capítulo único

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Há de existir alguém no mundo que nunca tenha escutado uma certa genérica e inconveniente pergunta "e as namoradinhas" (ou namoradinhos) – a qual sempre é proveniente de uma tia ou tio que não tem noção do inconveniente. Entretanto, esse não era o caso de Kai, que na verdade era consideravelmente pior.

A partir de seus quinze anos, Kai passou a ver as confraternizações familiares um evento de certo desagrado, pois sempre tal pergunta era dirigida para si, não proveniente apenas de uma tia, mas onde até mesmo seus pais abrangiam a situação. Agora, com vinte e dois anos, seria uma grande quebra de expectativa para sua família ele não responder apenas que não há namoradinhas, mas incluir o fato de que teria apenas um namoradinho, e mais velho que si por sinal.

A  próxima confraternização se aproximava, juntamente da época natalina, e ele custava ter de participar desse evento, mas sabia que sua mãe cobraria caso ousasse se ausentar. Por esse motivo, agora aproveitava o pouco do início das férias que ainda tinha com seu namorado antes de partir para a casa dos familiares.

— Eu vou dizer que fiquei doente, Binnie — disse Kai, de forma dramática, praticamente se derretendo no abraço de seu namorado.

— Não deve ser tão ruim assim, Kai. Além disso, são seus familiares, eles sentem sua falta. Visite-os.

Imediatamente, as sobrancelhas do mais novo se franziram, deixando evidente em sua face a indignação.

— Diz isso porque não tem que escutar sua família te pressionar a assumir uma namorada em toda reunião! — O Huening exclamou, indignado.

O mais velho apenas riu das lamúrias do namorado, em seguida levando seus lábios à testa do menor e deixando o beijo ali.

Kai e Soobin namoravam a pouco mais de um ano. Conheceram-se na faculdade, após o melhor amigo de Kai, Yeonjun, apresentá-lo ao seu namorado, Beomgyu, que coincidentemente era melhor amigo de Soobin. Após serem apresentados, começaram como uma amizade afetuosa, que depois de muito rodeios acabou se tornando um relacionamento romântico, mais afetuoso ainda. Agora o grupo de amigos que faziam parte era composto por dois casais – incluindo-os – e um mascote, como Kai chamava carinhosamente um de seus amigos, Taehyun.

— Eu queria ser tão ousado quanto o Yeonjun hyung — disse Kai.

De fato, o mais velho dos Choi tinha ousadia significativa, ele era um rapaz incrivelmente petulante. Após começar um relacionamento com o mais novo dos Choi, Beomgyu, em uma confraternização familiar, Yeonjun chocou toda a sua família ao assumir simplista seu namorado após sua mãe perguntar o porquê de ainda estar solteiro.

— Não! — Soobin advertiu de imediato. — Prefiro você do jeito que você é. O nível de ousadia do Yeonjun é indescritível! — Indagou, tirando uma risada do mais novo.

Kai se afundou ainda mais naquele abraço, lugar onde considerava sua zona de conforto, tendo sua cabeça em contato com o peito do outro rapaz.

— Eu só espero que não seja tão chato — comentou.

Novamente, o mais velho deixou um selar no topo da cabeça do mais novo, em seguida afagando seus cabelos na tentativa de passá-lo conforto.

***

A vastidão azul janela afora, por mais que fosse cativante aos olhos de Kai, nesse momento pouco o importava. Não que fosse extremamente apegado a Soobin, mas estar longe do mais velho tendo de ir a um evento qual não queria fazer parte o frustrava. Ele amava sua família, mas não estava no clima para festas, e preferiria de fato passar um tempinho com seu namorado.

Farto, optou apenas por limpar sua mente, quando escutou a aeromoça informar a ele e os demais passageiros que o avião estava prestes a aterrissar.

Foi uma aterrissagem tranquila. Por odiar voos, assim que pisou seus pés no lobby do aeroporto, pôde respirar devidamente, o que não durou muito tempo pois viu suas duas irmãs correrem até si para um abraço apertado.

