - Comentou e eu concordei vendo que talvez esse tenha sido o melhor momento para a gente se encontrar mesmo.
- Bom, já que a gente não se odeia eu queria falar com você para te entregar seu colar. - Falei e levei minha mão para tentar tirar o colar que eu estava usando para evitar de acabar perdendo. Sn me olhou e deu um pequeno sorriso e ficou me olhando, o colar estava dando um pouco de trabalho para tirar.
- Você quer ajuda? - Perguntou vendo que talvez eu não conseguiria, concordei e ela largou seu copo em cima da pia e caminhou parando atrás de mim, afastou meu cabelo e levou suas mãos para tirar o colar. - Prontinho. - Disse ela tirando o colar e se afastou com ele em mãos e colocou em seu pescoço vontade para o lugar onde ela estava antes.
- Eu estive lá na sua pizzaria, não acredito que você realmente fez isso. - Falei e ela sorriu concordando.
- Eu falei que ia fazer isso quando conseguisse, e deu muito certo as pessoas da região amam o lugar ali. A Laura me ligou para contar que você esteve lá, ela sempre achou que você fosse inventada e que era coisa da minha cabeça, sua visita lá vai me tirar boas risadas dela mais tarde. - Comentou e eu sorri, essa mulher provavelmente era a que me atendeu, mas elas pareciam próximas, não sei se gostei de saber disso.
- Ela parecia surpresa quando me viu, mas ela estava super feliz me atendendo. - Falei e ela sorriu.
- Ela já sabia sobre você e também começou te acompanhar a um tempo só para ter certeza que se acaso você aparecesse ela fosse te conhecer. - Comentou e eu sorri, era bom finalmente conversar com ela após todos esses anos sem trocar uma palavra.
- E você está tomando conta da empresa do seus pais? - Perguntei e ela concordou.
- Sim, no início eu achei que não daria certo, mas depois de um tempo eu percebi que era boa fazendo isso. E agora isso se tornou minha vida, não me vejo fazendo outra coisa se não isso. - Disse ela e sorriu, era bom amar o que a gente fazia isso deixava tudo mais leve e fácil de ser feito.
- Você sempre disse que não sabia se era isso que queria fazer, mas fico feliz que tenha percebido que é isso que você gosta de fazer. - Sn me encarou e ficou ali um bom tempo sem desviar seu olhar do meu, mas ela parecia estar em outro mundo pensando em outras coisas.
- Também fico muito feliz que você tenha conseguido realizar seu sonho. - Sorri e ela desviou seu olhar do meu.
- Em alguns momentos eu achei que não conseguiria, mas deu tudo certo graças a deus. - Falei e ela concordou.
- Bom, eu tinha certeza que você conseguiria, achei que a medalha de ouro viria em Tóquio, mas era para acontecer esse ano mesmo, a gente não pode apressar nada. - A mulher realmente parecia acompanhar minha carreira isso me deixava muito feliz de saber disso.
- Achei que não me acompanhava. - Comentei e ela negou.
-Parece que você não prestou atenção no que eu te falei no dia que a gente se viu a última vez, eu te falei que estaria te acompanhando e torcendo por você independente do que tinha acontecido. - Eu lembrava de cada palavra que ela me disse aquele dia, não consegui esquecer em momento algum, mesmo as vezes querendo esquecer já que aquela situação não me trazia boas lembranças. Ainda mais sabendo que tinha de certa forma magoado ela, talvez se eu tivesse avisado um pouco mais cedo ela não teria sentido tanto. Sem falar que eu passei duas semanas não falando com ela após terminar com ela, apenas para tentar já ir tentando esquecer ela e achando que séria mais fácil quando eu fosse embora. Mas claro que não foi, passei dias chorando por não ter aproveitado esses últimos dias que a gente ainda tinha juntas, antes de tudo virar um caos.
- Eu lembro de tudo que você falou aquele dia, mas mesmo assim sempre achei que você não estava acompanhando. Acho que foi por esse motivo que eu segui usando o colar, assim eu sentia que você está ali me acompanhando nos jogos. - Falei e encarei ela que sorriu, mas não o sorriso que eu conhecia dela. Ela tinha o sorriso mais lindo do mundo e era esse sorriso que eu precisava agora para saber que estava tudo bem, sem mágoas entre a gente após esses anos.
- Eu sempre assisto os jogos quando dá, mesmo se estiver na empresa eu coloquei uma tv na minha sala apenas por esse motivo. Seus jogos as vezes são após o meio dia ou no meio da tarde aí eu preciso ficar trabalhando enquanto assisto. - Contou e eu sorri negando, ela realmente estava fazendo tudo o que tinha prometido anos atrás. Só queria puxar a mulher para um abraço apertado como a gente fazia anos atrás e ficar o resto do dia ali como se ainda fossemos duas adolescentes de novo. Ficamos alguns minutos nos olhando em silêncio e estava super confortável, até ela se virar e largar o como em cima da pia. - Eu não te dei parabéns por todos os títulos e premiações que você ganhou, mas agora eu posso finalmente fazer isso. Então mesmo sendo um pouco tarde para isso acho que você pode me desculpar por isso, parabéns Roberta você conseguiu. Sua carreira está muito bem, melhor agora depois dessa medalha de ouro que você tanto queria. A gente sempre soube que você conseguiria, você se tornou uma das melhores levantadoras da atualidade e sei que deve ficar duvidando, mas é a mais pura verdade. - Falou séria me olhando e eu concordei, ela ainda lembrava de algumas manias minhas, que era essa de as vezes não acreditar tanto em mim como deveria.
- Obrigada é muito importante escutar isso de você, e estranho também saber que anos atrás você me acompanhava até os treinos e hoje estamos aqui com você me dando parabéns pela minha medalha de ouro nas olimpíadas. Ainda não consigo acreditar que a gente ganhou, tudo parece um sonho perfeito. - Comentei e ela começou a rir e deu algumas passos em minha direção se aproximando um pouco mais de mim, mas não tanto quanto eu gostaria, mas já era um avanço.
- Não é um sonho, vocês conquistaram a tão sonhada medalha de ouro nas olimpíadas, isso tem que ser comemorado mesmo. - Falou sorrindo, a mulher parecia estar mais feliz com isso do que eu, isso me deixa feliz de saber que ela ficava feliz com meu sonho sendo realizado. - Bom, eu vou voltar antes que eles venham atrás da gente. - Disse ela e eu concordei e ela sorriu antes de passar por mim e sair da cozinha me deixando ali sozinha. Fiquei alguns minutos ali sorrindo para o nada e então neguei antes de me virar e voltar para a área da piscina com eles. Realmente não estava esperando por toda essa conversa, achei que ela não ia querer conversar, mas que bom que tudo ocorreu ainda melhor do que eu esperava.

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