“ Eu estava apenas digitando freneticamente dentro da minha cabeça...”
“E ai sinto q derramaram chá no computador.”
“Isso é muito ruim...”
“Quebraram meu computador!!!”
“Era nele q eu escrevia...”
“Que droga.”
“Eu vou ter que comprar um novo.”
“Mas não tenho dinheiro.”
“Vou ter q trabalhar.”
“Isso parece péssimo.”
“Eu não consigo!”
“Não consigo trabalhar porque não consigo sair do meu quarto.”
“E sem computador eu não posso trabalhar de casa.”
“Isso é uma situação desesperadora...”
“O que eu faço?”
Estava batendo a cabeça na parede repetidamente, até que então parei, fechei as mãos e coloquei os punhos sobre as têmporas pressionando um pouco a cabeça. "Só assim vou me sentir melhor". Caminhei pelo quarto, o barulho de cada passo ecoava como uma palma num anfiteatro grego, pareceram meses, mas foram segundos, eu só tinha caminhado alguns metros. Encarei a maçaneta e tenho certeza de que ela me encarava de volta, então tive pressa em colocar a mão sobre ela para tapar sua visão, respirei fundo, inflei as bochechas e girei. A porta deu um pequeno estalo e as dobradiças rangeram enquanto um laser satélite soviético me atingia queimando minhas retinas. Estava de dia, eu sequer sabia que horas eram, estremeci e passei apressada pelo corredor, sinto que os espiões inimigos me viram, acho que até ouvi eles preparando seu plano de ataque, mas fui mais rápida e quando me vi já estava no portão
Fiquei ali por alguns segundos até que abri e atravessei, eu já tinha tomado a decisão. Andei pela rua, a calçada era feia e suja, mas me contentava em observá-la, continuei com meus passos em ritmo acelerado, eu não costumava andar, porém sempre que andava era rápido, não porque tinha pressa, mas simplesmente gostava, as vezes doía próximo as costelas, mesmo assim eu não desacelerava. Seres estranhos passavam ao meu lado deixando um calafrio espectral em meu corpo, eu não os reconhecia, contudo não pareciam ameaçadores, ou melhor, pareciam, porém eu sabia que estavam em seu momento de descanso e não me atacariam. Depois de uma longa caminhada minhas pernas estavam rígidas, não dei atenção a isso e entrei onde precisava.
Passei alguns minutos procurando, as coisas ficavam bem escondidas naquele lugar, apesar de perfeitamente alinhadas. Peguei o que queria, um trio de ratos cantores prateados, isso me faria sentir melhor. Fui até a o lugar onde eu deveria pagar, e tinha uma fila daquelas criaturas ameaçadoras, como eu não queria provocá-las entrei e esperei. Minha vez finalmente chegou e eu coloquei os prateados e afiados ratos sobre o balcão, uma das criaturas, do outro lado, murmurou palavras irreconhecíveis, então fiz o que pude para ignorá-las, peguei o dinheiro e coloquei ao lado dos roedores, a criatura por sua vez pegou o dinheiro e depois de uma olhada minuciosa me entregou uma quantia menor do que a que eu havia entregado, peguei os ratos e fui embora. No caminho eu os encarava, passava de uma mão para outra, guardava no bolso e retirava, estava nervosa, preferia que alguém tivesse tido todo esse trabalho por mim. Quando cheguei em casa estava suando um pouco, mas abri o portão e entrei tão rápido quanto quando tinha saído. Adentrei meu quarto e tranquei a porta, tirei a blusa e me sentei sobre a cama, abri a embalagem de ratos e fiquei encarando seu brilho acinzentado, estremeci só de pensar em sua música, mas eu sabia que precisava ouvir, posicionei-os no antebraço e os fiz cantar, era a mesma de sempre, ardia e a cada acorde era como um pequeno choque me fazendo dar alguns espasmos, eu aproveitei cada segundo, era doloroso mas depois se tornava bom, em resposta a música dos ratos meu corpo jorrou pétalas de rosas de um vermelho tão vívido que me emocionei, meus olhos ficaram marejados e eu deixei que os prateados cantassem por mais algum tempo, quando eles enfim cessaram as rosas continuaram um pouco mais, e eu fiquei ali, estática, preocupada com o que diriam quando soubessem que voltei a ouvir esses pequenos animais.