Juntos, seguiram para a casa dos parentes, onde ocorreria a reunião da família em plena véspera de Natal.

***

A medida em que a noite avançou, todos situaram-se numa grande mesa de jantar, para provar da vasta ceia de Natal que estava ao aguardo para ser degustada. Aos olhos de Kai tudo parecia tão calmo que apenas esqueceu que antes não queria fazer-se presente naquele evento.

Coitado...

— Mas mudando de assunto — proferiu a dona da casa, uma das tias. — Kai — chamou o rapaz, que suspirou ao escutar seu nome. Ele já sentia o que tinha por vir.

— Eu.

— E as namoradinhas? Você está um rapaz tão bonito, aposto que tem várias no seu pé.

Kai iria responder de imediato a mesma resposta de sempre para aquela pergunta, que não tinha namorada alguma, mas foi interrompido pelo barulho de notificação vindo de seu celular que estava sobre a mesa.

Todos os olhares foram dirigidos ao aparelho,  como se dissessem "certeza que é a sua namorada", contudo, antes que o dono pudesse pegá-lo, o aparelho foi apanhado por um dos demais presentes naquela mesa, um primo seu.

— Aposto que é a sua namorada! — O sorriso maroto que antes fazia-se presente nos lábios do garoto desvaneceu de sua face ao olhar o visor do celular. — Soobin não parece um nome feminino, mas então por que tem alguém chamado Soobin te chamando de "gatinho" e dizendo que te ama?

Ao questionamento, Kai rapidamente tomou o aparelho da mão do primo, olhando rapidamente o visor.

Soobin: Feliz Natal, gatinho ❤
Soobin: Eu te amo

Vendo que já havia sido exposto não tinha mais motivos ocultar seu relacionamento. Não precisaria mais se preocupar em esconder aquele fato e muito menos teria de lidar com aquele típico questionamento inconveniente mais.

Com toda aquela atenção sobre si, de pessoas que aguardavam por um pronunciamento, Kai reuniu um fio de coragem que possuía para pronunciar-se, tendo em mente que, caso não fosse bem acolhido, ele tinha os braços do namorado e o apoio dos amigos para o acolher.

— Eu não tenho namoradas no plural, na verdade, eu não tenho namorada alguma — respirou profundamente antes de dar continuidade a sua fala. — Eu tenho somente um único namorado, há dois anos, mas que me faz feliz e muito bem.

Então, ali, naquela mesa de jantar e na véspera de Natal, rodeado de pessoas que deveriam se importar com ele, Kai revelou o fardo que carregava.

***

Havia se passado um ano desde o ocorrido, o qual o rapaz Huening foi exposto. Dessa vez, a família se reuniu para uma confraternização novamente, mas com uma outra presença entre eles.

— E a faculdade, Kai, está estudando muito? — Perguntou a tia.

Com um sorriso sincero, dessa vez não forçado, o rapaz respondeu à pergunta.

— Preciso! Pode não parecer, mas cursar música não é só flores — sua energia parecia até mais leve e espontânea.

Os olhos da mais velha rapidamente se dirigiram até àquela figura masculina ao lado do jovem Huening.

— E você, bonitão, cursa o quê? 

— Administração — o chamado respondeu com simpatia.

Logo, os demais na mesa, incluindo Kai, passaram a conversar espontaneamente sobre o assunto, enquanto aquele único indivíduo de diferente observava a cena com um sorriso de admiração. Soobin estava muito orgulhoso de seu namorado.

Esse ano foi diferente. Nenhuma tia, ou tio, perguntou sobre as namoradinhas. Perguntaram sobre a faculdade e  sobre a vida, pois o namoradinho estava lá, só observando, admirado e afetuoso. 

Kai contava com mais Natais como esse no futuro.

"E As Namoradinhas"Onde histórias criam vida. Descubra agora