Dezenas de horas se passaram, no meu quarto eu não diferenciava dia e noite, e meu computador continuava quebrado me forçando a ficar praticamente o tempo todo em redes sociais, no meu braço as memórias dos ratos permaneciam, misturadas com as de melodias mais recentes, coçava e doía quando eu mexia, mas isso só me dava mais vontade de ficar tocando, de qualquer forma as redes sociais me davam nojo, eu odiava tudo o que elas me entregavam e toda vez que eu via as pessoas reclamando sobre o quanto algo que não agrada elas deveria ser crime eu tinha vontade de quebrar algo, eu também odiava quando elas demonstravam amar algo demais, pra mim não existia nada no mundo que fosse motivo o suficiente para tantos sorrisos e emojis de coração, talvez o mais próximo que eu tinha disso fosse o meu computador e as coisas que eu escrevia, falando nelas eu conseguia acessar algumas, porque certa vez tomei coragem e postei elas em um site, eu sinceramente não sei o que esperava com isso, mas o resultado foi esquisito, a maioria das pessoas não deu importância nenhuma, e as que chegaram a comentar alguma coisa disseram que era normal ou até imoral, não entendi o que quiseram dizer, mas fiquei feliz que se deram ao trabalho de ler até o final, eu geralmente não tinha tanto empenho quando via os textos de outras pessoas. Nas redes sociais existiam pessoas que respondiam quando eu fazia algum tipo de pergunta, não eram muitas, pra ser mais exato uma, não conseguia dizer pela foto se era homem ou mulher, mas era o mais próximo que eu tinha de um amigo virtual, apesar de eu nunca ter tido coragem de mandar uma mensagem no chat privado. Estava cansada das redes sociais e de muitas outras coisas mas seriam coisas demais pra citar todas aqui, o que importa é que eu estava cansada quando ouvi a porta do quarto abrir, o que se seguiu eu sequer consigo explicar, mas foi uma série de barulhos perturbadores e depois um silêncio ensurdecedor, a propósito era minha mãe que havia entrado, ela ficou parada olhando para mim e eu fazia o que podia para não tremer, depois de um tempo ela deu um pesado suspiro e saiu sem fechar a porta, o que me obrigou a levantar e fechar, além disso a luz que entrou pela porta era fraca, provavelmente estava no fim da tarde. "Faça aquilo" uma voz sussurrante disse, eu reconhecia essa voz, era o meu amigo Zov, eu não tenho muita criatividade para nomes, mas ele aprecia de vez em quando, me dava conselhos que iam contra aos das outras pessoas, me fazia pensar sobre o quanto certas coisas eram ruins e injustas e conversava comigo, no começo eu tinha medo, porque nunca fui capaz de vê-lo, mas depois me acostumei, apesar de ainda não entender da onde ele vinha. Então segui o conselho de Zov, coloquei a mão atrás do guarda-roupa e peguei um macarrão longo e resistente, Zov não falou mais nada, mas senti como se ele tivesse dado um sorriso, fui até a mesa do computador que não era tão pesada e puxei para o meio do quarto, subi e comecei a puxar o forro com cuidado para não fazer barulho, depois de algum tempo um pedaço caiu, revelando o telhado e uma grossa madeira que servia como sustentação. Peguei o macarrão e fiz um laço especial que havia apreendido na internet, joguei por cima da madeira e então amarrei, eu tinha um lustre de macarrão! Desci da mesa e empurrei ela de volta para o canto, logo em seguida peguei a cadeira, a mesma que antes eu me sentava para escrever, levei ela para o centro, fiquei de pé e passei a cabeça pelo laço do macarrão. Nesse momento você deve estar pensando: "Assim do nada? Que protagonista chata, que história fraca" e eu entendo seu pensamento, mas a verdade é que você chegou tarde, eu já havia deixado um bilhete pedindo para que concertassem o computador, já que assim achariam minha mensagem especial, fazia muito tempo que eu tinha preparado uma extensa carta para caso esse momento chegasse, então todos logo veriam. Engoli em seco e me perguntei se deveria mesmo brincar de balanço com o macarrão, mas Zov me deu confiança dizendo "não te resta opção", então eu apertei os olhos e empurrei a cadeira para trás com os pés.
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Sobre Ratos E Macarrão
Kısa HikayeOs últimos(?) delírios de uma garota com muitos problemas e alguns planos.